Sobram idiotas, faltam demagogos
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A tal democracia criada na Grécia antiga pretendia estabelecer um sistema pelo qual os cidadãos pudessem influir na decisão sobre os questões de interesse geral. Críticos do sistema, como o filósofo Sócrates, reclamavam da presença de sapateiros, agricultores, marinheiros, nas assembléias e mais: imaginavam que o governo seria uma confusão, com tanta gente dando palpite, cada um com sua idéia própria. Isso não aconteceu, porque nas assembléias logo despontaram os demagogos, os líderes, oradores eloqüentes que conseguiam o apoio da maioria para suas idéias. Que o sistema era eficiente demonstra-o o fato de que a Grécia democrática enfrentou duas guerras contra os persas e venceu as duas.
O oposto dos demagogos eram os idiotas, que não estavam nem aí para as assembléias – queriam é cuidar da própria vida e dos próprios interesses. A democracia moderna, obrigada a governar países imensos, não pode dar-se ao luxo de ouvir todos os cidadãos para cada decisão de interesse público a ser tomada. Assim, criou-se o sistema de representação, e surgiram os parlamentos, as Câmaras de Deputados e os Senados, que formam os Congressos Nacionais. De uns tempos a esta parte, evidencia-se que cada vez mais faltam demagogos e sobram idiotas no nosso Congresso. Não há uma única liderança capaz de botar um pouco de ordem nas Casas, quanto mais os prestigiados colégios de líderes capazes de estabelecer acordos confiáveis.
Isso não aconteceu nem mesmo durante a ditadura – Câmara e Senado tinham lideranças, elas conseguiam influir até nos assuntos restritos da ditadura militar e desempenharam papéis decisivos no processo de redemocratização.
Essa falta de lideranças, na verdade, assola todo o sistema de poder. No Executivo, onde está um presidente que se reelegeu com quase 60 milhões de votos, não se evidencia a mínima capacidade de iniciativa para enfrentar guerras como a dos gregos democratas. O Judiciário desgasta-se na morosidade e na ineficiência, demonstrando também apego à idiotice grega – preocupação com os interesses próprios, em detrimento do geral.
Pela primeira vez, que eu saiba, o Brasil sai de uma eleição concorridíssima e mergulha numa apatia generalizada. No começo do primeiro governo Fernando Henrique Cardoso, liquidada a inflação que até há pouco parecia imortal, Federação das Indústrias do Estado de São Paulo, Central Única dos Trabalhadores e Força Sindical deram-se as mãos e foram juntas a Brasília lutar pelos interesses dos seus associados, que eram conflitantes, com certeza, no terreno pessoal, mas complementares no campo social. Quem, hoje, tem autoridade para propor coisa parecida? Convocar os especialistas de todas as áreas, as entidades de classe, a universidade, os intelectuais, os ricos e os pobres para o trabalho de pensar o país, suas necessidades, potencialidades, fraquezas, urgências? E em seguida pôr mãos à obra, para praticar o que a assembléia de todos decidiu, para vencer as guerras que se apresentam – o déficit público, a previdência que precisa de reforma, as leis trabalhistas, as urgentes questões ambientais, a escola que parece cada vez pior, a segurança, o emprego...
Almyr Gajardoni é jornalista, chefe do Núcleo de Redação da Imprensa Oficial de São Paulo
A tal democracia criada na Grécia antiga pretendia estabelecer um sistema pelo qual os cidadãos pudessem influir na decisão sobre os questões de interesse geral. Críticos do sistema, como o filósofo Sócrates, reclamavam da presença de sapateiros, agricultores, marinheiros, nas assembléias e mais: imaginavam que o governo seria uma confusão, com tanta gente dando palpite, cada um com sua idéia própria. Isso não aconteceu, porque nas assembléias logo despontaram os demagogos, os líderes, oradores eloqüentes que conseguiam o apoio da maioria para suas idéias. Que o sistema era eficiente demonstra-o o fato de que a Grécia democrática enfrentou duas guerras contra os persas e venceu as duas.
O oposto dos demagogos eram os idiotas, que não estavam nem aí para as assembléias – queriam é cuidar da própria vida e dos próprios interesses. A democracia moderna, obrigada a governar países imensos, não pode dar-se ao luxo de ouvir todos os cidadãos para cada decisão de interesse público a ser tomada. Assim, criou-se o sistema de representação, e surgiram os parlamentos, as Câmaras de Deputados e os Senados, que formam os Congressos Nacionais. De uns tempos a esta parte, evidencia-se que cada vez mais faltam demagogos e sobram idiotas no nosso Congresso. Não há uma única liderança capaz de botar um pouco de ordem nas Casas, quanto mais os prestigiados colégios de líderes capazes de estabelecer acordos confiáveis.
Isso não aconteceu nem mesmo durante a ditadura – Câmara e Senado tinham lideranças, elas conseguiam influir até nos assuntos restritos da ditadura militar e desempenharam papéis decisivos no processo de redemocratização.
Essa falta de lideranças, na verdade, assola todo o sistema de poder. No Executivo, onde está um presidente que se reelegeu com quase 60 milhões de votos, não se evidencia a mínima capacidade de iniciativa para enfrentar guerras como a dos gregos democratas. O Judiciário desgasta-se na morosidade e na ineficiência, demonstrando também apego à idiotice grega – preocupação com os interesses próprios, em detrimento do geral.
Pela primeira vez, que eu saiba, o Brasil sai de uma eleição concorridíssima e mergulha numa apatia generalizada. No começo do primeiro governo Fernando Henrique Cardoso, liquidada a inflação que até há pouco parecia imortal, Federação das Indústrias do Estado de São Paulo, Central Única dos Trabalhadores e Força Sindical deram-se as mãos e foram juntas a Brasília lutar pelos interesses dos seus associados, que eram conflitantes, com certeza, no terreno pessoal, mas complementares no campo social. Quem, hoje, tem autoridade para propor coisa parecida? Convocar os especialistas de todas as áreas, as entidades de classe, a universidade, os intelectuais, os ricos e os pobres para o trabalho de pensar o país, suas necessidades, potencialidades, fraquezas, urgências? E em seguida pôr mãos à obra, para praticar o que a assembléia de todos decidiu, para vencer as guerras que se apresentam – o déficit público, a previdência que precisa de reforma, as leis trabalhistas, as urgentes questões ambientais, a escola que parece cada vez pior, a segurança, o emprego...
Almyr Gajardoni é jornalista, chefe do Núcleo de Redação da Imprensa Oficial de São Paulo
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