terça-feira, 16 de janeiro de 2007

A ditadura reciclada
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O senhor Nicolau Maquiavel, pensador florentino de grande talento e influência, impressiona pelo realismo de suas idéias. O julgamento de um governante pelo caráter dos homens que o cercam, por exemplo, a cada dia ganha maior relevância, já que o poder trás consigo também o isolamento. E, sinceramente, apenas os muito medíocres (ou os pateticamente ingênuos) podem querer outros de menor capacidade como conselheiros. Ler Maquiavel, porém, não é um hábito dos políticos em geral. A mediocridade acima citada infelizmente é o traço da maioria, com honrosas exceções, é claro. Sem citar exemplos, nem para um lado, nem para o outro, vale registrar ainda que os eleitores são tão culpados pela mediocridade quanto os que se candidatam. Ninguém se elege sem votos e estes são dados pelo povo. A democracia é imprescindível, mas não é perfeita. Pois bem, o pensador florentino escreveu uma frase menos conhecida, mas igualmente interessante: “todos vêem o que pareces, poucos percebem o que és”. Deparei-me com ela no mesmo dia em o “comandante” Chavez tomou posse, dando a entender que pretende permanecer no poder por mais tempo do que permite o mandato ora iniciado. Fez as bravatas de sempre, pôs a faixa presidencial de ponta-cabeça e, talvez seu único mérito verdadeiro, prometeu resistência ao imperialismo americano. Para completar, pediu poderes especiais para legislar por conta própria, sem as “amarras” que o parlamento pode oferecer às intenções dos governantes. Entre a esquerda pátria, aplausos de uns, silêncio obsequioso de outros, poucas condenações às intenções ditatoriais do venezuelano. Lembrou-me o tempo em que eu (e muita gente mais), então um jovem comunista, justificava o muro de Berlim por supostas “tentativas de sabotagem” por parte dos ocidentais. Claro, eu tinha quinze anos de idade e vinte a menos de vivência. Perdoa-se, portanto. O que não tem perdão é ignorar que a democracia não pode ser um elemento de retórica, que exigimos mas não executamos. Parece surreal ainda hoje ter que afirmar isso, depois de tudo o que aconteceu no mundo e dos crimes de ditadores à esquerda e à direita do espectro político. Mas, com a mesma tenacidade do tricolor da Azenha, o façamos sempre que for necessário. Cultuar a personalidade de caudilhos e “líderes” sempre foi um pecado da esquerda, desde que Stálin substitui a força do partido pela vontade do homem. Sabemos onde este tipo de coisa acaba: no expurgo, no paredão, no gulag. Péssimo filme este, tantas vezes visto e que Chavez parece querer reeditar. Podem criticar Lula, podem não gostar dele, podem recriminar seu discurso. O que não podem acusar-lhe é de não ser um democrata. Depois da crise que enfrentou, junto com o PT, sem fazer um gesto sequer que pudesse ameaçar as nossas ainda jovens instituições democráticas, este fato tem que ser reconhecido. Cada povo tem o presidente que escolhe e merece. Que o digam os americanos... Não sou um anti-chavista, nem defendo a oposição golpista que existe na Venezuela. Mas sou radicalmente contra as ditaduras, veladas ou escancaradas. Aliás, ser de esquerda e, acima de tudo, democrata tem seu preço, pois “apanha-se” de todos os lados. Não tem problema, o couro já está curtido. Pra finalizar, um giro pra outro assunto. Recomendo a leitura da coluna que escrevi no dia 11 de junho de 2006, intitulada “Um café, por favor!”, tendo ao lado para comparações o Diário de Santa Maria deste final de semana. Se o Claudemir avisou antes sobre o bloqueio ao You Tube (e com justiça vangloria-se disso) me sinto autorizado a comemorar ter registrado antes a boa fase de Santa Maria. Como aquela motinho de um desenho que os trintões devem lembrar, é a minha vez de dizer “Eu te disse! Eu te disse!”.
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Luciano Ribas

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