Entrevista de Tarso Genro
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Deu na Folha de S. Paulo:
"O novo ministro da Justiça, Tarso Genro, defende a discussão "da liberdade de circulação de opinião, principalmente da opinião política", na imprensa.Afirma que não há problema de liberdade de imprensa no país, mas "de circulação de opinião de forma mais plural".
Segundo Tarso, que deixa hoje o ministério de Relações Institucionais e assume novo posto na Esplanada, o que falta é a possibilidade de "a cidadania mais deslocada do debate político poder exprimir de forma abrangente a sua opinião".
Em entrevista à Folha, Tarso diz ter três prioridades na pasta: reforma política, continuar a política de segurança pública do antecessor, Márcio Thomaz Bastos, e "integrar as políticas de segurança pública com as políticas sociais".
Tarso rejeita a avaliação de que será mais propenso a pressões políticas por ter interesses partidários diretos. Afirma que a PF terá ação "republicana".
FOLHA - Quais serão suas prioridades na Justiça?
TARSO GENRO - Reforma política, continuidade do trabalho do Márcio na segurança pública e, a médio e a longo prazos, integrar as políticas de segurança pública do governo com as políticas sociais. Essa última permitirá que a segurança pública seja tratada rigorosamente como questão policial, científica, de articulação institucional entre a União e os Estados. Ao integrar a questão da segurança pública na afirmação da cidadania, me refiro particularmente aos jovens das periferias.
FOLHA - O sr. compartilha da tese, já expressada pelo presidente, de que a violência nos grandes centros urbanos é herança de governos passados, descaso com a juventude e resultado da desigualdade social?
TARSO - Não entendi que o presidente tivesse culpado qualquer governo passado. Interpretei suas afirmações como herança do Estado brasileiro. A desigualdade e a expectativa diferente sobre futuro influem na criminalidade, mas são fatores.
FOLHA - Entra governo e sai governo, e a segurança permanece um problema no país. Por quê?
TARSO - Urbanização acelerada, ausência de políticas públicas de inclusão e de integração social. Há ainda a estética da morte, a estética da violência, que faz parte de um tipo de cultura de uma sociedade como a nossa. Isso não é responsabilidade de um governo em especial, mas resultado de uma formação social concreta.
FOLHA - Como essa estética da morte se expressa?
TARSO - Por meio da exacerbação da violência, que influi na juventude, por meio da ausência de uma educação pública que afirme os valores da solidariedade, que dê oportunidades para as pessoas se integrarem socialmente. Isso ocorre não somente no Brasil, mas também nos países desenvolvidos. É um problema civilizatório.
FOLHA - Qual sua posição sobre redução da maioridade penal e o tempo de internação do jovem infrator?
TARSO - Em relação à redução da maioridade, o governo já expressou sua posição contrária. O aumento do tempo de internação tem de vir acompanhado de medidas eficazes educativas e de reintegração, se essa for a opção. Não há uma avaliação rigorosa se isso é realmente necessário, se terá efeitos dissuasórios na criminalidade.
FOLHA - Na campanha de 2006, o sr. sustentou que a imprensa agiu contra a candidatura de Lula em aliança com a elite paulista. Mantém a avaliação?
TARSO - No país não existe problema de liberdade de imprensa, nem de mau exercício da liberdade de imprensa. Existe um debate político importante sobre o futuro da democracia brasileira, em que a questão dos meios de comunicação é um elemento importante. Não acho que existe qualquer campanha conspiratória contra o governo Lula nem contra a democracia. O que falei foi que nitidamente a maior parte da imprensa estava contra o governo. Apenas o óbvio.
FOLHA - Na tese Mensagem ao Partido, documento para o 3º Congresso do PT assinado pelo sr., prega-se a democratização dos meios de comunicação. O que seria isso?
TARSO - Não será a partir do Estado. É uma questão de consciência da sociedade de como se organiza a circulação da opinião. No Brasil, existe liberdade de imprensa. Ela tem de ser preservada e está preservada na Constituição. Agora, qualquer país sério tem de discutir a liberdade de circulação de opinião, principalmente da opinião política, o que muitos países estão fazendo, mas não se trata de problema de liberdade de opinião ou de imprensa, e sim de circulação de opinião de forma mais plural.
FOLHA - Falta pluralidade à imprensa brasileira?
TARSO - Não falta pluralidade, porque os meios de comunicação têm várias posições políticas. Falta possibilidade da cidadania mais deslocada do debate político, afastada de assuntos de informação, poder exprimir de forma tão abrangente como os demais sua posição.
FOLHA - Como isso poderia ser feito, por meio de TV pública?
TARSO - Uma TV pública é importante. E o aumento do número de jornais, revistas, TVs privadas e públicas regionais.
FOLHA - O sr. acha necessário alguma regulação da imprensa, como se tentou no primeiro mandato com o Conselho Federal de Jornalismo?
TARSO - Não, eu acho que a liberdade de imprensa está bem regulada, há meios legais para que os cidadãos exerçam seus reparos à imprensa quando se sintam ofendidos.
FOLHA - O sr. interpelou judicialmente um colunista (Demétrio Magnoli) que o chamou de ministro da classificação racial, numa referência à política de cotas pelo sr. defendida. Não é um atitude contra o direito de opinião?
TARSO - Em primeiro lugar, não fui eu que fiz. Foi o advogado-geral da União. Em segundo lugar, para um filho de mãe judia, ser qualificado como integrante do ministério da "classificação racial" é extremamente ofensivo. Se o advogado-geral não o tivesse interpelado, eu o teria feito. É um direito individual de um cidadão de esclarecer no plano jurídico o que a pessoa quis dizer com uma classificação desse tipo. Soube que a interpelação foi respondida e ela satisfez o advogado-geral. Respondeu que não teve a intenção de ofender.
FOLHA - O sr. comandará a PF, que ainda investiga o dossiegate. Qual será sua orientação para esse caso?
TARSO - Quem vai comandar a Polícia Federal é o chefe da Polícia Federal, não o ministro da Justiça. O ministro não comanda nem orienta a Polícia Federal fora da legalidade. A PF tem uma normatividade muito clara dos seus deveres e obrigações, e é uma legislação muito republicana. Ao ministro da Justiça não compete interferir nas ações, a não ser para preservar a legalidade, quando isso, eventualmente, for ferido."
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