sábado, 21 de outubro de 2006

E SE LULA VENCER?

Paulo Moura, cientista político
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Se a última pesquisa Datafolha for confirmada pelo Ibope (Vox Populi confirma dianteira de 20 pontos de Lula), será muito difícil para Alckmin reverter a situação que se criou no segundo turno. A lógica da tendência que as pesquisas apontavam na reta final do primeiro turno caminhava em sentido oposto ao que as pesquisas apontam agora. O segundo turno não oferece espaço para erros dado o tempo curto de sua duração. Lula acertou seu foco e estratégia; Alckmin cometeu os erros que já comentei no artigo anterior. A última esperança de Alckmin está num eventual deslize de Lula nos debates.
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O único fato previsível capaz de afetar o curso natural da disputa é a revelação da origem ilícita do dinheiro que financiou o dossiê tabajara. Essa informação disparada contra Lula num debate talvez surta algum efeito. Como notícia e assunto da propaganda eleitoral, não me parece que esse fato seja capaz de produzir impacto maior do que a foto da dinheirama que empurrou Lula ao segundo turno. Assim, apenas outra surpresa da magnitude desse escândalo que vai sendo abafado pelo governo poderia reverter a tendência apontada pelo Datafolha.
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A única explicação plausível para a inversão da tendência que as pesquisas apontavam no fim do primeiro turno é o sucesso do marketing terrorista do PT. O povo parece preferir um governo que rouba a um governo que ela acha que poderia privatizar estatais.A se confirmar, portanto, a reeleição de Lula, que cenário espera o Brasil no próximo período? Mais do mesmo. Não há como nem porque ocorrer alguma alteração significativa no que o petismo já mostrou ser capaz de fazer no governo. O que entendo por mais do mesmo?
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No cenário econômico com virtuais melhorias circunstanciais, alternadas por eventuais cenários de baixo crescimento, talvez sofrendo algum solavanco negativo provocado pelo prenunciado fim do ciclo virtuoso da economia mundial que o governo Lula não soube aproveitar. O discurso contra as privatizações que Lula usa contra Alckmin em todo o país será um fator limitador de possíveis soluções estruturais para a crise financeira de vários Estados. Em casos como o do Rio Grande do Sul, por exemplo, mesmo perdendo a eleição, o PT terá imposto sua agenda como fator limitador da latitude de ação ao virtual governo de Yeda Crusius (PSDB).
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O grande problema virá no cenário político e institucional. A se comprovar a origem ilícita do dinheiro que financiou a tentativa dos membros do comitê eleitoral de Lula para forjar uma prova capaz de garantir-lhes a derrota de Alckmin no primeiro turno e a ocorrência de um segundo turno em São Paulo, Lula assume sob o fantasma de um impeachment. Segundo o advogado eleitoralista Antônio Augusto Meyer dos Santos, no caso da efetiva comprovação judicial da irregularidade dos valores determinados para compra ou elaboração do dossiê tabajara, o PT poderá ter seu registro cancelado, na forma da Lei 9.096/95 - Lei dos Partidos Políticos. Se ficar comprovado que, além de crimes eleitorais, crimes de sonegação, lavagem de dinheiro, ingresso ilegal de recursos no país para financiamento de atividade partidária e lavagem de dinheiro estão por trás do financiamento dessa desastrada operação política que servia aos interesses de Lula, a abertura de um processo de impeachment se imporá.
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Estamos no Brasil e já aprendemos que a aplicação da lei é relativa quando se deve aplicá-la contra corruptos que têm apoio popular. Mas a simples abertura de um processo de impeachment, por si só, é capaz de provocar, já no início do segundo mandato de Lula, a paralisia institucional e decisória de um governo que já não vinha aprovando nada de relevante no Congresso, desde o escândalo Waldomiro Diniz.
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Agentes econômicos locais e investidores internacionais esperam que Lula aprove reformas estruturais de conteúdo liberalizante. Podem esperar sentados. Fora a taxação dos aposentados no início do governo, nenhuma reforma estrutural foi aprovada pelo governo Lula. O PT não vai afrontar os sindicatos com a reforma trabalhista. Lula não tem força para aprovar essa reforma tributária pífia que se encontra parada no Congresso. Fora o banco do Maranhão, Lula não privatizou e não vai privatizar nada. Pelo contrário, a tendência é o inchaço ainda maior do Estado e o aumento deliberado dos gastos públicos e da carga tributária necessária para financiá-los.
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Depois de toda a roubalheira que aconteceu, se Lula se reeleger, os ladrões do dinheiro público sentir-se-ão autorizados a ampliar a roubalheira e as crises e escândalos marcarão mais fortemente o virtual segundo mandato de Lula. Alguns auxiliares de Lula mandados para casa por força das circunstâncias que eles mesmos produziram poderão voltar ao governo. Com eles ou sem eles, Lula será cercado por Jader Barbalho, José Sarney e Renan Calheiros, e outros políticos das legendas fisiológicas que deveriam deixar de existir com a cláusula de barreira, mas se movimentam para contorná-la mediante artifícios políticos e jurídicos.
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A disputa eleitoral foi para o segundo turno e isso é um fator de enfraquecimento de Lula e do PT. O poder de barganha da base fisiológica que o governo precisará montar no Congresso cresceu muito, e Lula precisará se envolver ainda mais do que no primeiro mandato com a política suja para conseguir maioria parlamentar na Câmara dos Deputados. No Senado o governo será minoria, a menos que compre a peso de ouro o apoio de uma minoria fisiológica.
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A radicalização dos ataques entre o PT e seus adversários na reta final da eleição é outro fator a jogar água no moinho da crise institucional. Os adversários do PT não esquecerão a tentativa fraudulenta de mudar o destino da eleição presidencial e paulista e já sabem do que o PT é capaz para conquistar e preservar-se no poder. A oposição não tem saída se não radicalizar o enfrentamento democrático à escalada autoritária e populista de Lula, avalizado pelas urnas.PFL e PSDB terão de ir ao divã reavaliar seus erros políticos que vão desde seus rabos presos na mão do inimigo até a subestimação do petismo, visto por eles como um adversário como qualquer outro. Não é. Lula vai preparar um quadro do PT para sucedê-lo. Ilude-se quem pensa que a sucessão de Lula cairá no colo de um aliado-adversário do PT. Nem Ciro Gomes nem Aécio Neves serão abençoados pelo escorpião, por mais que sonhem com isso. É a mesma ilusão daqueles que achavam que não seria necessário submeter Lula ao impeachment, pois essa eleição estaria ganha mesmo antes de começar. O PT luta pelo poder como luta pelo controle de um sindicato, isto é, na base da canelada. E, como no futebol de várzea, o PT considera que a canela do adversário começa logo abaixo do queixo. Mas a crise de identidade da oposição é assunto para outro artigo.

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