domingo, 4 de novembro de 2007

O financiamento da saúde no Brasil é uma história de calotes, um após o outro

A crise da saúde não atinge apenas ao Nordeste, nem é uma crise meramente financeira, nem afeta apenas o setor público. A crise é de finanças e gestão, e está em toda parte. Nós criticamos muito o sistema público, pelas filas, pela espera, pela demanda reprimida, pela falta de recursos, mas estão em situação crítica os idosos atendidos no sistema privado. A Câmara dos Deputados permitiu que a Agência Nacional de Saúde legislasse um aumento de até 500% na mensalidade dos planos de saúde, de acordo com a faixa etária, e ainda impediu o idoso de continuar pagando, ao se aposentar, o mesmo plano de saúde que pagava a sua firma. Estamos, portanto, à beira de ter idosos totalmente descobertos de plano de saúde, e no momento da vida em que mais necessitam desse amparo.

Infelizmente, são os médicos os que reclamam. Mas por que só os médicos? Porque na cultura do povo brasileiro, principalmente o usuário do sistema público de saúde, saúde ainda é um favor e não um direito do cidadão. Os usuários do SUS agradecem exageradamente quando têm o serviço e não reclamam quando não têm. Infelizmente, também os governos federais e estaduais, seguidamente fazem um pouco o jogo poliânico de achar que está tudo bem, de afirmar que a demanda atendida é fantástica, com milhões de atendimentos, milhões de partos e que a mortalidade infantil vem decrescendo.

A mortalidade infantil vem decrescendo em todo o mundo, na África, no Irã, no Vietnã, em lugares onde há guerra, porque a mortalidade infantil decresce inclusive com fatores extrasaúde.

E o que é mais interessante é que os nossos governos não fazem uma comparação que é fundamental para esse entendimento. Se fizessem, verificariam que a mortalidade infantil no Brasil é pelo menos 30% mais alta do que em todos os países do continente sul-americano com renda per capita semelhante à brasileira.

E se formos aos dados de mortalidade, que são, em última análise, aqueles que medem a qualidade de saúde, veremos que os nossos são vergonhosos. A mortalidade materna na cidade de São Paulo é 10 vezes maior do que a mortalidade materna em Portugal. E mortalidade materna é uma tragédia que não precisa acontecer.

Fala-se que financiamento é importante, e é verdade, mas não só o financiamento, a gestão também é. O financiamento da saúde no Brasil é uma história de calotes, um após o outro. O primeiro e o mais recente calote nos foi dado com a seguridade social.

Ou seja, a saúde deveria receber 30% dos recursos da seguridade social e nunca recebeu. Se tivesse recebido, teríamos hoje um pouco mais de R$ 100 bilhões para a área da saúde, o que significa um pouco mais de 500 dólares por habitante/ano - aquilo que se necessita num país como o Brasil. Basta dizer que os Estados Unidos gastam de 6 a 7 mil dólares por habitante/ano, e nós, 250 dólares por habitante/ano. É uma diferença brutal e impossível de ser mantida.

Depois vem o caso da CPMF. É uma vergonha. A CPMF foi apresentada como o imposto a ser usado inteiramente na área da saúde. Eu votei a favor da CPMF. Muitos outros deputados também assim votaram. Mas fomos enganados logo em seguida. Nunca a CPMF foi totalmente para a saúde. A pequena parte destinada a esse setor foi usada para cobrir recursos vinculados à saúde que haviam sido retirados dessa área.

A Emenda nº 29, que tem quase 10 anos, nunca foi regulamentada. E agora a base de apoio do governo quer regulamentar a Emenda nº 29, fazendo o que nós não queríamos que fosse feito quando a aprovamos: usar o dinheiro da saúde para saneamento básico e aposentados, pegar 25% do dinheiro do SUS e oferecer aos estados com os mesmos critérios que tem o Fundo de Participação do Município, critérios de renda per capita, como se o estado mais rico não gastasse mais em saúde e não tivesse a referência de pacientes dos estados mais pobres. É um absurdo o que está se fazendo com a Emenda nº 29 hoje.

Verdadeira revolução na saúde
Deputado Dr. Pinotti (SP)

Nenhum comentário: