quarta-feira, 25 de abril de 2007

Para que serve um deputado?

Na semana passada, a Câmara aprovou o aumento dos rendimentos dos deputados para R$ 16,2 mil sob o argumento, aparentemente correto, de que os R$ 12,8 mil que recebiam antes eram insuficientes para a elevada responsabilidade do cargo.
A Folha de São Paulo demonstrou que a alegação é falsa ao publicar reportagem demonstrando que esses deputados premiados agora com aumento de salário cometeram em fevereiro um erro profissional gravíssimo.
Eles aprovaram uma lei permitindo que autores de crimes hediondos possam responder à Justiça em liberdade provisória, uma enorme contradição com o clamor popular que hoje pede o endurecimento penal para quem comete esse tipo de delito, e não o contrário.
Os deputados contrariaram o que a maioria dos eleitores quer por um pequeno detalhe: não entenderam o que estavam votando. Leram mas não tiveram condições de compreender o assunto, reproduzindo comportamento comum a estudantes do ensino básico, conhecido como analfabetismo funcional.
Para que se tenha uma idéia do tamanho do escândalo desse deslize profissional, crime hediondo é aquele cometido pelos rapazes que arrastaram até a morte, no Rio, o menino João Hélio Fernandes, que ficou preso pelo cinto de segurança durante assalto ao carro de sua mãe.
Se cai um viaduto o arquiteto é processado; se um procedimento médico equivocado põe em risco a vida de um paciente, o médico é acionado na Justiça; se o diretor de um Fundo de Investimentos põe em apuros um aplicador, ele corre o risco de ter seus bens seqüestrados e assim por diante.
Mas se um deputado comete uma barbaridade dessas, nada acontece com ele, a não ser discursos com meia dúzia de desculpas esfarrapadas. Tudo bem que já nos acostumamos com a impunidade. Agora, premiar esses maus profissionais com aumento de salário é uma brincadeira.
Que credenciais apresentaram nos últimos tempos esses especialistas da tribuna, além da ignorância a respeito da matéria prima de seu ofício? Envolvimento em escândalos do mensalão e dos sanguessugas; gazeta oficial na segunda-feira; participação na base de apoio de um governo que envia ao Congresso uma lei como essa, de abrandamento da legislação que pune crimes hediondos; proteção corporativa a colegas que respondem a processos de cassação etc. Eis a folha corrida de um número expressivo de parlamentares.
Felizmente há exceções. Imperceptíveis. Juro que há.
Sabem qual é a grande preocupação deles? Duas: votar o fim da reeleição, que, como lembrou o Clovis Rossi nada acrescenta à vida do cidadão, além de ser uma regra que mudou “anteontem”; e a maneira de se vestir em plenário. É ou não é inacreditável?
O que esperar de um grupo que na primeira oportunidade que tem para prestar contas mente sobre os gastos de campanha; que depois de três meses de trabalho votou apenas um (um é um) projeto relevante para vida dos seres humanos – a Super-Receita; que elege para presidi-los um político autoritário, confuso, que teve mensaleiros como coordenadores de campanha; que não tem sequer o respeito do presidente da República, que recusou aumento de salário de mais de 100% pelo qual esse político lutou como não lutou para punir os assassinos do menino João Hélio?
Respostas por email. E aproveitem para pedir ao Noblat a lista com os votos dos deputados nesse projeto sobre liberdade provisória a autores de crimes hediondos. Deve ser uma informação edificante.
José Negreiros é jornalista.
mailto:josenegreiros@terra.com.br

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