No intervalo da última de suas múltiplas viagens de negócios, o governador Cabral descobriu espantado que a situação da segurança pública no Rio de Janeiro, que já era calamitosa, se agravou bastante durante o seu curto período de governo. Não era para menos. O assassinato do jovem policial militar (Guaracy Oliveira, 27 anos) responsável pela segurança dos seus filhos menores bateu-lhe nas vísceras. Afinal, trata-se de um acontecimento que o aproxima dos mortais comuns, que só conseguem se ver na condição de vítima potencial da insegurança generalizada.
A sua primeira reação, humanamente compreensível e politicamente reveladora, foi pedir socorro. Na clava do senso comum, ele quer o Exército, a Marinha e a Aeronáutica nas ruas. Já houve quem observasse, a propósito de declarações anteriores sobre o tema, que o governador trata dele como se não tivesse atribuições e responsabilidades concretas na condução da segurança pública. Fala como antropólogo, sociólogo, propositor de alterações na legislação penal – agregue-se agora a humana condição de vítima potencial – e nunca como autoridade máxima que dirige o aparato de segurança do Estado.
Ou ele não sabe o que fazer, por desconhecer suas atribuições e responsabilidades, ou sabe que o aparato que tem nas mãos não dá conta do problema que se avoluma. Situação grave, onde nenhuma das alternativas tranqüiliza o cidadão.
O governo federal, por sua vez, faz o de sempre: emite sinais contraditórios para depois não fazer nada. O presidente diz que vai tratar com carinho e atender ao pedido do governador, enquanto o ministro da Justiça se declara em oposição ao uso policial das forças armadas. Para além das limitações de ordem legal, ele deve conhecer a opinião daqueles que estudam, com racionalidade, o complexo problema da segurança. Tais estudiosos existem - na academia, nas organizações sociais, nos próprios aparelhos de segurança e até nas forças armadas - e estão cansados de saber que usar as forças armadas no papel de polícia não resolve o problema da segurança pública, nem aqui nem no Haiti.
Quando o presidente diz que vai ajudar, ele está dizendo também que o problema não é dele. A política nacional de segurança é um papel para inglês ver. Aliás, todos se lembram do discurso de posse, solene e grave, no parlatório de mármore do Palácio do Planalto. O trecho de maior repercussão foi aquele em que, falando exatamente do Rio de Janeiro, o recém empossado proferiu a palavra terrível: terrorismo. Houve quem acreditasse que era coisa séria, senha para o início de uma ação articulada. Palavras ao vento. Não se moveu uma palha, tudo permaneceu como dantes no quartel de Abrantes.
Estamos vivendo tempos sombrios, onde os governos só se ocupam com perseverança e denodo com a continuidade dos grandes negócios. Se a macroeconomia vai bem, o resto pode explodir em mil pedaços. Governar é intermediar negócios e recolher fundos para a próxima campanha eleitoral. Quando o vale de lágrimas explode em violência, os governantes falam qualquer coisa. Prometem mundos e fundos, lançam planos mirabolantes, e até pedem socorro. Puro simulacro. Na sociedade do espetáculo, a micro-política gera governos cenográficos.
Léo Lince é sociólogo.
A sua primeira reação, humanamente compreensível e politicamente reveladora, foi pedir socorro. Na clava do senso comum, ele quer o Exército, a Marinha e a Aeronáutica nas ruas. Já houve quem observasse, a propósito de declarações anteriores sobre o tema, que o governador trata dele como se não tivesse atribuições e responsabilidades concretas na condução da segurança pública. Fala como antropólogo, sociólogo, propositor de alterações na legislação penal – agregue-se agora a humana condição de vítima potencial – e nunca como autoridade máxima que dirige o aparato de segurança do Estado.
Ou ele não sabe o que fazer, por desconhecer suas atribuições e responsabilidades, ou sabe que o aparato que tem nas mãos não dá conta do problema que se avoluma. Situação grave, onde nenhuma das alternativas tranqüiliza o cidadão.
O governo federal, por sua vez, faz o de sempre: emite sinais contraditórios para depois não fazer nada. O presidente diz que vai tratar com carinho e atender ao pedido do governador, enquanto o ministro da Justiça se declara em oposição ao uso policial das forças armadas. Para além das limitações de ordem legal, ele deve conhecer a opinião daqueles que estudam, com racionalidade, o complexo problema da segurança. Tais estudiosos existem - na academia, nas organizações sociais, nos próprios aparelhos de segurança e até nas forças armadas - e estão cansados de saber que usar as forças armadas no papel de polícia não resolve o problema da segurança pública, nem aqui nem no Haiti.
Quando o presidente diz que vai ajudar, ele está dizendo também que o problema não é dele. A política nacional de segurança é um papel para inglês ver. Aliás, todos se lembram do discurso de posse, solene e grave, no parlatório de mármore do Palácio do Planalto. O trecho de maior repercussão foi aquele em que, falando exatamente do Rio de Janeiro, o recém empossado proferiu a palavra terrível: terrorismo. Houve quem acreditasse que era coisa séria, senha para o início de uma ação articulada. Palavras ao vento. Não se moveu uma palha, tudo permaneceu como dantes no quartel de Abrantes.
Estamos vivendo tempos sombrios, onde os governos só se ocupam com perseverança e denodo com a continuidade dos grandes negócios. Se a macroeconomia vai bem, o resto pode explodir em mil pedaços. Governar é intermediar negócios e recolher fundos para a próxima campanha eleitoral. Quando o vale de lágrimas explode em violência, os governantes falam qualquer coisa. Prometem mundos e fundos, lançam planos mirabolantes, e até pedem socorro. Puro simulacro. Na sociedade do espetáculo, a micro-política gera governos cenográficos.
Léo Lince é sociólogo.
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