terça-feira, 10 de março de 2009

Medidas para frear o aquecimento global

Por Redação da Revista Idéia Socioambiental

Integrar o Brasil em um movimento internacional de lideranças dedicadas a promover o desenvolvimento sustentável. Este é o principal objetivo da visita de Jim Garrison, presidente do State of the World Forum (SWF), ao Brasil, entre os dias 4 e 5 de março. Sua agenda inclui reuniões com empresários, líderes sociais e políticos, entre eles o presidente Lula, a quem Garrison convidará a participar em novembro do Fórum Mundial do SWF, junto com Barack Obama e Al Gore.

Trabalhando com o ex-presidente da extinta União Soviética, Mikhail Gorbachev, o historiador Garrison fundou o SWF em 1995 com o objetivo de sensibilizar as lideranças quanto a urgência da transição para uma economia sustentável. Nesse esforço, passou a defender políticas industriais que combinem estratégias para estimular energias renováveis e tecnologias limpas como forma de gerar empregos e recuperar a economia. "Todo país poderia se comprometer com a transição de combustíveis fósseis para renováveis. Essa mudança deveria ser feita não por medo ou sob pressão, mas no mesmo espírito do chamado de John Kennedy para colocar o homem na lua em 10 anos", defende.

Crítico em relação a mecanismos de desenvolvimento limpo (MDL), Garrison defende a precificação do carbono, combinada com incentivos fiscais para tecnologias mais limpas. Segundo ele, esse é o caminho mais rápido para motivar o comportamento corporativo.

Na análise de Garrison, da maneira como está configurado, o sistema de captura e comércio de carbono é para o aquecimento global o que o escândalo da hipoteca subprime foi para o colapso do estado real. "Esse sistema não irá solucionar o aquecimento global. Somente permitirá que as corporações continuem o seu jogo de interesses, adiando a ação decisiva", afirma.

Em entrevista exclusiva a Ideia Socioambiental, Garrison avalia, entre outros temas, as medidas tomadas para frear o aquecimento global e a urgência da mudança de valores para criação de uma sociedade sustentável.
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Ideia Sociaombiental: Como as ações para frear o aquecimento global podem resolver a crise econômica mundial?

Jim Garrison: O mercado capitalista livre e não regulado está entrando em colapso por não ser ecologicamente realista. Os negócios se fundaram na crença do crescimento e desenvolvimento ilimitados, o que não é mais sustentável. Quando olhamos para frente, podemos esperar uma aceleração na produção de crises que surgem, aparentemente, em um lugar isolado, e reverberam ao redor do mundo com efeitos imprevisíveis, desestabilizadores e em cascata. A crise será forte e difícil de superar enquanto a civilização humana não criar um nível mais elevado de visão de futuro e antecipar uma nova era de negócios, baseada no alinhamento dos sistemas humanos com os sistemas naturais.

I.S: Na sua opinião, qual deveria ser o acordo pós-Kyoto. Como as responsabilidades pelo planeta deveriam ser divididas entre países desenvolvidos e emergentes?

J.G: Os acordos de Kyoto estão obsoletos. Eles foram baseados na suposição de que a humanidade tem décadas para resolver a crise do aquecimento global. Nada é mais urgente do que uma mobilização massiva de pessoas e ideias que possam compelir nossos governos e instituições internacionais a enfrentar o aquecimento global e a reforma de políticas que esse desafio implica.

Essa mobilização internacional daria propósito e significado para os planos que estão sob consideração de governos nacionais, direcionaria toda a economia global e proveria esperança para a comunidade internacional. Também seria possível superar a disputa internacional em torno da captura e comércio de carbono, e das reduções de emissões. Cada país conduziria suas próprias análises e traçaria seu próprio trajeto, com a meta de mudar para energias renováveis, essencialmente, dentro de dez anos.

I.S: Qual deveria ser a posição dos EUA na Conferência do Clima de Copenhague?

J.G: Tanto Barack Obama quanto Lula devem ter clareza de que seu legado na história será determinado pela forma como lidarem com as mudanças climáticas. Os EUA, como o maior poluidor com emissões de CO2, deveriam assumir a liderança, angariando o suporte internacional em Copenhague. Essa posição é essencial para alcançar o comprometimento global que tornará a mudança climática a mais importante prioridade em todo o mundo.

I.S: Quais são as principais oportunidades na área de empregos verdes?

J.G: Uma política industrial baseada em energias renováveis e tecnologias verdes irá simultaneamente aliviar a mais grave ameaça para a espécie humana e gerar um boom econômico. Barack Obama comprometeu sua gestão a eliminar a dependência dos EUA em petróleo estrangeiro dentro de 10 anos. Al Gore disse tornar toda a fonte de eletricidade norte-americana em energia renovável no mesmo período. Isso não é somente verdade para os EUA, mas também para o Brasil. De fato, todo país do mundo poderia comprometer-se com a transição de combustíveis fósseis para renováveis em até 10 anos. Essa mudança deveria ser feita não por medo ou sob pressão, mas no mesmo espírito do chamado de John Kennedy para colocar o homem na lua. A transição para uma economia sustentável pode ser feita desde que haja uma liderança visionária e desejo político.

I.S: É possível desenvolver tecnologias limpas para exploração do carvão, que é uma das propostas do plano de Barack Obama na área de meio ambiente e energia?

J.G: Um futuro sustentável não incluirá carvão ou energia nuclear. O desafio mais importante é gerar o comprometimento para mudar as bases das nossas economias de combustíveis fósseis para energia renovável. Precisamos nos comprometer para reduzir as emissões de carbono em 80% até 2020. Todas as novas fontes deveriam ser consideradas, desde campos de energia solar maciça, o cultivo de algas nos oceanos, que consomem grandes quantidades CO2, até o estímulo à produção de carros elétricos para eficiência energética.

I.S: Na sua opinião, o sistema de captura e comércio de carbono apresenta limitações? Quais?

J.G: O sistema de captura e comércio de carbono é para o aquecimento global o que o escândalo da hipoteca subprime foi para o colapso do estado real. Esse sistema não irá solucionar o aquecimento global. Somente permitirá que as corporações continuem o seu jogo de interesses, adiando a ação decisiva. O que precisamos é de uma taxa de carbono. Qualquer indústria que produz CO2 deveria ser pesadamente taxada enquanto ao mesmo tempo deveríamos dar incentivos fiscais para qualquer um que estiver desenvolvendo energia alternativa. Esse é caminho mais rápido para motivar o comportamento corporativo.

I.S: Qual é o papel do governo na transição para uma economia sustentável?

J.G: É papel do governo estabelecer políticas. Se o governo faz um comprometimento claro para tornar a economia sustentável dentro de dez anos, reforma a estrutura de taxas e impõe regras, a sociedade e o setor privado irão participar. Sem uma política governamental clara, a atual situação prevalecerá e a catástrofe será o resultado.

I.S: Os EUA podem reintroduzir um novo estilo de vida, baseado na sustentabilidade em substituição ao "American way of life" que é insustentável em uma escala global? O senhor vê algumas indicações de mudança? Quais?

J.G: A mudança mais empolgante que toma lugar nos EUA é a emergência de novos valores. Isso é o que está por trás da eleição de Barack Obama. Sociólogos têm estudado o fenômeno do "Cultural Creatives". Esse grupo é essencialmente constituído de pessoas que tem participado de movimentos sociais de conscientização desde a Segunda Guerra Mundial. Entram nessa lista os movimentos ambiental, feminista, trabalhista, em defesa dos direitos civis, pela paz, justiça social, de comida orgânica e de cuidados alternativos com a saúde, de uma nova espiritualidade e de crescimento pessoal, entre outros. O Cultural Creatives já conta com mais de 70 milhões de adeptos nos EUA, excedendo substancialmente o número de conservadores sociais e financeiros.

Pela primeira vez em mais de 600 anos - desde a Renascença -um novo sistema de valor chega à civilização ocidental, em nível global e simultaneamente. Essa é uma ocorrência histórica rara e terá implicações tão profundas na cultura americana e mundial como a emergência da Renascença no século 16 teve sobre a Itália e toda a Europa.

I.S: Como as pessoas devem ser educadas para uma sociedade sustentável?

J.G: Tornar nossas economias sustentáveis requer uma mudança completa de pensamento, valores, ações e intenções. Primeiro, devemos entender que se trata de um problema de dimensão planetária e estamos todos no mesmo barco. Segundo, precisaremos envolver uma incrível variedade de populações mundo afora e um espectro amplo de organizações de cada setor da economia, governança e sociedade civil para qualquer ação ter êxito. Terceiro, não podemos tratar qualquer um ou qualquer grupo isoladamente, tentando resolver um problema de cada vez. Quarto, o sucesso prático em realizar ações será auxiliado por estratégias e o uso integrado de toda nossa tecnologia, liderança, planos, valores e ações individuais e coletivos.

I.S: O que o senhor está lendo agora? Quais pensamentos na área de sustentabilidade têm lhe inspirado?

J.G: Acredito que o livro mais importante que todos deveriam ler é o Plan B 3.0, de Lester Brown, fundador do Earth Policy Institute. Nele, o autor recomenda uma série de soluções, incluindo a redução de nossas emissões de carbono em 80% para 2020, que - se implementadas - mudariam as bases de nossas economias de combustíveis fósseis para energia alternativa. Brown está convencido, como muitos estão, de que a mudança climática está agora arriscando a civilização humana e que devemos agir decisivamente e imediatamente para resolver a crise. Seu Plano B 3.0 deveria ser uma leitura obrigatória para formular estratégias de mudanças coletivamente.

(Envolverde/Revista Idéia Socioambiental)

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