terça-feira, 31 de julho de 2007

O desafio messiânico de Jobim

O desafio messiânico de Jobim
Em política, o papel de salvador da Pátria é sempre uma faca de dois gumes. O eventual fracasso aprofunda o ambiente de depressão, que propiciou o surgimento de alguém com aquele perfil, e o sucesso estabelece novas lutas de poder.
Nélson Jobim assumiu o Ministério da Defesa na expectativa de que venha a solucionar a crise aérea, tida como crise de gestão – que ele, nas entrelinhas, considerou mais apropriadamente crise de comando. Se fracassar, desorganiza ainda mais o governo Lula.
Se triunfar, torna-se peça-chave no processo sucessório, o que abre frentes de luta na base política do governo – e a fragiliza.
Jobim, como se sabe, não é um administrador. É um político – e não deixou de sê-lo nem mesmo quando presidiu a mais alta Corte de Justiça do país, o Supremo Tribunal Federal. Não apenas: é político com projeto pessoal ambicioso. Quis ser vice de Lula na eleição do ano passado. Depois quis ser presidente do PMDB.
Nas duas circunstâncias, perdeu – e pelo mesmo motivo: escassa habilidade no trato pessoal. É carismático, voluntarioso e tem sede de comando. Assemelha-se, quanto a isso, a um político do passado, o ex-governador Carlos Lacerda.
Tal como ele, fracassa no quesito diplomacia. Lacerda, em seu depoimento ao Estado de S. Paulo, publicado em 1977, dizia, referindo-se ao golpe militar de 64, que fora chamado para as ações de mobilização pública, mas havia sido excluído das conspirações de bastidores. Quem confiaria num furacão para conspirar?
Jobim, sem exercer o mesmo fascínio, exibe truculência equivalente. É afirmativo, mas, em alguns momentos, extrapola e torna-se soberbo. Seus colegas no STF, a exemplo de seus colegas no Parlamento, o viam, em alguns momentos, como prepotente.
Esse perfil, como é óbvio, não faz muito sucesso na hora de coletar apoios individuais nos bastidores. Por isso, o PMDB optou por Michel Temer para sua presidência. Tem mais a ver com o perfil do partido, multifacetado, controverso. Temer não é afirmativo. É dissimulado, jeitoso. Não é alguém que se chame para enfrentar um pepino como o da crise aérea.
Jobim é performático. Ocupa espaços, transmite sempre a impressão de que está no comando. Nesse sentido, contrasta imensamente com seu antecessor, Waldir Pires, que chegou a dizer que nada tinha a ver com o tráfego aéreo. Pires, por seu passado de exilado político e adversário do regime militar, era visto com reservas no âmbito das Forças Armadas que, em tese, comandava.
Jobim não tem arestas ideológicas com os militares. O tipo de sabotagem que pode sofrer é de natureza político-partidária. O PT teme que sua ascensão o torne nome irrecusável à sucessão de Lula – inclusive com o apoio de Lula. É cedo para a sucessão? Pode ser. O país não está pensando nisso. O país, não – mas os políticos jamais deixam de pensar. A sucessão presidencial, entre eles, começa no instante seguinte ao da posse – e não cessa.
Crise é sinônimo de oportunidade. É quando surgem idéias e gestam-se as mudanças. Jobim é um ator talentoso, a quem Lula está oferecendo palco e script de primeira. A crise é do tamanho de sua ambição, que, por sua vez, gera prevenções e desconfianças de igual ou maior porte.
Seu êxito dependerá não apenas de comando e gerência, mas sobretudo de sua capacidade para lidar com os efeitos políticos colaterais. Boa medida será fingir que não está nem aí para a sucessão presidencial e tornar esse tema simplesmente proibido em seu entorno. No mais, boa sorte – é o que todos desejamos.
Ruy Fabiano

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