terça-feira, 28 de agosto de 2007

Crônica do Márcio

RECITAL PELA EDUCAÇÃO
Primeiro de março de 1981... Um menino chorão e dentuço prepara-se para seu primeiro dia de aula na primeira série “C” da Escola Básica Salgado Filho.
O tempo passou, nem a escola, nem o menino são os mesmos... Ela agora é Escola de Educação Básica Dom Orlando Dotti, ele: professor e escritor: Ambos encontram-se novamente no curso de pós-graduação que funciona nas dependências da escola.
Pois é num desses sábados de aula que ela (a escola) realiza um maravilhoso e edificante “Recital de poesia”... O menino professor está lá, como espectador... boquiaberto, admirado, estático, sem palavras para descrever tamanha admiração ao ver alunos de uma escola pública recitando, corajosamente, grandes autores clássicos e poesias de autoria própria, o que torna o evento ainda mais fascinante. Claro que na retaguarda estão eles: os professores, que fazem a diferença na na ousadia de seus alunos... que não ficaram trancados na sala de professores durante o recreio, queixando-se desta ou daquela turma, deste ou daquele aluno, enquanto degustavam as bolachinhas pedagógicas.
São fatos como este, que reavivam a cada dia, minha utopia de uma educação como caminho para a cidadania e a construção de seres humanos melhores. Quando o corpo docente trabalha junto, cada um contribuindo com seu grão de areia, com certeza, a construção da escola dos sonhos de pais, alunos e professores, chega cada vez mais próxima da realidade.
Sabe-se das inúmeras dificuldades enfrentadas pelas escolas públicas que só são lembradas pelas autoridades quando servem de bandeira para campanha eleitoral... Sabe-se também que a luta por melhorias na educação não pode, nem deve parar... Mas paralelo à luta, é possível disponibilizar aos educandos o gosto pela filosofia e a literatura, dando-lhes a chance de análise crítica da realidade, a partir da união dos vários segmentos da escola.
O que presenciamos no Dotti, no último sábado, foi um exemplo disso: Alunos que se submeteram a deixar seus lares, num sábado de manhã para participarem, como artistas ou espectadores de um recital de poesia: que é Literatura... que trata da arte de usar as palavras... que desenvolve o raciocínio... que abre os olhos e o coração para o mundo e os sentimentos humanos.
Por trás de cada poesia recitada naquele auditório, outrora um pavilhão para jogar bola em dias de chuva, estava uma vida que vencia mais um obstáculo... e por trás de cada obstáculo, uma história, em cada história um exemplo.
Em tempos de altas tecnologias, com o mundo globalizado que aproxima as distâncias e distancia as proximidades, é raro presenciar um evento desses por parte de um educandário... Qual é a receita?... Só um pouquinho de amor pela educação, afinal o ser humano faz melhor aquilo que faz deixando-se guiar pelo coração. Na ausência deste sentimento sublime que nos aproxima ainda mais dos alunos, continuaremos ouvindo queixas e mais queixas, “engolidas” com as tradicionais bolachinhas pedagógicas e café preto servido em micro-xícaras.
De coração, quero externar meu amor e admiração por esta escola que foi a primeira em minha vida e hoje torna-se marcante novamente, ajudando-me a subir mais um degrau na escada do conhecimento, e demonstrando que podemos “fazer a nossa história” na educação pública, com ousadia, indo além das bolachinhas com café naquele sofá marrom e deprimente no canto mais escuro da sala dos professores.
Aquele menino que há mais de duas décadas atrás chorava para entrar na sala-de aula, hoje chora de emoção ao ver que não foi só ele que cresceu: a escola também.
Márcio Roberto Goes

Cria da escola pública, com muito orgulho...

Nenhum comentário: