terça-feira, 22 de junho de 2010

FOCO; TEMA E DISCURSO: OS DESAFIOS DE SERRA E MARINA

Prof. Dr. Paulo G. M. de Moura
O empate registrado pelas duas últimas pesquisas seguidas publicadas por institutos diferentes (Datafolha e Ibope) com intervalo de cerca de uma semana esfriou as expectativas do petismo, que nutria a esperança de que, no embalo do crescimento que Dilma vinha registrando nos últimos meses a essa altura já estivesse à frente de Serra. Além do crescimento contínuo, a divulgação de dados sobre o número de eleitores dispostos a votar na candidata indicada por Lula também contribuiu para nutrir essa expectativa que não se confirmou.

Esse potencial de crescimento de Dilma persiste, mas o que a realidade está mostrando é que a disputa pelos eleitores ainda indefinidos será mais difícil e complexa do que se poderia imaginar. Para ambos os lados.

O eleitorado de Serra e Marina mantém-se em patamares estáveis e Dilma, tudo indica, cresceu sobre eleitores simpáticos à Lula que não a conheciam. Ainda há espaço para a candidata de Lula crescer, mas a vantagem competitiva de que Dilma dispunha vai se reduzindo com o início oficial da campanha e o cerceamento legal ao uso da máquina e do abuso do poder econômico por Lula.

Os petistas debocham dos dilemas estratégicos tucanos, mas tem seus motivos de preocupação, pois temem as vulnerabilidades de Dilma no calor da disputa e a ida a um segundo turno. Dilma começa a fugir dos debates e Lula já admitiu que a presença de Marina na disputa pode provocar o segundo turno. Mas, os petistas já tem sua equação estratégica resolvida. Se tiverem que ir ao segundo turno com o tucano, pretendem pendurar o governo FHC no pescoço de Serra, assim como penduraram as privatizações no pescoço de Alckmin.

Serra e Marina, ao contrário, precisam fazer ajustes em suas estratégias. A sorte de ambos é que há tempo para isso. Outra vantagem de ambos é saberem com antecedência qual é a estratégia do adversário. Se for ao segundo turno, Serra não poderá dizer que foi pego desprevenido ao ser associado ao governo FHC. Convém a ele destacar assessores de marketing para pensar soluções para isso. Mas antes, seu problema é o primeiro turno.

Um dos vetores da estratégia que Serra e Marina precisam ajustar é o foco de suas campanhas. Para definir qual o foco de uma campanha, primeiro é preciso saber o que o eleitor deseja. E o que o eleitor deseja é a continuidade desse cenário econômico e social pelo qual o país passa hoje, e que o beneficia. O foco da campanha deve responder à seguinte pergunta: por que o senhor(a) quer presidir o Brasil? Resposta: Quero presidir o Brasil para garantir a continuidade do que esta aí.

Serra entendeu isso. Por trás de seu slogan “O Brasil Pode Mais” está a ideia de “continuar e ir além”. O problema de Serra é que ele terá que enfrentar Dilma, tendo Lula como cabo eleitoral a dizer que sua candidata é mais qualificada para continuar “sua” obra. Observe-se que Dilma tenta se apropria do discurso da mudança, ao afirmar, em seu discurso de lançamento, que “Lula mudou o Brasil e o Brasil quer seguir mudando.” Os tucanos insistem na tecla de que nem tudo o que está aí é obra exclusiva de Lula. Isso é importante, mas insuficiente. Esse discurso não chega à maioria com a força necessária para neutralizar a potência do apelo de Lula.

Serra alega que seu currículo é melhor do que o de Dilma. É verdade. Mas, e se o eleitor achar que o currículo vale menos do que o apoio de Lula? Nesse caso, não bastará ao tucano mostrar que seu currículo é melhor do que o de Dilma. Será necessário desconstruir a imagem de Dilma. E, para isso, não basta ficar tripudiando sobre os erros no PT na internet ou os dossiês aloprados. Esses pequenos erros devem ser aproveitados, é claro. Em 2006 houve segundo turno por um detalhe como esse. Nenhuma oportunidade de fustigar o PT deve ser desperdiçada.

Acho difícil, no entanto, Serra escapar da propaganda negativa contra Dilma na TV para resolver esse problema no atacado. Se a imagem de Dilma não for arranhada aos olhos de parcelas expressivas do eleitorado, através da propaganda negativa na TV, talvez não haja segundo turno. E, se houver Dilma não pode entrar incólume na disputa, com Serra levado à defensiva como Lula fez com Alckmin. O problema é como fazer isso sem queimar o filme perante os eleitores que Serra quer tirar de Dilma e conquistar para si. Usar o tempo de TV dos aliados agora seria uma boa alternativa para desonerar Serra desse desgaste.

Já o problema de Marina é outro. Seu foco está errado. Marina oferece ao eleitor algo que o eleitor não quer: uma síntese dos governos Lula e FHC. O eleitor quer a continuidade do que está aí. Na semana que passou Marina parece ter ensaiado tentativas de correção de seu discurso.

Outro desafio estratégico da oposição é a definição dos temas com os quais pretende pautar o debate eleitoral. Segundo a última pesquisa Ibope, apenas Segurança Pública (drogas) e Impostos são temas que oferecem alguma oportunidade para oposição levar Dilma à defensiva. Não é por outra razão que Serra vem martelando o assunto das drogas desde a véspera da visita de Evo Morales ao Brasil.

O mesmo não se pode dizer da excessiva carga tributária. Serra evita o assunto, talvez porque o governo FHC tenha sido responsável pela elevação da carga tributária de 24% para 36% do PIB, ao passo que Lula elevou-a de 36% para 40%. No entanto, se o eleitor quer a redução da carga tributária e os candidatos querem votos, que tratem de casar a fome com a vontade de comer.

Se Serra escolheu o tema das drogas, que Marina escolha o compromisso com a redução da carga tributária. Quem assumir essa bandeira associando-a à redução do custo de vida e à geração de empregos pela via da redução dos preços e aumento das vendas e das exportações, certamente penetrará bem no eleitorado, especialmente nas regiões sul e sudeste, nas quais a insatisfação com o governo central é maior do que no nordeste e norte.

Por fim, do conjunto posicionamento, foco, imagem e temas de campanha, nasce o discurso.

O discurso de Marina, em função do erro de foco, também está errado. Seus eleitores estão com ela porque não querem nem Dilma nem Serra; nem Lula nem FHC. E Marina insiste em vender-lhes um governo que seria a síntese entre os governos Lula e FHC. Marina é “mais Lula” do que Dilma. No entanto, como apresentar-se como continuidade de Lula tendo saído do governo Lula? A candidata do PV parece resistir em recorrer à assessoria de profissionais de marketing político e pesquisas de opinião, o que torna difícil a calibragem precisa de suas variáveis estratégicas.

O discurso de Serra, por seu turno, se for esse que ele apresentou no evento de seu lançamento como candidato, padece de um problema sério: a falta de apelo popular. O discurso do tucano é correto, do ponto de vista político, em todos os sentidos. Mas, não dialoga com o estômago e o bolso das maiorias. Com o tema da segurança (drogas), Serra pode chegar a todas as classes e jogar Dilma para a defensiva. Se abraçar o tema da redução da carga tributária enfocado pelo ângulo da redução do custo de vida, talvez encontre um caminho para dialogar com o bolso da maioria, sem perder a coerência com o slogan “O Brasil pode mais”.

Há tempo para testar o potencial desse discurso em pesquisas.

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