Vai votar no 121, 171 ou 184 — homicida, chantagista ou estelionatário?
Se um modesto trabalhador atrasa a prestação do fogão a gás, seu nome aparece como “mau pagador” na guilhotina do Serasa. Mas se um Hildebrando Paschoal — aquele ex-deputado federal pelo DEM, que esquartejava os inimigos com uma motosserra — aparece na sua sala de visita pedindo votos, tudo bem…
O TSE ainda não sabe se a lei da “Ficha Limpa” — em vias de sanção pelo presidente Lula — valerá, ou não, para as eleições de outubro. Houve época em que o tribunal cogitou divulgar os malfeitos dos apenados em primeiro e segundo graus. Acabou desistindo. No Brasil, tudo é possível, até o inimaginável.
Tome-se, por exemplo, aquele jornalista que matou, covardemente, a namorada com cinco tiros pelas costas. Apesar de condenado a 21 anos de cadeia pelo Tribunal do Júri, Antônio Pimenta Neves recorre em liberdade. E seus advogados empurram um segundo julgamento para as calendas gregas. Só não será deputado federal se não quiser.
Imagine-se o homicida candidato:
— Vote no 121! Matou a namorada como se mata um rato! Homem de honra e coragem!
Imagine-se o homicida eleito. E mais: pensem na hipótese absurda de um congressista condenado por homicídio votando, como legislador, a reforma do Código Penal Brasileiro… O réu votando leis que deverão definir os delitos e as penas no Brasil. O bandido “dizendo” como deverá ser julgado…
Os “democratas” (e, com eles, quase todos os outros partidos) reagem ao seu passado de “acoitar” condenados e malfeitores, como o deputado Hildebrando Motosserra. E prometem impor regras aos filiados que pretenderem se candidatar às eleições deste ano. Avisam, por exemplo, que vão rejeitar, em suas convenções, todos os que se enquadrarem numa das situações abaixo:
— Os que respondam por crimes hediondos, ou equiparados, contanto que esteja instaurado o processo penal.
— Os pretendentes que tenham sido indiciados ou respondam a crimes dolosos contra a vida.
— Os aspirantes que, pelo exercício de cargos e funções públicas, tiveram suas contas rejeitadas por decisão irrecorrível de órgão competente, salvo se os efeitos da medida forem interrompidos judicialmente.
— Os filiados que respondam a processos por improbidade administrativa, ou por crimes contra a economia popular, a administração pública, a fé pública, o patrimônio público, o sistema financeiro, com decisão definitiva das instâncias ordinárias de primeiro e segundo grau.
Ufa! Se os partidos políticos filtrassem com tanto zelo a sua lista de candidatos a candidato, nem precisaríamos de lei para excluir “fichas sujas”, o processo de depuração aconteceria ao natural. Ocorre que basta o pretendente ter meia dúzia de votos, mesmo que sejam os votos controlados pelo “tráfico”, os partidos se rendem — e a “ficha” passa a ser apenas um luxo.
Com tantos “se” e tantos “salvo se”, o novo “decálogo” dos democratas, apesar de elogiável, fornece inúmeros “recursos” aos candidatos de ficha suja, apanágio que não lhe é exclusivo. A totalidade dos partidos políticos brasileiros abriga mais “prontuários” do que “currículos”.
No Brasil, as palavras parecem ter perdido o sentido. E a punibilidade parece ter sido extinta.
Nelson Rodrigues reservava uma sábia ironia a propósito desse cacoete brasileiro de jamais definir com clareza o que é certo e o que é errado:
— No Brasil, até o passado é incerto…
Sergio da Costa Ramos
Se um modesto trabalhador atrasa a prestação do fogão a gás, seu nome aparece como “mau pagador” na guilhotina do Serasa. Mas se um Hildebrando Paschoal — aquele ex-deputado federal pelo DEM, que esquartejava os inimigos com uma motosserra — aparece na sua sala de visita pedindo votos, tudo bem…
O TSE ainda não sabe se a lei da “Ficha Limpa” — em vias de sanção pelo presidente Lula — valerá, ou não, para as eleições de outubro. Houve época em que o tribunal cogitou divulgar os malfeitos dos apenados em primeiro e segundo graus. Acabou desistindo. No Brasil, tudo é possível, até o inimaginável.
Tome-se, por exemplo, aquele jornalista que matou, covardemente, a namorada com cinco tiros pelas costas. Apesar de condenado a 21 anos de cadeia pelo Tribunal do Júri, Antônio Pimenta Neves recorre em liberdade. E seus advogados empurram um segundo julgamento para as calendas gregas. Só não será deputado federal se não quiser.
Imagine-se o homicida candidato:
— Vote no 121! Matou a namorada como se mata um rato! Homem de honra e coragem!
Imagine-se o homicida eleito. E mais: pensem na hipótese absurda de um congressista condenado por homicídio votando, como legislador, a reforma do Código Penal Brasileiro… O réu votando leis que deverão definir os delitos e as penas no Brasil. O bandido “dizendo” como deverá ser julgado…
Os “democratas” (e, com eles, quase todos os outros partidos) reagem ao seu passado de “acoitar” condenados e malfeitores, como o deputado Hildebrando Motosserra. E prometem impor regras aos filiados que pretenderem se candidatar às eleições deste ano. Avisam, por exemplo, que vão rejeitar, em suas convenções, todos os que se enquadrarem numa das situações abaixo:
— Os que respondam por crimes hediondos, ou equiparados, contanto que esteja instaurado o processo penal.
— Os pretendentes que tenham sido indiciados ou respondam a crimes dolosos contra a vida.
— Os aspirantes que, pelo exercício de cargos e funções públicas, tiveram suas contas rejeitadas por decisão irrecorrível de órgão competente, salvo se os efeitos da medida forem interrompidos judicialmente.
— Os filiados que respondam a processos por improbidade administrativa, ou por crimes contra a economia popular, a administração pública, a fé pública, o patrimônio público, o sistema financeiro, com decisão definitiva das instâncias ordinárias de primeiro e segundo grau.
Ufa! Se os partidos políticos filtrassem com tanto zelo a sua lista de candidatos a candidato, nem precisaríamos de lei para excluir “fichas sujas”, o processo de depuração aconteceria ao natural. Ocorre que basta o pretendente ter meia dúzia de votos, mesmo que sejam os votos controlados pelo “tráfico”, os partidos se rendem — e a “ficha” passa a ser apenas um luxo.
Com tantos “se” e tantos “salvo se”, o novo “decálogo” dos democratas, apesar de elogiável, fornece inúmeros “recursos” aos candidatos de ficha suja, apanágio que não lhe é exclusivo. A totalidade dos partidos políticos brasileiros abriga mais “prontuários” do que “currículos”.
No Brasil, as palavras parecem ter perdido o sentido. E a punibilidade parece ter sido extinta.
Nelson Rodrigues reservava uma sábia ironia a propósito desse cacoete brasileiro de jamais definir com clareza o que é certo e o que é errado:
— No Brasil, até o passado é incerto…
Sergio da Costa Ramos
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