quarta-feira, 14 de dezembro de 2005

Um debate mal travado

Os setores progressistas das igrejas cristãs estão divididos em relação a Lula e ao PT.
Uma parte já se desligou de ambos e foi de armas e bagagens para o PSOL. Outra parte, contudo, insiste no apoio ao presidente. Seu grande argumento é o fato de que o "povão" continua apoiando o governo. Não há prova melhor, afirmam, de que a Bolsa Família e outros programas sociais estão beneficiando concretamente a população pobre e esta, "que não vive de princípios, mas de realidades", percebe a enorme "transformação estrutural" que o governo do PT está promovendo, apesar das aparências em contrário.
Não se nega o apoio popular de parcela importante do povo pobre a Lula nem que os programas sociais estejam atingindo um numero significativo de famílias pobres. Esses programas, ainda que sejam totalmente insuficientes para tirá-las da miséria, constituem um alívio real, difícil de ser avaliado por quem se situa nos escalões superiores da pirâmide de distribuição da renda. Mas admitir que estejam promovendo uma profunda mudança no quadro social brasileiro é um erro de avaliação política.
Dos malefícios que o governo Lula está causando ao país, talvez o mais grave seja esta anestesia do protesto popular. Sem discutir a intenção do presidente, sua política, objetivamente, está dividindo os movimentos populares e reforçando o conformismo da massa - traço cultural herdado da secular história de subordinação do povo a classes dominantes absolutamente intolerantes e repressivas.
Enquanto essa cultura conformista não for exorcizada, será impossível atacar o problema central da conjuntura: a reversão neocolonial do país, decretada pelos movimentos do capitalismo mundial e pela subserviência da classe dominante. Ocioso dizer que será impossível solucionar os grandes problemas da nação se esse processo não for detido, e, ingênuo, admitir que ele possa ser detido sem luta popular. Contudo, um povo que espera tudo de um grande pai bondoso - e que aceita como impossível que ele faça mais do que está fazendo - não luta pelos seus direitos.
O aspecto dramático, no caso desses cristãos que apoiam incondicionalmente o governo, é que sua posição contribui para reforçar essa condição infantil de grande parte da massa popular.
Defender essa posição equivocada acusando os que se opõem a Lula de puristas, elitistas e outros "istas", em nada ajuda o debate fraterno e esclarecido que este grupo social deveria travar sobre a questão mais importante que lhe foi posta nesta etapa da historia brasileira: qual das estratégias de luta contra a desigualdade os cristãos deveriam apoiar, a fim de contribuir concretamente para acabar com a sobre-exploração do povo por um capitalismo sem entranhas

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