segunda-feira, 29 de abril de 2013

Minha casa no país do carro zero

Minha casa no país do carro zero, por Sérgio Magalhães

Sérgio Magalhães, O Globo

Preocupada com a qualidade de obras do programa Minha Casa Minha Vida (MCMV), a presidente Dilma Rousseff declarou: “Eu não fui eleita para dar casa de qualquer jeito para a população”.

É de meados do século passado que data a grande expansão demográfica e de ocupação territorial que caracteriza o Brasil de hoje. Foram as cidades que suportaram o crescimento populacional e proporcionaram grandes melhoras nos indicadores sociais.

Em setenta anos, os moradores em cidades passaram de 12 milhões para 170 milhões. E os domicílios urbanos, que eram 2 milhões, passaram a 50 milhões, multiplicando 25 vezes. Hoje, 85% dos brasileiros vivem em cidades.

E como foram construídas as moradias para essa população? Foram construídas pelo próprio povo, na precariedade que a falta de recursos impõe. Daí, expressiva parcela morando em condições irregulares, em favelas e em loteamentos sem infraestrutura adequada.

De fato, 80% dos domicílios foram erguidos exclusivamente com a poupança familiar, sem financiamento algum. Isto, apesar de, desde os anos 1940, o governo ter assumido a responsabilidade de prover a moradia popular.

 Através de programas habitacionais que se sucedem, seja o dos IAPs, da Casa Popular, do BNH, do Minha Casa Minha Vida, são os governos os protagonistas. Mudaram os regimes, ditadura, democracia, ditadura, democracia — mas o modelo permanece o mesmo. É o governo que diz onde e como o povo deve morar.

Diferentemente do que ocorre com os automóveis, para os quais há crédito direto, abundante, a juro zero, e o interessado escolhe o que quer, no caso da casa popular é o governo que escolhe. Escolhe a tipologia a construir, escolhe onde e quem constrói, e detém o monopólio do financiamento.

Mas, nestes setenta anos, promoveu apenas 20% das moradias urbanas — somando tudo que foi construído por todos os governos, em todas as instâncias, mais o que foi financiado pelo BNH, Caixa e todos os bancos privados.

Ou seja, a família brasileira construiu, sozinha, quarenta milhões de domicílios, enquanto a soma de todas as políticas habitacionais alcançou dez milhões.



Sérgio Magalhães é arquiteto.

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