domingo, 3 de dezembro de 2006

A normalidade da anomalia

Clóvis Rossi*

O Brasil é um país tão estranho, mas tão estranho, que as maiores anomalias podem ser expostas de público sem causar o menor choque. A mais recente saiu da boca do presidente Luiz Inácio Lula da Silva ao falar sobre as medidas para "destravar" a economia.
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"Não me pergunte o que é ainda, que eu não sei, e não me pergunte a solução, que eu não a tenho, mas vou encontrar, porque o país precisa crescer", disse Lula. É fantástico: Lula passou praticamente toda a sua vida adulta sendo candidato a presidente; quando, enfim, passa quatro anos governando, se candidata de novo a presidente, mas não tem a mais remota idéia do que é necessário fazer para o país crescer.
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O pior é que ninguém se espantou com a confissão de quem, antes da eleição ou pouco depois dela, vivia dizendo que as fundações estavam prontas, que as paredes já estavam praticamente erguidas, faltavam apenas detalhes de acabamento para que, por fim, ocorresse o tal "espetáculo do crescimento".
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Na hora de o espetáculo começar, o diretor da peça avisa que não tem as falas. Era tudo blablablá, promessas ocas de campanha. Aliás, vê-se agora, tardiamente, que já em 2003, quando fez o primeiro anúncio do "espetáculo do crescimento" (que não houve), Lula estava "chutando", aliás uma de suas grandes características.
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Se não tem agora a solução, se não tem agora as respostas para "destravar" o país, muito menos ainda poderia tê-las há quatro anos. Aí, convida o PMDB para um governo de "coalizão", que giraria em torno do crescimento econômico, entre outros itens igualmente vagos.
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Ora, que projeto de crescimento Lula pode oferecer ao PMDB se ele próprio não tem a mais remota idéia do que fazer? No entanto, tudo é dito com a maior naturalidade e engolido como se fosse verdade. Patético.
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*Jornalista, Folha de S.Paulo, 24-11-2006

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