Poucas coisas nos dilaceram tanto a alma quanto as catástrofes que devastam cidades e vidas, expondo a miséria humana e nossa fragilidade diante dos fenômenos da natureza.
Se por um lado essas tragédias revelam que a humanidade ainda não se perdeu de todo e é capaz de se unir em correntes solidárias, por outro demonstram uma das faces mais sórdidas do poder: o uso político, sem qualquer pudor, do sofrimento alheio.
Seja na destruição do Haiti, onde milhares morreram e outros tantos milhões vagam perdidos sem teto, alimento, água ou esperança, seja nos mortos e desabrigados brasileiros depois das chuvas que castigaram e ainda castigam o país, todos, sem exceção, sempre viram moeda política.
E não há qualquer escrúpulo em usá-las.
No Haiti - há mais de dois séculos condenado à sua própria sorte – disputa-se até o nome do plano de salvação.
O governo brasileiro, no afã de promover a liderança do presidente Lula no cenário internacional, finca bandeiras no solo, tenta se rivalizar com os Estados Unidos, bate no peito e diz que o Plano Lula é a solução, embora ninguém saiba o que vem a ser o tal plano.
Por sua vez, os EUA de Barack Obama enxergam naquela terra arrasada uma chance de redenção diante dos males que imputaram ao mundo.
Não economizam recursos e discursos. Cada pedacinho do mundo – até os envergonhados franceses que exploravam a então colônia haitiana - reivindica sua cota de poder na reconstrução.
São demonstrações cruéis que apequenam todas as nações.
Enquanto isso, haitianos em absoluto flagelo veem os dias passarem sem que algum plano, nem mesmo de emergência, saia da lábia para a prática.
Sabe-se apenas que pouco mais de 25% do dinheiro prometido chegou. Não há estratégia definida para a distribuição de congêneres, feita aleatoriamente em absoluta desordem. Quem chega primeiro come e os demais ficam a olhar bandeiras.
No Haiti como aqui.
Das chuvas torrenciais no Brasil, pouco se ouve falar sobre o amparo às famílias dos mortos e aos milhares de condenados ao desabrigo - mais de 25 mil só no estado de São Paulo.
A competição imoral para medir quem fez ou faz mais e as acusações levianas sobre quem deixou de fazer o quê não se sabe onde, dominam o cenário.
Nesse jogo de empurra-empurra para achar o culpado da vez, há sempre os que não se inibem em tirar proveito político da comoção que as calamidades exercem sobre cada um de nós. Faz-se campanha eleitoral deslavada em nome daqueles que tudo perderam e que de tudo e todos necessitam.
Exemplos não faltam, todos de arrepiar.
Ilhado no Rio de Janeiro depois de uma tempestade descomunal, o presidente Lula aproveitou-se do palanque para acusar o ex-prefeito César Maia pelos efeitos danosos das chuvas.
Nas comemorações dos 456 anos da cidade de São Paulo, ao ser agraciado com a Medalha 25 de Janeiro, Lula chegou a convocar o governador José Serra e o prefeito Gilberto Kassab para, juntos, acabarem com as enchentes, por meio do mágico PAC2.
Mesmo para os mais ingênuos, é difícil crer na boa fé de uma proposta de última hora, feita com preciso senso eleitoral, no oitavo e último ano de governo.
Os prefeitos do Rio e de São Paulo fazem coro à irresponsabilidade geral com promessas de investimentos futuros, a eterna cura para todos os males.
Mas o que já é terrível pode ainda ser pior. Nas primeiras semanas do ano, no Jardim Romano, extremo Leste da capital paulista, onde as águas afogam o bairro inteiro há mais de mês, equipes produtoras de campanha trabalhavam incansavelmente.
Colhiam sorridentes e sem qualquer vergonha depoimentos de desesperados para usarem no horário eleitoral gratuito.
Diante de cenas tão aviltantes, que parecem nada incomodar àqueles que delas tiram proveito, só nos resta um apelo: que tal um pouco de pudor, senhores?
Mary Zaidan é jornalista.
Se por um lado essas tragédias revelam que a humanidade ainda não se perdeu de todo e é capaz de se unir em correntes solidárias, por outro demonstram uma das faces mais sórdidas do poder: o uso político, sem qualquer pudor, do sofrimento alheio.
Seja na destruição do Haiti, onde milhares morreram e outros tantos milhões vagam perdidos sem teto, alimento, água ou esperança, seja nos mortos e desabrigados brasileiros depois das chuvas que castigaram e ainda castigam o país, todos, sem exceção, sempre viram moeda política.
E não há qualquer escrúpulo em usá-las.
No Haiti - há mais de dois séculos condenado à sua própria sorte – disputa-se até o nome do plano de salvação.
O governo brasileiro, no afã de promover a liderança do presidente Lula no cenário internacional, finca bandeiras no solo, tenta se rivalizar com os Estados Unidos, bate no peito e diz que o Plano Lula é a solução, embora ninguém saiba o que vem a ser o tal plano.
Por sua vez, os EUA de Barack Obama enxergam naquela terra arrasada uma chance de redenção diante dos males que imputaram ao mundo.
Não economizam recursos e discursos. Cada pedacinho do mundo – até os envergonhados franceses que exploravam a então colônia haitiana - reivindica sua cota de poder na reconstrução.
São demonstrações cruéis que apequenam todas as nações.
Enquanto isso, haitianos em absoluto flagelo veem os dias passarem sem que algum plano, nem mesmo de emergência, saia da lábia para a prática.
Sabe-se apenas que pouco mais de 25% do dinheiro prometido chegou. Não há estratégia definida para a distribuição de congêneres, feita aleatoriamente em absoluta desordem. Quem chega primeiro come e os demais ficam a olhar bandeiras.
No Haiti como aqui.
Das chuvas torrenciais no Brasil, pouco se ouve falar sobre o amparo às famílias dos mortos e aos milhares de condenados ao desabrigo - mais de 25 mil só no estado de São Paulo.
A competição imoral para medir quem fez ou faz mais e as acusações levianas sobre quem deixou de fazer o quê não se sabe onde, dominam o cenário.
Nesse jogo de empurra-empurra para achar o culpado da vez, há sempre os que não se inibem em tirar proveito político da comoção que as calamidades exercem sobre cada um de nós. Faz-se campanha eleitoral deslavada em nome daqueles que tudo perderam e que de tudo e todos necessitam.
Exemplos não faltam, todos de arrepiar.
Ilhado no Rio de Janeiro depois de uma tempestade descomunal, o presidente Lula aproveitou-se do palanque para acusar o ex-prefeito César Maia pelos efeitos danosos das chuvas.
Nas comemorações dos 456 anos da cidade de São Paulo, ao ser agraciado com a Medalha 25 de Janeiro, Lula chegou a convocar o governador José Serra e o prefeito Gilberto Kassab para, juntos, acabarem com as enchentes, por meio do mágico PAC2.
Mesmo para os mais ingênuos, é difícil crer na boa fé de uma proposta de última hora, feita com preciso senso eleitoral, no oitavo e último ano de governo.
Os prefeitos do Rio e de São Paulo fazem coro à irresponsabilidade geral com promessas de investimentos futuros, a eterna cura para todos os males.
Mas o que já é terrível pode ainda ser pior. Nas primeiras semanas do ano, no Jardim Romano, extremo Leste da capital paulista, onde as águas afogam o bairro inteiro há mais de mês, equipes produtoras de campanha trabalhavam incansavelmente.
Colhiam sorridentes e sem qualquer vergonha depoimentos de desesperados para usarem no horário eleitoral gratuito.
Diante de cenas tão aviltantes, que parecem nada incomodar àqueles que delas tiram proveito, só nos resta um apelo: que tal um pouco de pudor, senhores?
Mary Zaidan é jornalista.
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