terça-feira, 17 de outubro de 2006

Lula, de onde é que veio o dinheiro?
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Elio Gaspari*
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Lula não deve reclamar de Geraldo Alckmin. Precisa calçar as sandálias da humildade para o próximo debate, pois afogou-se na poça de platitudes de um adversário previsível, frio como papa-defunto.
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Alckmin tem razão: "De onde é que veio o dinheiro?". O companheiro ainda não entendeu que a falta de uma resposta a essa pergunta pode lhe custar a reeleição e um pedaço da biografia.
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Lula passou os últimos quatro anos sem ouvir o contraditório. Diante dele, olho no olho, ao vivo e a cores, desconcertou-se. O peso da banda áulica no Palácio do Planalto de Nosso Guia só tem paralelo no governo do general João Figueiredo (1979-1985). A linguagem chula e a maneira destemperada como Lula trata seus colaboradores fazem de Figueiredo uma carmelita. Diz o que quer e só ouve o que quer.
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O entorno dos governantes isola-os das adversidades e das contraditas.
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O café vem como ele gosta. O assessor que carrega a toalha para enxugar o suor está sempre por perto. (Lembrai-vos do curador de almofadas para as pernas curtas do imperador etíope Hailé Selassiê.) Pode-se contar nos dedos quantas vezes um presidente é obrigado a teclar uma chamada telefônica. (Harold Wilson, primeiro-ministro inglês durante oito anos, confessou que, ao voltar à vida real, o que mais estranhou foi discar telefone.)
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Alguns, como Fernando Henrique Cardoso, têm senso de humor para rir das portas que se abrem sozinhas. Outros acreditam que porta fechada é desaforo. O livro "Viagens com o presidente", dos jornalistas Leonencio Nossa e Eduardo Scolese mostra que Lula está nessa categoria.
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O companheiro vive nesse mundo encantado e, numa bela noite de domingo, vê-se diante de Geraldo Alckmin: "De onde veio o dinheiro?".
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Lula parecia um boxeador insultado porque o adversário o atacava.
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Chegou a perder uma ficha. Para quem gosta de velharia, lembrava Muhammad Ali fazendo pouco de Joe Frazier na memorável luta de 1971.
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Frazier acertava-lhe o baço, o fígado e os rins. ("De onde veio o dinheiro?") Ali ria. Frazier batia. ("De onde veio o dinheiro?") A certa altura, Ali tomou um daqueles socos que derrubam cavalo.
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Conseguiu levantar-se, mas não havia dúvida: acontecera o impossível, Ali perdera. O jogo não terminou: anos mais tarde, com a mesma tática, Ali nocauteou George Foreman.
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Lula não fez o dever de casa. Alckmin não concluiu a venda do avião do governo de São Paulo. Fechar ministérios pode ser boa idéia, mas não equilibra orçamento. É como cortar cabelo para perder peso. Falar em aumentar os investimentos cortando a corrupção avaliada pelo FMI em 3,5 bilhões de dólares é retomar uma ladainha petista. Era esse o remédio que Marta Suplicy oferecia para sanear as finanças de Maluf. O bordão prometia "fechar as torneiras da corrupção".
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Nosso Guia confundiu-se ao contar que barateou o preço dos computadores de consumo popular. Não conseguiu sequer falar bem de si além dos limites do "nunca neste país". O estilo "deixa comigo" revelou-se desastroso. Não foi Alckmin quem bateu demais, foi Lula que não soube fazer outra coisa senão apanhar.
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Faltam menos de duas semanas para a eleição: "De onde veio o dinheiro?".
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Uma coisa é reeleger um presidente que não sabe de onde veio o ervanário que mercadejava o dossiê Vedoin. Muito outra é reeleger um candidato que se aborrece quando alguém lhe faz essa pergunta.
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*Jornalista, Correio do Povo, 11/10/2006

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