Todos os sábados, de duas a três horas, o presidente Rafael Corrêa apresenta-se no rádio aos cidadãos do Equador. O pretexto é prestar contas do que faz. Na prática, ele incita o ouvinte contra a imprensa, que acusa de "corrupta" e de "vendida", com um sugestivo fundo musical: "mentem, mentem, mentem... não param de mentir".
Isso lembra alguém, de algum lugar? Sim, lembra Hugo Chávez, da Venezuela, que inaugurou programas jogando a população contra a imprensa e agora vai da palavra aos atos: toda hora, manda fechar uma TV daqui, dúzias de rádios dali. Já são mais de 30.
O nível de manipulação popular contra TVs, rádios, jornais, seus donos e seus jornalistas vem num crescendo. Porque tudo que os governantes não querem é ler, ouvir e ver os desmandos de seus governos, de seus grupos de poder e até de seus familiares expostos à opinião pública. Preferem tudo intramuros, restrito aos seus palácios.
Rafael Corrêa, por exemplo, tem sido ousado nas políticas sociais, nos avanços da economia e na reordenação institucional de um país que chegou a ter oito presidentes numa única década. Mas os méritos que lhe rendem uma alta popularidade entre pobres e ricos não lhe dão o direito de calar a crítica, nem de ocultar que seu irmão, Fabrício, está enrolado com contratos de construção civil.
Governantes devem explicações aos seus governados. E quem não deve não teme, não é verdade?
Nada é perfeito, e a imprensa comete erros, às vezes gritantes. Mas não é fechando canais e decidindo quais devem morrer e quais devem sobreviver que Chávez vai depurar os procedimentos da mídia nem contribuir para a consolidação da democracia, nem na Venezuela, nem na América do Sul.
A imprensa não é para badalar o poderoso, mas para provocá-lo, cobrá-lo, muitas vezes irritá-lo. Mais vale um governante irritado do que um país sem a mídia para irritá-lo.
Essa escalada que parte dos Andes é, sem dúvida, preocupante. Você, que gosta de notícias, que acompanha a Folha e/ou a Folha Online, que está aqui lendo nossas Pensatas, deve ficar atento e reagir pelo direito de liberdade de expressão, porque começa assim, lá nos Andes, e depois se espalha por aí.
Na última reunião da Unasul (União das Nações Sul Americanas), aqui em Quito, Equador, onde ainda estou, a turma "bolivariana" tentou emplacar uma condenação à imprensa livre na declaração final, sem sucesso. Mas já foi um começo. É hora de dar um basta.
A mídia é central no sistema de pesos e contrapesos. E é como a democracia (ou o casamento, se preferirem): cheia de defeitos, mas ainda não inventaram nada melhor.
Eliane Cantanhêde é colunista da Folha, desde 1997, e comenta governos, política interna e externa, defesa, área social e comportamento. Foi colunista do Jornal do Brasil e do Estado de S. Paulo, além de diretora de redação das sucursais de O Globo, Gazeta Mercantil e da própria Folha em Brasília.
Isso lembra alguém, de algum lugar? Sim, lembra Hugo Chávez, da Venezuela, que inaugurou programas jogando a população contra a imprensa e agora vai da palavra aos atos: toda hora, manda fechar uma TV daqui, dúzias de rádios dali. Já são mais de 30.
O nível de manipulação popular contra TVs, rádios, jornais, seus donos e seus jornalistas vem num crescendo. Porque tudo que os governantes não querem é ler, ouvir e ver os desmandos de seus governos, de seus grupos de poder e até de seus familiares expostos à opinião pública. Preferem tudo intramuros, restrito aos seus palácios.
Rafael Corrêa, por exemplo, tem sido ousado nas políticas sociais, nos avanços da economia e na reordenação institucional de um país que chegou a ter oito presidentes numa única década. Mas os méritos que lhe rendem uma alta popularidade entre pobres e ricos não lhe dão o direito de calar a crítica, nem de ocultar que seu irmão, Fabrício, está enrolado com contratos de construção civil.
Governantes devem explicações aos seus governados. E quem não deve não teme, não é verdade?
Nada é perfeito, e a imprensa comete erros, às vezes gritantes. Mas não é fechando canais e decidindo quais devem morrer e quais devem sobreviver que Chávez vai depurar os procedimentos da mídia nem contribuir para a consolidação da democracia, nem na Venezuela, nem na América do Sul.
A imprensa não é para badalar o poderoso, mas para provocá-lo, cobrá-lo, muitas vezes irritá-lo. Mais vale um governante irritado do que um país sem a mídia para irritá-lo.
Essa escalada que parte dos Andes é, sem dúvida, preocupante. Você, que gosta de notícias, que acompanha a Folha e/ou a Folha Online, que está aqui lendo nossas Pensatas, deve ficar atento e reagir pelo direito de liberdade de expressão, porque começa assim, lá nos Andes, e depois se espalha por aí.
Na última reunião da Unasul (União das Nações Sul Americanas), aqui em Quito, Equador, onde ainda estou, a turma "bolivariana" tentou emplacar uma condenação à imprensa livre na declaração final, sem sucesso. Mas já foi um começo. É hora de dar um basta.
A mídia é central no sistema de pesos e contrapesos. E é como a democracia (ou o casamento, se preferirem): cheia de defeitos, mas ainda não inventaram nada melhor.
Eliane Cantanhêde é colunista da Folha, desde 1997, e comenta governos, política interna e externa, defesa, área social e comportamento. Foi colunista do Jornal do Brasil e do Estado de S. Paulo, além de diretora de redação das sucursais de O Globo, Gazeta Mercantil e da própria Folha em Brasília.
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