terça-feira, 24 de junho de 2008

Lula e o PT, nada a ver?

Essa é uma pergunta que muita gente deve estar se fazendo nos últimos meses, dentro e fora do governo, principalmente no mundo petista. Questionamento que a cada entrevista do presidente Luiz Inácio Lula da Silva fica ainda mais pertinente. Na última, concedida ao 'Jornal do Brasil', o presidente petista mostrou mais uma vez que não anda muito contente com seus companheiros de partido. De novo criticou a direção nacional do PT por ter vetado a aliança entre o prefeito petista de Belo Horizonte, Fernando Pimentel, e o governador tucano mineiro, Aécio Neves. Foi bem explícito ao dizer que é um 'crítico do comportamento do PT' em relação a BH. Fica claro que os dois lados não estão falando a mesma língua. Lula diz inclusive que seu partido corre o risco de sair perdedor nesse episódio, ao analisar que, 'na política, também quando você cria estigmas contra as pessoas [no caso, contra Aécio Neves] você começa a perder'.

O fato é que está em pauta, nos bastidores petista, uma disputa entre a direção partidária e sua principal liderança, o presidente Lula. Uma contenda que ninguém admite publicamente, mas que corre solta dentro do PT. A atual cúpula petista quer ser mais ouvida e mais influente no próximo governo. Hoje, seu espaço está muito restrito. Lula não dá muita bola para seu partido na hora de decidir os rumos do governo. Reuniu um grupo fiel de assessores e com eles vai governando, sempre deixando claro que a última palavra é sua. Nada mais natural num regime presidencialista, mas nada a ver com o estilo petista que sempre gosta de debater, debater e tomar decisões no estilo assembléia. Claro que uma assembléia formado pelos que comandam o partido. Mas essa é uma outra história, que trata dos diversos grupos petistas.

Vem daí a resistência ao nome da ministra Dilma Rousseff (Casa Civil) em determinadas tendências do partido, a preferida de Lula para sucedê-lo. Se ela ganhar, a atual cúpula deve continuar na mesma situação de hoje, orbitando mas pouco influenciando os destinos do governo. O problema desses grupos insatisfeitos com o estilo Lula é que suas chances de se manter no poder dependem exclusivamente do presidente. Sem ele, esqueçam, o partido terá de voltar para a oposição. Daí que não adianta muito ficar se insurgindo contra o presidente. A cúpula petista pode até bater o pé, virar a cara para os desejos presidenciais nos destinos do partido, mas no quesito sucessão terá de seguir, mesmo a contragosto, as preferências de Lula. Talvez aí esteja o troco. Tudo bem, eles não conseguem impor sua vontade na discussão da sucessão presidencial. Mas dão uma pequena estocada em Lula sinalizando que no partido mandam eles. Sinceramente, quem tem a perder nesse caso, como disse o presidente na entrevista ao JB, é o partido, não ele.

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E por falar em desejos presidenciais

Lula é tido como um homem de muita sorte. Teve, durante boa parte de seu governo, o vento internacional favorável na economia, ajudando a inflação cair e o país crescer. A oposição costuma dizer que não fosse essa brisa externa as coisas não teriam ido tão bem aqui dentro. Um exagero. Lula tem seus méritos na condução da política econômica. Foi até mais austero em dado momento do que o governo FHC, que também teve lá suas fases de gastança. Voltando à questão da estrela presidencial, é inegável, porém, que o petista tem realmente lá o seu lado de afortunado. Foi em seu governo que a Petrobras desandou a descobrir reservas de petróleo, e de boa qualidade, o leve, que vale mais. Reservas que podem colocar o país entre os principais produtores de petróleo no mundo, tornando o Brasil em algo inimaginável: grande exportador de derivados do ouro negro. Daí que Lula decidiu que vai faturar o máximo com sua sorte. E não só no petróleo. Também na mineração. Ele mandou sua equipe estudar mudanças nas regras atuais que definem quanto o governo federal fatura pela exploração de petróleo e de minerais no país. Quer ganhar mais com as novas reservas descobertas no país e também com a alta dos preços no setor de mineração. Dificilmente seu governo vai saborear a grana que tudo isso vai render. Seu sucessor é que deve lucrar com essas mudanças de regras. Caberá, porém, ao governo atual o debate sobre o que fazer com esse dinheiro. O senador Aloizio Mercadante (PT-SP) sugeriu a criação de um fundo para investimento em educação. Lula parece ter comprado a idéia. Pode fazer toda a diferença. De longe nosso país hoje perde e muito em competitividade por conta das deficiências no nosso sistema educacional. Basta dar uma olhada na falta de mão-de-obra qualificada que está afetando alguns setores da economia depois que o país começou a registrar um novo ciclo de crescimento. A conferir.

Valdo Cruz, 46, é repórter especial da Folha. Foi diretor-executivo da Sucursal de Brasília durante os dois mandatos de FHC e no primeiro de Lula. Ocupou a secretaria de redação da sucursal e atuou como repórter de economia. Escreve às terças.

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