segunda-feira, 29 de junho de 2009

Deuses

Se houve ou não fraude nas eleições do Irã ou até que ponto os protestos foram instigados de fora, não sei (afinal, eu não posso saber tudo!), mas a melhor notícia sobre as manifestações de rua naquele país é que elas parecem ter transcendido o mero inconformismo eleitoral. O candidato derrotado nas eleições, Mousavi, seria melhor do que o Ahmadinejad, o que já não é dizer muito, mas era um produto da mesma ortodoxia e não representava uma mudança muito radical nos costumes políticos do país. Se não fosse uma alternativa aceitável ao atual presidente, com a bênção dos aiatolás, Mousavi nem seria candidato. Mas pelo menos uma parte dos manifestantes, pelo que se viu e se leu, protestava justamente contra o sistema que dava tal poder sobre a política e a vida dos iranianos a líderes religiosos. Era uma clara manifestação de insurgência secular, de saco cheio com a prepotência teísta.
Uma revolta a ser imitada, para a boa saúde do planeta, onde quer que Deus, nas suas diferentes versões, seja invocado para justificar o obscurantismo e a violência. Principalmente no Oriente Médio, onde os monoteísmos se engalfinham há anos e cada versão de Deus tem suas razões para a intransigência. Israel é um estado laico, mas o fundamentalismo religioso aliado à extrema direita, hoje no poder, o leva a comportar-se, muitas vezes, como uma teocracia impiedosa. O Hamas se sobrepôs à secular Autoridade Palestina porque prometia uma violência mais efetiva contra Israel, mas também pelo seu apelo religioso, pela promessa de que tinha um deus forte.
A nação que, de um jeito ou de outro, domina a região, com a benção dos americanos, a Arábia Saudita, além de ser uma das teocracias mais retrógradas é uma das últimas monarquias absolutas do mundo. O Irã tem pelo menos a desculpa de que o deus dos aiatolás reina sobre uma republica.
Mas isto é um pobre consolo para quem vive num país em muitos sentidos moderno e com uma cultura notável, e deve se resignar a ser tutelado em tudo - da escolha de candidatos à escolha da roupa apropriada - por meia dúzia de cléricos com linha direta para Deus.
MILÍMETROS
Não sei se você se deu conta: o mundo esteve à beira de uma catástrofe nestes últimos dias. Por uma questão de milímetros a final da Copa das Federações não foi entre África do Sul e Estados Unidos. O que obrigaria todos os cronistas esportivos do mundo a mudar de profissão, ou dedicar-se exclusivamente ao ping-pong. Foi por pouco.
Luiz Fernando Veríssimo

Nenhum comentário: