Ruy Fabiano
A crise institucional por que passam Câmara e Senado agrava a estimativa de que a reforma política, mais uma vez, não será feita. Com isso, volta a circular uma antiga e polêmica tese, que conta com a simpatia do PT e do presidente Lula: a de convocar uma Assembléia Nacional Constituinte exclusivamente para fazê-la.
A tese não surgiu agora. Ainda no primeiro mandato de Lula, em julho de 2006, uma comissão de dez juristas, entre os quais quatro ex-presidentes da OAB, esteve com o presidente no Palácio do Planalto. O encontro tinha um objetivo: apresentar a Lula, que o havia encomendado, um estudo sobre CPIs, de modo a regulamentá-las e impedir seus excessos.
No meio do encontro, no entanto, o presidente arriscou uma pergunta sobre a possibilidade de uma Constituinte parcial, para fazer as reformas política e tributária. Sua idéia, segundo disse, era de uma mini-Assembléia Nacional Constituinte exclusiva, não restrita em sua composição aos partidos políticos. Funcionaria paralelamente ao Congresso, que seria eleito em outubro daquele ano.
A tese dividiu politicamente o grupo, que, no entanto, convergiu num ponto: juridicamente não haveria maiores óbices para convocá-la. O grupo tratou o tema informalmente com o presidente, sem desconfiar que a iniciativa de abordá-lo lhe seria a seguir debitada, o que geraria polêmicas e um esclarecimento posterior da OAB, que já se opusera anteriormente à idéia e voltou a dela dissociar-se por meio de nota oficial.
Assim que o grupo deixou o Palácio, o porta-voz da Presidência informou à imprensa que os juristas haviam admitido a hipótese de uma mini-Constituinte para a reforma política. Não havia consenso quanto a seu formato: uns a sugeriam exclusiva e não partidária; outros, congressual; e outros mais abrangente, envolvendo mais capítulos da Constituição. Mas, enfim, o tema estava posto.
A reação no meio político e jurídico foi negativa e a discussão não prosperou. Mas voltaria sazonalmente à tona, sem gerar entusiasmo. Agora, com a crise de Câmara e Senado e a evidência de que está associada à depreciação contínua da qualidade da representação política, decorrente, por sua vez, de um sistema eleitoral ruim, que favorece a corrupção, o tema da reforma política ganha força, mas não viabilidade operacional.
Como empreendê-la com o atual Congresso? Além de não demonstrar vontade política de fazê-la, não apresenta condições morais satisfatórias. Assim sendo, as próximas eleições serão regidas basicamente pelas mesmas regras das anteriores, o que deve ensejar resultados e procedimentos semelhantes.
A sociedade, porém, dá sinais claros de que quer mudanças. E é aí que os adeptos da tese da Constituinte querem investir. Lula não se opõe a que o tema seja explorado, desde que seu nome não seja, pelo menos nesta etapa, a ele associado.
O que se sabe sobre o formato a ser proposto é quase nada. Pode ser parcial, envolvendo apenas os capítulos da organização política e do sistema tributário, como de interesse do Planalto. Ou mais abrangente. Os únicos capítulos que os aliados esquerdistas do governo consideram intocáveis são os referentes aos direitos e garantias individuais e o trabalhista. Os demais, segundo eles, são detonáveis. O tema é polêmico e pouco palatável. Divide o meio jurídico e político, não se sabe em que proporção.
A OAB já se manifestou no passado contrária, nos seguintes termos: “Constituinte, plena ou parcial, exclusiva ou derivada - só se justifica quando há ruptura institucional. Não é o caso. Em que pesem as múltiplas denúncias envolvendo agentes públicos que abalaram o país nos últimos meses, as instituições funcionam e estão em condições de fornecer os remédios necessários à preservação da governabilidade, na plenitude do Estado democrático de Direito".
Tudo indica, apesar disso, que a discussão será reaberta.
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