quinta-feira, 9 de julho de 2009

Torpeza bilateral

A crise política em Honduras revela quatro fatos relevantes que merecem ser destacados sobre a América Latina. O primeiro, e mais importante, é que não se faz mais golpe de Estado como antigamente. O segundo é a evidência cada vez mais perniciosa do chavismo. Já as duas últimas constatações se confundem: à inutilidade da Organização dos Estados Americanos (OEA) junta-se o desprezo dos Estados Unidos ao bananismo hispânico para revelar a nossa diminuta projeção no mundo ocidental.

Vamos por parte. O senhor Manuel Zelaya, de repente virou a diva da ópera e passou, depois de deposto, a ostentar virtudes democráticas que definitivamente está longe de possuir. Caiu porque conspirou contra as elites fruticultoras que representa ao abraçar o chavismo e pretender dar golpe por intermédio de consulta plebiscitária importada de Caracas para permanecer indefinidamente no poder. Usurpou da Constituição e desabou de maduro em madrugada domingueira.

Já os golpistas, aparentemente amparados pela mesma Constituição, formaram tríplice aliança do Poder Legislativo, da Suprema Corte e das Forças Armadas, sempre elas, supostamente para restaurar os postulados democráticos de uma Carta que se sustentava desde 1982. Não desconfiaram que o expediente seria inaceitável sob qualquer aspecto justamente por revigorar um tipo de regime que o subcontinente se esforça por esquecer.

Não há inocentes nesta fanfarronice política e a pior atuação fica por conta da infiltração de poder do movimento bolivariano na região. O regime de Hugo Chávez tem sido um hábil agiota e com o poder usurário conferido pelo seu petróleo passou a comprar todas as republiquetas andinas e caribenhas. O chavismo está deteriorando as frágeis instituições da América Latina e o êxito do seu projeto canhestro conta, infelizmente, com o assentimento acintoso do Itamaraty e da política do jogo do contente de Barack Obama. Este com seis meses de poder já deu demonstração que tem tudo para acabar como um Jimmy Carter.

O mais interessante até agora no episódio foi a intervenção patética da OEA, que avocou os princípios que regem o organização internacional de só admitir no seu seio, vamos dizer assim, Estados ostensivamente democráticos. Perfeitamente, agora o ingresso de Cuba recentemente aprovado merece melhor explicação. A atitude nada mais é do que prolongamento da política de tolerância da OEA à difusão do totalitarismo chavista. Age em flagrante dubiedade e por isso colhe a desmoralização.

A Organização dos Estados Americanos há tempos tem papel figurativo, cuja função meramente protocolar só serve para estender a cansativa e dispendiosa burocracia diplomática dos seus integrantes. E, francamente, uma instituição que precisa do empréstimo de uma aeronave de segunda linha da Força Aérea Brasileira para deslocar seu secretário-geral até Tegucigalpa não está em condição de dar ultimato a ninguém.

A OEA de uma hora para outra virou guardiã de uma democracia para apoiar um caipira golpista contra uma quartelada extemporânea. Não se iludam pois o caso de Honduras envolve torpeza bilateral e como tal será resolvido. Mesmo porque a interferência de El Salvador, Equador, Paraguai e Argentina não recomenda – somada a qualidade dos dois lados hondurenhos –composição de alto nível do conflito. E não esperem maiores preocupações de Washington porque Obama não parece interessado nem em caçar Osama Bin Laden.

Demóstenes Torres é procurador de Justiça e senador (DEM-GO)

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