Dora Kramer
A simples decisão do Tribunal Superior Eleitoral de autorizar o envio de tropas federais ao Rio, alegadamente para assegurar a segurança na eleição, não é garantia de nada nem vai livrar um universo (mal) calculado entre 500 mil e 1 milhão de eleitores, do tacão das milícias e do narcotráfico.
Aliás, nem o cumprimento da decisão é certo. De posse de informações fornecidas nas últimas semanas por diversas fontes, o TSE pôde ter uma noção aproximada do risco contido na imposição de reservas de mercado de votos pela força e fez um gesto.
Quase fidalgo se comparado à ferocidade do inimigo, mas indicativo de que pelo menos um dos Poderes da República já se deu conta de que algo precisa ser feito para conter o crescimento da bancada do crime no Legislativo - nos âmbitos municipal, estadual e federal - antes que daqui a pouco o Brasil comece a conviver com candidaturas de prefeitos, governadores e, por que não dizer, presidentes da República claramente identificados com a bandidagem.
A Justiça Eleitoral acenou com um "alto lá" ao optar pelo envio das tropas federais com tanta antecedência. Disse ao adversário o seguinte: se a idéia é partir para a ignorância, então que se explicite a fortaleza de quem tem a prerrogativa legal do uso da força, o Estado.
Uma das fontes de informação do ministro Ayres Britto - não a única - foi a Comissão de Segurança Pública da Câmara, cujo presidente, deputado Raul Jungmann, passou o último mês coletando os subsídios repassados ao presidente do TSE.
Segundo ele, cruzando dados dos eleitos no último pleito para deputado estadual com as respectivas votações nas áreas dominadas, não é difícil chegar à conclusão de que hoje de 25% a 30% dos integrantes da Assembléia Legislativa do Rio de Janeiro têm alguma ligação com o tráfico ou com as milícias.
Resultado: "O poder que está saindo das urnas é de alguma forma conivente, convivente ou condicionado pelos meios e modos impostos pelo crime", diz o deputado.
Sem estatísticas precisas - ademais, por inexistentes da área de segurança pública de maneira unificada, centralizada e confiável -, Jungmann adere ao cálculo do eleitorado de 500 mil a 1 milhão de pessoas (no Rio, capital, há cerca de 4 milhões e 500 mil eleitores ao todo) hoje submetidas às regras do poder paralelo.
"As pessoas se preocupam com Ingrid Bettancourt, o que é muito justo. Mas não se preocupam com os reféns das quadrilhas nos morros do Rio", aponta.
O Rio não é o único lugar onde isso ocorre - "em Alagoas e Pernambuco há situações muito semelhantes" -, com toda certeza é o pior.
Justamente pela evidência de que o crime elege representantes que depois farão parte de coalizões de governos, cujos loteamentos de cargos levam essas pessoas a reivindicar, e ganhar, cargos na cúpula da segurança pública.
O caso do ex-chefe de Polícia Civil Álvaro Lins, preso, indiciado, cassado e com prisão preventiva por corrupção recentemente decretada, é o exemplo típico do que diz Raul Jungmann.
E os candidatos, as autoridades, o que dizem? Depende. Alguns saúdam formalmente as providências de força, certos de sua ineficácia; outros fazem menos barulho, preservam-se politicamente, mas ajudam objetivamente no combate.
Parte dos candidatos clama contra o "absurdo", em geral os com menos chances eleitorais, com menos compromissos a cumprir; parte emudece, muda de assunto como se houvesse algo mais importante que a interdição do direito de ir e vir e a imposição do terror ao cidadão pela ameaça (falsa) de violação do voto.
Estes aderem ao acordo tácito racionalizando o argumento da "lógica" da "política local" , a fim de sobreviver e ainda poder olhar os filhos quando chegam em casa.
Há ainda os que se atiram na alienação sem medo de ser felizes nem de contribuir para a infelicidade alheia com seu jogo de avestruz.
Tomemos o vice-governador, Luiz Fernando Pezão, a primeira autoridade do Poder Executivo estadual a se manifestar. Ao molde dos políticos mais preocupados com o imediatismo das conveniências eleitorais do que com o processo de degenerescência institucional, Luiz Fernando Pezão dispensa ajuda.
Para ele não há nada, só "exploração política" por parte de quem não tem acesso a determinadas áreas onde a população "cansou" de promessas e, por isso, se organiza para eleger gente da "comunidade".
Como não é cego, surdo nem tolo, ou o vice-governador exercita seus dotes de conhecido piadista ou acha menos perigoso dar de ombros à insegurança pública que encarar a bandidagem.
Ou talvez sofra do mal há algum tempo apontado pelo deputado Aldo Rebelo e corroborado por Jungmann para explicar a negligência dos governos Lula e Fernando Henrique no combate ao crime: "A geração que sucedeu a ditadura no poder, oriunda da esquerda, não cuida da segurança porque repudia a repressão."
Ou, dizendo de forma mais rude: acha que ditadura no morro é bangalô.
A simples decisão do Tribunal Superior Eleitoral de autorizar o envio de tropas federais ao Rio, alegadamente para assegurar a segurança na eleição, não é garantia de nada nem vai livrar um universo (mal) calculado entre 500 mil e 1 milhão de eleitores, do tacão das milícias e do narcotráfico.
Aliás, nem o cumprimento da decisão é certo. De posse de informações fornecidas nas últimas semanas por diversas fontes, o TSE pôde ter uma noção aproximada do risco contido na imposição de reservas de mercado de votos pela força e fez um gesto.
Quase fidalgo se comparado à ferocidade do inimigo, mas indicativo de que pelo menos um dos Poderes da República já se deu conta de que algo precisa ser feito para conter o crescimento da bancada do crime no Legislativo - nos âmbitos municipal, estadual e federal - antes que daqui a pouco o Brasil comece a conviver com candidaturas de prefeitos, governadores e, por que não dizer, presidentes da República claramente identificados com a bandidagem.
A Justiça Eleitoral acenou com um "alto lá" ao optar pelo envio das tropas federais com tanta antecedência. Disse ao adversário o seguinte: se a idéia é partir para a ignorância, então que se explicite a fortaleza de quem tem a prerrogativa legal do uso da força, o Estado.
Uma das fontes de informação do ministro Ayres Britto - não a única - foi a Comissão de Segurança Pública da Câmara, cujo presidente, deputado Raul Jungmann, passou o último mês coletando os subsídios repassados ao presidente do TSE.
Segundo ele, cruzando dados dos eleitos no último pleito para deputado estadual com as respectivas votações nas áreas dominadas, não é difícil chegar à conclusão de que hoje de 25% a 30% dos integrantes da Assembléia Legislativa do Rio de Janeiro têm alguma ligação com o tráfico ou com as milícias.
Resultado: "O poder que está saindo das urnas é de alguma forma conivente, convivente ou condicionado pelos meios e modos impostos pelo crime", diz o deputado.
Sem estatísticas precisas - ademais, por inexistentes da área de segurança pública de maneira unificada, centralizada e confiável -, Jungmann adere ao cálculo do eleitorado de 500 mil a 1 milhão de pessoas (no Rio, capital, há cerca de 4 milhões e 500 mil eleitores ao todo) hoje submetidas às regras do poder paralelo.
"As pessoas se preocupam com Ingrid Bettancourt, o que é muito justo. Mas não se preocupam com os reféns das quadrilhas nos morros do Rio", aponta.
O Rio não é o único lugar onde isso ocorre - "em Alagoas e Pernambuco há situações muito semelhantes" -, com toda certeza é o pior.
Justamente pela evidência de que o crime elege representantes que depois farão parte de coalizões de governos, cujos loteamentos de cargos levam essas pessoas a reivindicar, e ganhar, cargos na cúpula da segurança pública.
O caso do ex-chefe de Polícia Civil Álvaro Lins, preso, indiciado, cassado e com prisão preventiva por corrupção recentemente decretada, é o exemplo típico do que diz Raul Jungmann.
E os candidatos, as autoridades, o que dizem? Depende. Alguns saúdam formalmente as providências de força, certos de sua ineficácia; outros fazem menos barulho, preservam-se politicamente, mas ajudam objetivamente no combate.
Parte dos candidatos clama contra o "absurdo", em geral os com menos chances eleitorais, com menos compromissos a cumprir; parte emudece, muda de assunto como se houvesse algo mais importante que a interdição do direito de ir e vir e a imposição do terror ao cidadão pela ameaça (falsa) de violação do voto.
Estes aderem ao acordo tácito racionalizando o argumento da "lógica" da "política local" , a fim de sobreviver e ainda poder olhar os filhos quando chegam em casa.
Há ainda os que se atiram na alienação sem medo de ser felizes nem de contribuir para a infelicidade alheia com seu jogo de avestruz.
Tomemos o vice-governador, Luiz Fernando Pezão, a primeira autoridade do Poder Executivo estadual a se manifestar. Ao molde dos políticos mais preocupados com o imediatismo das conveniências eleitorais do que com o processo de degenerescência institucional, Luiz Fernando Pezão dispensa ajuda.
Para ele não há nada, só "exploração política" por parte de quem não tem acesso a determinadas áreas onde a população "cansou" de promessas e, por isso, se organiza para eleger gente da "comunidade".
Como não é cego, surdo nem tolo, ou o vice-governador exercita seus dotes de conhecido piadista ou acha menos perigoso dar de ombros à insegurança pública que encarar a bandidagem.
Ou talvez sofra do mal há algum tempo apontado pelo deputado Aldo Rebelo e corroborado por Jungmann para explicar a negligência dos governos Lula e Fernando Henrique no combate ao crime: "A geração que sucedeu a ditadura no poder, oriunda da esquerda, não cuida da segurança porque repudia a repressão."
Ou, dizendo de forma mais rude: acha que ditadura no morro é bangalô.
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