Valor Econômico
Quarta colocada nas pesquisas de opinião para a eleição presidencial, a senadora Heloísa Helena (P-SOL-AL) está em uma encruzilhada: se fizer uma campanha evitando radicalismos ideológicos, poderá continuar crescendo e retirando votos tanto de uma candidatura à reeleição do presidente Luiz Inácio Lula da Silva quanto do bloco PSDB/PFL. O seu recém-criado partido, entretanto, mergulharia em uma crise de identidade. Afinal, o P-SOL surgiu exatamente por não aceitar o pragmatismo eleitoral do Partido dos Trabalhadores. Se abraçar a extrema-esquerda, adotando um programa anticapitalista, tende a perder eleitores conservadores que aderiram à sua candidatura para fazer uma espécie de voto de protesto. A tendência da senadora é ficar com a segunda posição.Candidato do partido ao governo do Rio, o ex-deputado Milton Temer reconhece o dilema. "Os votos de Heloísa Helena não são obrigatoriamente de esquerda. Graças a atributos pessoais, como o fato de ser mulher, ter uma imagem de coragem, de honestidade e outros valores não necessariamente vinculados a uma posição ideológica, ela capta eleitores que poderiam ir para um candidato conservador. Vamos ter que conciliar a tática eleitoral com nossa estratégia de dizer que é impossível a felicidade dentro do capitalismo", disse."Não podemos cair no pragmatismo para obter mais votos. Saímos do PT por não aceitar isso. Precisamos juntar as duas coisas", preocupa-se o deputado Ivan Valente (P-SOL-SP). "Não poder falar o que pensa para não perder votos foi o drama do PT, que levou o partido a perder-se. É melhor a campanha nítida do que mentir para o povo. Fazer a opção socialista tem um preço que precisa ser dito a sociedade, e, ao contrário da voz corrente, não acreditamos que haja consenso entre as classes sobre o que deve ser feito", rebate o provável candidato do partido ao governo de São Paulo, o ex-deputado Plínio de Arruda Sampaio.O pragmatismo pode ainda afastar da senadora o PSTU e o PCB, os únicos partidos com quem o P-SOL deve se coligar. Nenhuma das duas micro-legendas elegeu parlamentares em 2002, mas a soma de seus espaços no horário eleitoral gratuito pode fazer com que Heloísa Helena alcance até dois minutos diários na televisão, dependendo da quantidade de candidatos. Os dois partidos nanicos já ajudaram o P-SOL no ano passado a recolher assinaturas que asseguram o registro provisório à sigla."O PSTU participa das eleições para fazer propaganda das mudanças que defende e fortalecer movimentos sociais. Para nós, a votação é um item absolutamente secundário. É possível apoiar Heloísa Helena, desde que com esta perspectiva. Caso contrário, se for para abrir espaço para o marketing, estamos fora", afirmou o ex-sindicalista José Maria de Almeida, candidato do PSTU à Presidência em 2002.Heloísa Helena obtém entre 4% e 9% dos votos nas pesquisas, conforme o quadro de candidatos apresentados. Mas quando se isola os eleitores de maior renda e maior escolaridade, passa os dois dígitos e fica em terceiro lugar, à frente do ex-governador do Rio de Janeiro, Anthony Garotinho (PMDB).Não podemos cair no pragmatismo para obter mais votos. Saímos do PT por não aceitar isso" - Ivan Valente, deputado federal (P-SOL-SP) Na última pesquisa Ibope, chegou a obter 17% das intenções entre os pesquisados com superior completo, na simulação que incluía o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin (PSDB). Na pesquisa do Datafolha, em uma simulação com o prefeito paulistano José Serra (PSDB) e o deputado federal Roberto Freire (PPS), fica com 10% nesta faixa. Em tese, é um indicativo de potencial de crescimento, já que estes eleitores são os que tem maior acesso à informação.As circunstâncias são adversas para uma campanha de esquerda. "As classes D e E estão com o governo federal, não tanto pela Bolsa-Família, mas pelo recuo da inflação, que preserva o valor da cesta básica", comenta Temer. "No começo dos anos 80, o PT cresceu impulsionado pelos movimentos sociais em ascensão. Hoje a sociedade organizada perdeu energia", disse Valente.A dependência do P-SOL da candidatura presidencial é total: o partido só tem três meses de existência legal e precisa da eleição para ganhar visibilidade. A estratégia passa não apenas pela candidatura de Heloísa Helena, mas pelo candidato próprio aos governos estaduais. Devem disputar, além de Temer, o ex-deputado Plínio de Arruda Sampaio em São Paulo e o ex-prefeito de Belém Edmílson Rodrigues no Pará.Ninguém no P-SOL tem ilusão de atingir os 5% nas eleições proporcionais exigidos pela cláusula de barreira para o partido continuar com existência parlamentar e direito ao fundo partidário. Mas todos contam com uma votação acima deste nível para Heloísa Helena e alguns candidatos a governador.Será o suficiente, segundo acreditam, para conseguir a reeleição dos seus sete deputados: Chico Alencar e Babá (PA), pelo Rio de Janeiro; Valente e Orlando Fantazzini, em São Paulo; Luciana Genro, no Rio Grande do Sul; Maninha, no Distrito Federal e João Alfredo, no Ceará. Mesmo sem direito a funcionamento legislativo, os sete poderão funcionar como uma espécie de bancada informal.Os membros do P-SOL acreditam que o ritmo da campanha poderá aproximá-los dos movimentos sociais desiludidos com o governo Lula. A candidatura de Plínio de Arruda Sampaio em São Paulo tem este explícito sentido. "O Plínio acabou de receber uma votação muito expressiva em São Paulo na eleição interna do PT e é um elemento aglutinador, pelo seu histórico de proximidade com a Igreja progressista e o MST", comentou Valente.
César Felício De São Paulo
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