O conhecimento é tão antigo quanto o próprio homem. Como tudo que existe, ele também tem uma história marcada por contradições, avanços, recuos, mobilidade, interação... Inicialmente, acentuadamente rudimentar, era acumulado, sistematizado e transmitido por mímicas, via oral ou pelo testemunho (não existia a linguagem escrita). Por milênios e milênios assim se processava a educação repassada de geração a geração, conforme o gênero e à faixa etária. A escola, enquanto instituição formal, só veio existir com todo o seu aparato material e imaterial, após o advento da propriedade privada, em função da necessidade histórica de se resolver os novos problemas que a sociedade de classes e de camadas sociais, bem mais complexa, exigia.
Temos repetido com tenaz insistência que a escola, enquanto instituição, prestou-se e ainda se presta a duas finalidades bem distintas: primeiro, preparar pessoas habilitadas para cumprir os diversos ofícios que a nova sociedade de classes passou sofregamente a exigir; a segunda finalidade consiste em consolidar a ideologia que dá sustentação intelectual ao sistema de classes e camadas sociais, difundindo mentiras, fraudes, charlatanismos, engodos, superstições...
Desde o surgimento das sociedades divididas em classes e camadas sociais, existe por parte da maioria dos explorados e espoliados, um incontido desejo de igualdade, justiça e paz. Esse desejo tem sido transferido, regra geral, para um plano transcendental, como temos dito em outras tantas ocasiões com a insistência que se faz necessária.
Não é somente, porém, no campo transcendental que tem se manifestado o desejo de igualdade social. Incontáveis e sucessivos foram os episódios históricos em que se expressaram de forma contundente esse desejo, esse intento. Além dessas manifestações, de caráter prático igualitaristas, tentando fazer voltar à roda da história ao comunismo primitivo. Algumas brilhantes figuras conceberam intelectualmente uma sociedade despida da desigualdade e da injustiça social destacando-se dentre elas a figura de Thomas Morus com o seu consagrado livro “Utopia”.
Ocorreu que as sociedades dividas em classes e em camadas sociais, como é exemplo o escravismo, longe, bastante longe, estavam de se esgotar e assim, permitir o advento de uma nova ordem econômica e social que pudesse ser considerada menos injusta.
Somente com o advento do capitalismo, pós feudalismo, para respeitar obsequiosamente o esquema imposto pela “saudosa” Acadêmia de Ciência da URSS, é que surgem as condições materiais necessárias à construção de uma sociedade de iguais, isso porque o capitalismo permitiu um agigantado desenvolvimento das forças produtivas e o aguçamento delas com as relações de produção. Dito de outra forma, o capitalismo produziu as condições materiais para que o socialismo deixasse de ser um desejo, um querer, uma vontade, um sonho, uma “utopia” para se tornar uma necessidade histórica.
Junto ao surgimento do capitalismo brotaram os movimentos claramente socialistas. Dentre eles cabe destaque a Conspiração de Babeuf, em 1796, portanto sete anos apenas após a radical revolução burguesa na França. A Conspiração de Graco Babeuf ou Conspiração dos Iguais, tornou evidente que estava chegando a hora da revolução socialista, como bem retratam alguns episódios seguintes como foi levante o operário de 1848, na França, para culminar com um grande evento revolucionário - a Comuna de Paris, em 1871 momento em que as classes trabalhadoras desmantelaram o Estado burguês e estabeleceram o poder operário naquela cidade durante 72 gloriosos dias.
Talvez seja oportuno perguntar: por que fracassou a Comuna de Paris? Por que foi derrotada a primeira insurreição operária parcialmente vitoriosa? Ora, esse episódio histórico, por sua relevância, foi estudado e visto com todo rigor pelos socialistas de então. Dentre os motivos do fracasso ressaltou-se a ingenuidade da classe operária, manifestada em muitos episódios que revelava suas vacilações e preconceitos. Por exemplo: os “communards” negaram-se a lançar mão do dinheiro do Tesouro Nacional para pagar seus débitos sob o argumento de que eles eram moralmente “diferentes” e que respeitariam “o dinheiro do povo”. Outro ato de ingenuidade política foi o fato deles se negarem a executar os espiões infiltrados no seu meio prestando serviço à burguesia, pois não haveriam os insurretos de sujar suas mãos com o sangue do inimigo.
Acrescente-se à lista infinda de ingenuidades aquela em que o exército proletário parisiense negou-se a marchar sobre a vizinha cidade de Versalhes para esmagar a contra-revolução que ali se reorganizava com o objetivo de perpetrar um ataque mortal aos insurretos, como veio acontecer, ocasião em que milhares de revolucionários foram sumariamente executados, enquanto outros tantos conseguiram se evadir em busca do penoso exílio.
Mas a grande lição, ou seja, a maior de todas as lições que a Comuna de Paris nos legou, foi extraída pelo pensador alemão Karl Marx, quando disse que o operariado de Paris quis tomar os céus de assalto. Essa afirmação implicava em dizer que não haviam as condições objetivas e materiais necessárias para a construção de uma nova ordem econômica e social. Em outras palavras, diríamos que as potencialidades de progresso do capitalismo ainda não haviam se exaurido e muitas eram as tarefas próprias da burguesia a serem executadas em escala mundial.
Observe-se que enquanto os socialistas de então se debruçavam diante dos mais relevantes episódios históricos para deles tirar os ensinamentos necessários, os nossos marxistas-leninistas-trostikystas não se detiveram, nem se detêm, em analisar com a devida responsabilidade e profundidade os episódios históricos mais significativos, como a República de Weimar, a revolução Russa de 1917, a guerra civil na Espanha, a frente popular do senhor Leon Blum na França, a ascensão do nazi-fascismo na Europa ocidental, a revolução chinesa, a revolução cubana de 1959, o golpe de estado na Indonésia em 1965, o golpe no Brasil em 1964, assim como o golpe de estado no Chile que representou mais uma “aventura” do caminho pacifico para o socialismo.
Voltemos a tratar das comoções políticas do século XIX. Em paralelo a essas comoções, desenvolvia-se um maremoto de polêmicas em busca da elucidação da questão política que a ordem capitalista pôs diante dos nossos olhos. Num primeiro momento surgiu uma plêiade de intelectuais preocupados com a questão social. Foram eles os alquimistas da política chamados de socialistas utópicos. A esses louváveis senhores não faltaram brilho, talento ou genialidade. O que lhes faltara naquele contexto histórico foi o desenvolvimento maior do conhecimento como instrumento imprescindível a fim de que se pudesse construir uma ciência capaz de desfazer “mistérios” e enunciar princípios.
Na Alemanha, saltitava freneticamente de forma abrasadora, a polêmica em torno da filosofia. O grande Georg Wilhelm Friedrich Hegel deixou uma legião de discípulos que se ocuparam em se digladiar em extenuantes debates. Eram eles “os jovens hegelianos”. Dentre essas figuras, destacou-se Ludwig Feuerbach que promoveu um processo de ruptura com o velho hegelianismo, tornando-se célebre a sua afirmação de que não fôra Deus que fizera o homem e sim o homem que fizera Deus. No rastro de tão ousado pensamento desabrocharam dois grandes pensadores alemães: Friedrich Engels e Karl Marx, proclamando que à filosofia hegeliana estava de cabeça para baixo, pois a sua revolucionária dialética apoiava-se num descabido idealismo.
Esclarecendo melhor: o enciclopédico Hegel deixou em evidência que toda a existência manifestava-se pelo permanente movimento e ela, a existência, tinha como princípio um “ser absoluto” e a evolução progressista da realidade nos faria reconquistar esse ser absoluto. Diante dessa formulação, Marx e Engels encaparam a dialética hegeliana pela sua insofismável fundamentação repudiando o idealismo filosófico do velho Hegel.
Enquanto a polêmica filosófica se exarcebava na Alemanha, o movimento operário francês levava à discussão política a culminância e, na condição de exilados políticos, Marx e Engels inseriram-se nesses debates. Na ruptura com o hegelianismo, eles formularam o materialismo dialético como instrumental imprescindível para elucidação dos fatos, fossem eles históricos, políticos, sociais ou econômicos.
No primeiro momento surgiu, “como vimos”, o materialismo dialético não como elemento diletante, mas, sobretudo como instrumento capaz de nos munir de uma ferramenta para a necessária obra de transformação do mundo. Ficou universalmente famosa a afirmação de Karl Marx de que aos filósofos, até então, coubera a tarefa de interpretar o mundo e agora era chegada a hora de transformá-lo.
A história, enquanto instrumento de conhecimento, no período anterior a Karl Marx, era vista como uma sucessão de episódios circunstanciais onde estavam presentes a vontade, o querer, o não querer, o impor, o sabotar, o trair... A partir dessa ótica, a história era feita por heróis, mártires, santos, traidores, bandidos, delatores...
Essa forma de ver a história é chamada de idealista. Marx e Engels arrancaram a política do seu contexto idealista para lhes dar uma fundamentação cientifica quando disseram: “é verdade que o homem faz a história, porém não a faz de acordo com sua vontade, com o seu querer, ou não querer”.
No primeiro caso surgiu o materialismo dialético em contraposição ao materialismo idealista de Hegel. No segundo momento construiu-se o materialismo histórico em contraposição à distorcida visão idealista da história tão presente ontem e hoje, inclusive, nas hostes ditas marxistas-leninistas-trotskistas, o que é uma lástima.
Edificados os dois pilares do socialismo científico, o materialismo dialético e o materialismo histórico, buscou-se a construção do terceiro pilar que haveria de se constituir no tripé em que se assentaria essa nova ciência.
Foi com esse propósito que Karl Marx debruçou-se no estudo da economia política que tão bem vicejava na Inglaterra, destacando-se as figuras geniais de Adam Smith e David Ricardo. Aí, o “nó górdio” era a teoria do valor. Donde viria o valor atribuído às mercadorias? Dissecando a história da economia desde os primórdios, Karl Marx descobriu que o capitalismo trouxe consigo um novo tipo de mercadoria: a força de trabalho que tinha a qualidade singular de se multiplicar. Ou seja, tratava-se de uma mercadoria que produzia um valor maior do que lhe era atribuído, produzia a “mais valia”, trabalho não remunerado. Estavam dessa forma colocada as bases do socialismo como ciência. Nascia o socialismo científico, não apenas das cabeças iluminadas, mas de todo o processo de interação entre as novas condições objetivas e subjetivas (conhecimento).
A nosso ver não passa de um descaramento, de uma fraude, por parte da burguesia, tentar nos impingir uma ciência política. Ora, o objeto da ciência política é elucidar o grande enigma social, cuja premissa fundamental é a de que a história é a história da luta de classes. Uma ciência política produzida pela burguesia implicaria em pretender que essa classe aderiu ao marxismo, o que não passaria de uma bela piada.
Aliás, a fraude, o cinismo e o embuste são partes constituintes do discurso capitalista e para lhes dar sustentação, prestígio e mesmo ares de verdade, lançam mão dos mesmos “sábios” que outrora se prestaram por régios salários e fartos prestígios a condenar Galileu Galilei, Charles Darwin e outros luminares do pensamento humano.
Como dissemos, por milhares e milhares de anos, a sociedade não conheceu a escola como instituição dela separada. Uma instituição rigorosamente controlada e pronta a servir um novo momento histórico que era a divisão da sociedade em classes e em camadas sociais.
A história do conhecimento, é marcada por severos e dramáticos conflitos. A escola academia, como instituição a serviço de uma classe, impunha e impõe rigorosos limites aos debates, chegando ao ponto de promover um verdadeiro trabalho de esterilização de conteúdos “apagando o lume revolucionário” conflitante com a ordem estabelecida.
Na verdade a evolução do conhecimento algumas vezes trombou com a verdade oficial, a verdade acadêmica. Temos exemplos que merecem ser exaltados. Lembremos de Galileu Galilei que, contrariando a verdade acadêmica, teve a ousadia em afirmar que a terra não era fixa e que ela se movia. Denunciado como herege teve que ser submetido a julgamento por uma banca formada por “mestres, doutores e pós-doutores” e diante deles foi obrigado a renegar suas convicções cientificas para escapar da ardente fogueira da “fé”.
Charles Darwin desmascarou por completo a teoria criacionista defendida pelos “valiosos” acadêmicos da época e isso era uma monumental “heresia”. Ao invés do criacionismo Charles Darwin concluiu que a vida decorreu de um processo natural sem nenhuma interferência transcendental. Mais uma vez um verdadeiro sábio foi execrado pelas academias, expurgada dos meios intelectuais, excomungado pelas igrejas por professar uma verdade.
Dramática também é a história da medicina. Os “doutos” cardeais de diversos credos condenavam a prática da exumação e dissecação de cadáveres para fins de estudos. Dessa forma, valentes “profanadores”, sob as trevas das noites “roubavam” cadáveres com o risco da própria vida, para dissecá-los e descobrir, assim, os segredos do corpo humano.
Acontece uma particularidade que merece ser ressaltada. Ciências como a química, a medicina, a física, a astronomia... foram perseguidas, mas com o passar do tempo essas mesmas academias, quando conveniente ao sistema chamaram-nas para ocupar seus assentos nas cátedras que lhes foram reservadas.
É quase dispensável dizer que uma sociedade onde impera a mais cruel desigualdade social, onde se prática os mais cruéis delitos e onde se massacra a decência, só poderia existir e manter-se caso fosse construído um verdadeiro império da mentira. Isso mesmo! A desigualdade social não poderia ter existido se não fosse o rosário de mentiras, fraudes e engodos tão zelosamente construídos pela minoria de privilegiados. Conclui-se, portanto, que esse império foi e é necessária a existência da desigualdade social e que a verdade, sobretudo a verdade histórica é revolucionária, pois desvela realidade expondo a crueza das mentiras que encobrem esse mundo de injustiça social.
Para que tal obra fosse erigida necessitaria de ter-se em mãos instrumentos eficazes para tão dantesca obra. Dentre esses instrumentos destacaram-se e destacam-se as igrejas, as escolas, as tradições orais e escritas, mesmo que, aqui e ali, registrem-se algumas rusgas, alguns entreveros. Antes, porém, ter-se-ia que atribuir a essas instituições valores indiscutíveis. A igreja teria sido inspirada por espíritos superiores e infalíveis; a escola seria a expressão maior do conhecimento e não merecia ser contestada; as tradições testemunhos indiscutíveis de “verdades” milenares, e assim se edificam os mitos e crendices.
Falamos que mais das vezes as ciências subversivas terminaram por serem cooptadas e tomaram seus assentos nas academias. Com o socialismo, essa ciência, que trata de uma questão vital para o sistema, tal cooptação não poderia jamais acontecer. É bem verdade que no principio do século XX, alguns intelectuais tentaram introduzir um chamado “marxismo legal”. O que seria isso? Seria o estudo dos enigmas sociais e políticos a partir das cátedras amparados por boas remunerações e destacados por incontestes prestígios. Essa corrente, quando não ingênua era nitidamente oportunista, foi refutada veementemente pelos verdadeiros revolucionários que não aceitavam tão indecorosa impropriedade. É oportuno acentuar que se repudiava o “marxismo legal” não por uma questão estritamente moral e, sim, por uma total impossibilidade.
A história do socialismo abriga duas grandes correntes. A primeira delas é a corrente revolucionária, aquela que diz textualmente ser impossível “fazer a omelete sem quebrar os ovos”. Isso não é uma escolha, é um imperativo histórico. Afinal, para a sustentação do capitalismo, existe o Estado que congrega diversos aparatos com o objetivo de manter a qualquer custo o sistema sócio econômico vigente. Dentre esses aparatos do Estado estão desde as festejadas escolas (força civil), até as forças policiais e militares. Sendo assim, a violência que impõe a desigualdade e a injustiça, só pode ser banida com a violência libertadora das massas trabalhadoras.
O socialismo evolucionário, gradualista é completamente impraticável, pelas razões que acreditamos terem sido sobejamente colocadas no parágrafo anterior. Ocorre, no entanto, que essa corrente vem tomando substância na medida em que houve a fragorosa derrota do socialismo em escala mundial, derrota que não se pode dizer definitiva, pois assim, teríamos a própria derrota do gênero humano.
A derrota do socialismo em escala mundial promoveu um vazio teórico, promoveu a degradação da esquerda, prostituindo-a em troco de algumas benesses do aparelho de Estado. Para tanto tem contribuído a academia quando se apresenta como a quintaessência do saber. Indiscutivelmente as universidades fabricam, às carradas, técnicos e cientistas prontos para vender a sua mão de obra qualificada no auspicioso mercado de trabalho da ordem econômica e social vigente, seja para fazer bombas, armas sofisticadas ou vacinas para gripe, que cure o povo enquanto proporciona bilionários lucros aos laboratórios. No capitalismo, não existe como objetivo o bem estar e a segurança social. O seu primado é o lucro e tão somente o lucro.
A burguesia tem feito uso político desbragado da universidade como se ela fosse a tábua de salvação da hgumanidade. É necessário denunciar tão despudorada manobra política. Ao invés disso, diante dela, um grande quinhão das esquerdas agacham-se e prostram-se. Isso em escala mundial, o que beira a tragédia. No caminhar da humanidade, é notório que o conhecimento tenha sofrido serradas perseguições, mas tem sido o socialismo científico a maior vitima do sistema e é evidente que desse sistema e de seus asseclas não esperássemos outra atitude.
Conseguiu a burguesia dobrar a esquerda na Europa Ocidental no inicio do século XX, transformando revolucionários em invertebrados. De lá para cá, tudo se tornou-se mais grave. A maioria dos intelectuais progressistas passaram-se de malas e bagagens para o lado da burocracia stalinista. Uns poucos e mais escrupulosos, porém, sem a devida coragem, ampararam-se nas intermináveis discussões intelectuais sobre estética, como foi o caso de George Lukács; no academicismo estéril de Herbert Marcuse, da bela escola de Frankfurt; na confusão mental de Roger Garaudy; no existencialismo inócuo, de Jean Paul Sartre, cuja obra maior foi o pífio elogio feito à Revolução Cubana, no seu livro “Um Furacão Sobre Cuba”, que não ousa penetrar nas entranhas da revolução para assim cientificamente explicar aquele fato histórico que surpreendeu a todos, inclusive aos seus líderes.
Por razões bastantes explicáveis, o senhor Leon Trotsky e alguns mais, tentaram bravamente emergir do lamaçal das intrigas pessoais e mergulhar num honroso embate contra as “forças do mal”. Registre-se, a bem da verdade, que Leon Trotsky não pôde fugir das contingências históricas e terminou deslizando para o idealismo, imputando à tragédia da Revolução Russa a figura sinistra de Josef Stalin e isso não passa de um disparate.
Leon Trotsky chegou ao cúmulo do desvio quando, num infeliz comentário afirmou: “nunca pensei que uma simples caçada de patos pudesse determinar os rumos da história”. Trotsky reportava-se ao fato de que ele houvera entrado em férias e nessa ocasião dera-se a morte prematura de Vladimir Lênin e ele, Trotsky, não pudera participar ostensivamente do seu féretro, apresentando se como seu herdeiro. Além desse deslize, Trotsky passou a ter um juízo moral da história, ora chamando a revolução de desfigurada, ora de revolução traída, o que demonstra o fato de seu envolvimento emocional ter lhe turvado a vista. Caso contrário, teria feito como Iuli Martov e Alexandra Kollontai quando proclamaram que a sepultura da revolução socialista dera-se em 1921, por ocasião do X Congresso do Partido Comunista Russo, quando foi suprimido o direito de tendência, imposto o monolitismo, os campos de concentração e a calúnia como instrumento de prática política.
Essa visão, contudo, ainda seria totalmente insuficiente, ou melhor, incorreta. As raízes da derrota do socialismo estão presentes na Europa Ocidental com a capitulação dos Partidos Operários quando resolveram aceitar a liderança da burguesia e dar as costas à causa socialista como tão bem denunciou Rosa Luxemburgo.
No nosso caso, no Brasil de hoje, as massas trabalhadoras como fizera no tempo de Getúlio, escolheram do populismo trabalhista levado a cabo por Luiz Inácio da Silva (Lula), em troca de míseras migalhas, sobretudo aquelas destinadas à massa de excluídos sob o rotulo de “bolsa família”. Assim como os Partidos Operários levaram o capitalismo à vitória na Europa Ocidental e, por conseguinte, no mundo, não temos dúvida de que o PT esteve e estará disposto a jogar o papel de baluarte de sustentação desse sistema.
Reportando-se aos fatos da Revolução Russa, destaquemos que, em 1921, deu-se a estruturação da NEP (Nova Política Econômica) e a repressão desbragada da Oposição Operária, particularmente do sovietes de Kronstadt isso sim são elementos constitutivos do stalinismo e não como querem Trotsky e os Trotskistas, ou mesmo certos intelectuais festejados como Pierre Anderson e tantos outros péssimos profetas, sobretudo dos fatos passados. Não foi a morte de Lênin, portanto que marcou o nascimento do stalinismo, como pretende os desavisados. O stalinismo repita-se, foi produto da derrota da revolução socialista em escala mundial.
Lembremos que Trotsky produziu uma legião de seguidores que repetem no essencial a prática stalinista, da calunia, da mentira, do culto à personalidade e outros vícios. Mais grave, porém, é que o senhor Trotsky permitiu que existisse um número enorme de pessoas reproduzindo o equivocado discurso de que se houvesse Trotsky batido Stalin teria sido outro o rumo da história. A história, como já dissemos, não é produto da vontade, do querer, da tenacidade de alguns, apesar de serem atributos que, em determinados momentos, podem produzir graves conseqüências.
Não foi Josef Stalin, aquele psicopata obtuso, que levou a revolução ao fracasso. Foi à revolução mundial que foi derrotada a partir da Europa Ocidental e mais particularmente durante o governo na República de Weimar. Isso deve ser visto com acuidade e repetido exaustivamente.
Entender os destinos da humanidade e a história das revoluções recentes a partir do duelo Trotsky e Stálin, desconhecendo, em toda profundidade necessária, as práticas e concepções dos partidos operários da Europa Ocidental, principalmente os dramáticos episódios ocorridos na República de Weimar, com as seus Lulas, Zé Dirceu, Genuíno, Delubio Soares, João Paulo e outros trânsfugas, é transformar a verdade em farsa ou, para sermos generosos, em meros beatos possuídos de todas as ingenuidades possíveis, como viera acontecer com minha querida vó que morreu acreditando ser possível curar câncer com “água benta”.
Hoje, a grande crise do socialismo reside no fato de que fomos todos encerrados por dois fortes círculos de aço. No primeiro círculo estava a burguesia nas suas diversas faces, impedindo de forma obstinada, como é do seu dever, que a revolução socialista prosperasse. No segundo circulo, tivemos uma esquerda marcadamente stalinista em suas diversas faces funcionando como linha auxiliar de sustentação do sistema capitalista. Hoje, desenha-se no pantanal da ignorância cultivada e custeada pela burguesia através de suas academias, um terceiro círculo protagonizado por essa legião de acadêmicos cujo oficio maior é distorcer a história e semear ilusões.
Por fim, toda questão se reduz ao seguinte fato: teremos tempo histórico para romper esses círculos de ferro e aço que protegem o capitalismo ou eles de vitória em vitória, nos levarão ao fim da humanidade como tão bem prognosticaram Engels e posteriormente Rosa Luxemburgo?
Se coragem nos sobrou para enfrentam às câmaras de torturas, as execuções sumárias, os dolorosos exílios, redobrada coragem precisamos ter para desmontar esse imenso “Império da Mentira”.
Quem de nós está disposto a denunciar tantas fraudes? Quem estará disposto a acusar que o papa não é um mero santo? Quem ousaria imaginar que um general não seja por si um herói? Quem teria a audácia de dizer que muitos dos acadêmicos não passam de reles charlatãs? Quem, finalmente estaria disposto a dizer que a velha esquerda marxista-leninista-trostkista foi e é o maior pilar de sustentação da ordem econômica e social vigente em pleno processo de exaustão?
Temos repetido com tenaz insistência que a escola, enquanto instituição, prestou-se e ainda se presta a duas finalidades bem distintas: primeiro, preparar pessoas habilitadas para cumprir os diversos ofícios que a nova sociedade de classes passou sofregamente a exigir; a segunda finalidade consiste em consolidar a ideologia que dá sustentação intelectual ao sistema de classes e camadas sociais, difundindo mentiras, fraudes, charlatanismos, engodos, superstições...
Desde o surgimento das sociedades divididas em classes e camadas sociais, existe por parte da maioria dos explorados e espoliados, um incontido desejo de igualdade, justiça e paz. Esse desejo tem sido transferido, regra geral, para um plano transcendental, como temos dito em outras tantas ocasiões com a insistência que se faz necessária.
Não é somente, porém, no campo transcendental que tem se manifestado o desejo de igualdade social. Incontáveis e sucessivos foram os episódios históricos em que se expressaram de forma contundente esse desejo, esse intento. Além dessas manifestações, de caráter prático igualitaristas, tentando fazer voltar à roda da história ao comunismo primitivo. Algumas brilhantes figuras conceberam intelectualmente uma sociedade despida da desigualdade e da injustiça social destacando-se dentre elas a figura de Thomas Morus com o seu consagrado livro “Utopia”.
Ocorreu que as sociedades dividas em classes e em camadas sociais, como é exemplo o escravismo, longe, bastante longe, estavam de se esgotar e assim, permitir o advento de uma nova ordem econômica e social que pudesse ser considerada menos injusta.
Somente com o advento do capitalismo, pós feudalismo, para respeitar obsequiosamente o esquema imposto pela “saudosa” Acadêmia de Ciência da URSS, é que surgem as condições materiais necessárias à construção de uma sociedade de iguais, isso porque o capitalismo permitiu um agigantado desenvolvimento das forças produtivas e o aguçamento delas com as relações de produção. Dito de outra forma, o capitalismo produziu as condições materiais para que o socialismo deixasse de ser um desejo, um querer, uma vontade, um sonho, uma “utopia” para se tornar uma necessidade histórica.
Junto ao surgimento do capitalismo brotaram os movimentos claramente socialistas. Dentre eles cabe destaque a Conspiração de Babeuf, em 1796, portanto sete anos apenas após a radical revolução burguesa na França. A Conspiração de Graco Babeuf ou Conspiração dos Iguais, tornou evidente que estava chegando a hora da revolução socialista, como bem retratam alguns episódios seguintes como foi levante o operário de 1848, na França, para culminar com um grande evento revolucionário - a Comuna de Paris, em 1871 momento em que as classes trabalhadoras desmantelaram o Estado burguês e estabeleceram o poder operário naquela cidade durante 72 gloriosos dias.
Talvez seja oportuno perguntar: por que fracassou a Comuna de Paris? Por que foi derrotada a primeira insurreição operária parcialmente vitoriosa? Ora, esse episódio histórico, por sua relevância, foi estudado e visto com todo rigor pelos socialistas de então. Dentre os motivos do fracasso ressaltou-se a ingenuidade da classe operária, manifestada em muitos episódios que revelava suas vacilações e preconceitos. Por exemplo: os “communards” negaram-se a lançar mão do dinheiro do Tesouro Nacional para pagar seus débitos sob o argumento de que eles eram moralmente “diferentes” e que respeitariam “o dinheiro do povo”. Outro ato de ingenuidade política foi o fato deles se negarem a executar os espiões infiltrados no seu meio prestando serviço à burguesia, pois não haveriam os insurretos de sujar suas mãos com o sangue do inimigo.
Acrescente-se à lista infinda de ingenuidades aquela em que o exército proletário parisiense negou-se a marchar sobre a vizinha cidade de Versalhes para esmagar a contra-revolução que ali se reorganizava com o objetivo de perpetrar um ataque mortal aos insurretos, como veio acontecer, ocasião em que milhares de revolucionários foram sumariamente executados, enquanto outros tantos conseguiram se evadir em busca do penoso exílio.
Mas a grande lição, ou seja, a maior de todas as lições que a Comuna de Paris nos legou, foi extraída pelo pensador alemão Karl Marx, quando disse que o operariado de Paris quis tomar os céus de assalto. Essa afirmação implicava em dizer que não haviam as condições objetivas e materiais necessárias para a construção de uma nova ordem econômica e social. Em outras palavras, diríamos que as potencialidades de progresso do capitalismo ainda não haviam se exaurido e muitas eram as tarefas próprias da burguesia a serem executadas em escala mundial.
Observe-se que enquanto os socialistas de então se debruçavam diante dos mais relevantes episódios históricos para deles tirar os ensinamentos necessários, os nossos marxistas-leninistas-trostikystas não se detiveram, nem se detêm, em analisar com a devida responsabilidade e profundidade os episódios históricos mais significativos, como a República de Weimar, a revolução Russa de 1917, a guerra civil na Espanha, a frente popular do senhor Leon Blum na França, a ascensão do nazi-fascismo na Europa ocidental, a revolução chinesa, a revolução cubana de 1959, o golpe de estado na Indonésia em 1965, o golpe no Brasil em 1964, assim como o golpe de estado no Chile que representou mais uma “aventura” do caminho pacifico para o socialismo.
Voltemos a tratar das comoções políticas do século XIX. Em paralelo a essas comoções, desenvolvia-se um maremoto de polêmicas em busca da elucidação da questão política que a ordem capitalista pôs diante dos nossos olhos. Num primeiro momento surgiu uma plêiade de intelectuais preocupados com a questão social. Foram eles os alquimistas da política chamados de socialistas utópicos. A esses louváveis senhores não faltaram brilho, talento ou genialidade. O que lhes faltara naquele contexto histórico foi o desenvolvimento maior do conhecimento como instrumento imprescindível a fim de que se pudesse construir uma ciência capaz de desfazer “mistérios” e enunciar princípios.
Na Alemanha, saltitava freneticamente de forma abrasadora, a polêmica em torno da filosofia. O grande Georg Wilhelm Friedrich Hegel deixou uma legião de discípulos que se ocuparam em se digladiar em extenuantes debates. Eram eles “os jovens hegelianos”. Dentre essas figuras, destacou-se Ludwig Feuerbach que promoveu um processo de ruptura com o velho hegelianismo, tornando-se célebre a sua afirmação de que não fôra Deus que fizera o homem e sim o homem que fizera Deus. No rastro de tão ousado pensamento desabrocharam dois grandes pensadores alemães: Friedrich Engels e Karl Marx, proclamando que à filosofia hegeliana estava de cabeça para baixo, pois a sua revolucionária dialética apoiava-se num descabido idealismo.
Esclarecendo melhor: o enciclopédico Hegel deixou em evidência que toda a existência manifestava-se pelo permanente movimento e ela, a existência, tinha como princípio um “ser absoluto” e a evolução progressista da realidade nos faria reconquistar esse ser absoluto. Diante dessa formulação, Marx e Engels encaparam a dialética hegeliana pela sua insofismável fundamentação repudiando o idealismo filosófico do velho Hegel.
Enquanto a polêmica filosófica se exarcebava na Alemanha, o movimento operário francês levava à discussão política a culminância e, na condição de exilados políticos, Marx e Engels inseriram-se nesses debates. Na ruptura com o hegelianismo, eles formularam o materialismo dialético como instrumental imprescindível para elucidação dos fatos, fossem eles históricos, políticos, sociais ou econômicos.
No primeiro momento surgiu, “como vimos”, o materialismo dialético não como elemento diletante, mas, sobretudo como instrumento capaz de nos munir de uma ferramenta para a necessária obra de transformação do mundo. Ficou universalmente famosa a afirmação de Karl Marx de que aos filósofos, até então, coubera a tarefa de interpretar o mundo e agora era chegada a hora de transformá-lo.
A história, enquanto instrumento de conhecimento, no período anterior a Karl Marx, era vista como uma sucessão de episódios circunstanciais onde estavam presentes a vontade, o querer, o não querer, o impor, o sabotar, o trair... A partir dessa ótica, a história era feita por heróis, mártires, santos, traidores, bandidos, delatores...
Essa forma de ver a história é chamada de idealista. Marx e Engels arrancaram a política do seu contexto idealista para lhes dar uma fundamentação cientifica quando disseram: “é verdade que o homem faz a história, porém não a faz de acordo com sua vontade, com o seu querer, ou não querer”.
No primeiro caso surgiu o materialismo dialético em contraposição ao materialismo idealista de Hegel. No segundo momento construiu-se o materialismo histórico em contraposição à distorcida visão idealista da história tão presente ontem e hoje, inclusive, nas hostes ditas marxistas-leninistas-trotskistas, o que é uma lástima.
Edificados os dois pilares do socialismo científico, o materialismo dialético e o materialismo histórico, buscou-se a construção do terceiro pilar que haveria de se constituir no tripé em que se assentaria essa nova ciência.
Foi com esse propósito que Karl Marx debruçou-se no estudo da economia política que tão bem vicejava na Inglaterra, destacando-se as figuras geniais de Adam Smith e David Ricardo. Aí, o “nó górdio” era a teoria do valor. Donde viria o valor atribuído às mercadorias? Dissecando a história da economia desde os primórdios, Karl Marx descobriu que o capitalismo trouxe consigo um novo tipo de mercadoria: a força de trabalho que tinha a qualidade singular de se multiplicar. Ou seja, tratava-se de uma mercadoria que produzia um valor maior do que lhe era atribuído, produzia a “mais valia”, trabalho não remunerado. Estavam dessa forma colocada as bases do socialismo como ciência. Nascia o socialismo científico, não apenas das cabeças iluminadas, mas de todo o processo de interação entre as novas condições objetivas e subjetivas (conhecimento).
A nosso ver não passa de um descaramento, de uma fraude, por parte da burguesia, tentar nos impingir uma ciência política. Ora, o objeto da ciência política é elucidar o grande enigma social, cuja premissa fundamental é a de que a história é a história da luta de classes. Uma ciência política produzida pela burguesia implicaria em pretender que essa classe aderiu ao marxismo, o que não passaria de uma bela piada.
Aliás, a fraude, o cinismo e o embuste são partes constituintes do discurso capitalista e para lhes dar sustentação, prestígio e mesmo ares de verdade, lançam mão dos mesmos “sábios” que outrora se prestaram por régios salários e fartos prestígios a condenar Galileu Galilei, Charles Darwin e outros luminares do pensamento humano.
Como dissemos, por milhares e milhares de anos, a sociedade não conheceu a escola como instituição dela separada. Uma instituição rigorosamente controlada e pronta a servir um novo momento histórico que era a divisão da sociedade em classes e em camadas sociais.
A história do conhecimento, é marcada por severos e dramáticos conflitos. A escola academia, como instituição a serviço de uma classe, impunha e impõe rigorosos limites aos debates, chegando ao ponto de promover um verdadeiro trabalho de esterilização de conteúdos “apagando o lume revolucionário” conflitante com a ordem estabelecida.
Na verdade a evolução do conhecimento algumas vezes trombou com a verdade oficial, a verdade acadêmica. Temos exemplos que merecem ser exaltados. Lembremos de Galileu Galilei que, contrariando a verdade acadêmica, teve a ousadia em afirmar que a terra não era fixa e que ela se movia. Denunciado como herege teve que ser submetido a julgamento por uma banca formada por “mestres, doutores e pós-doutores” e diante deles foi obrigado a renegar suas convicções cientificas para escapar da ardente fogueira da “fé”.
Charles Darwin desmascarou por completo a teoria criacionista defendida pelos “valiosos” acadêmicos da época e isso era uma monumental “heresia”. Ao invés do criacionismo Charles Darwin concluiu que a vida decorreu de um processo natural sem nenhuma interferência transcendental. Mais uma vez um verdadeiro sábio foi execrado pelas academias, expurgada dos meios intelectuais, excomungado pelas igrejas por professar uma verdade.
Dramática também é a história da medicina. Os “doutos” cardeais de diversos credos condenavam a prática da exumação e dissecação de cadáveres para fins de estudos. Dessa forma, valentes “profanadores”, sob as trevas das noites “roubavam” cadáveres com o risco da própria vida, para dissecá-los e descobrir, assim, os segredos do corpo humano.
Acontece uma particularidade que merece ser ressaltada. Ciências como a química, a medicina, a física, a astronomia... foram perseguidas, mas com o passar do tempo essas mesmas academias, quando conveniente ao sistema chamaram-nas para ocupar seus assentos nas cátedras que lhes foram reservadas.
É quase dispensável dizer que uma sociedade onde impera a mais cruel desigualdade social, onde se prática os mais cruéis delitos e onde se massacra a decência, só poderia existir e manter-se caso fosse construído um verdadeiro império da mentira. Isso mesmo! A desigualdade social não poderia ter existido se não fosse o rosário de mentiras, fraudes e engodos tão zelosamente construídos pela minoria de privilegiados. Conclui-se, portanto, que esse império foi e é necessária a existência da desigualdade social e que a verdade, sobretudo a verdade histórica é revolucionária, pois desvela realidade expondo a crueza das mentiras que encobrem esse mundo de injustiça social.
Para que tal obra fosse erigida necessitaria de ter-se em mãos instrumentos eficazes para tão dantesca obra. Dentre esses instrumentos destacaram-se e destacam-se as igrejas, as escolas, as tradições orais e escritas, mesmo que, aqui e ali, registrem-se algumas rusgas, alguns entreveros. Antes, porém, ter-se-ia que atribuir a essas instituições valores indiscutíveis. A igreja teria sido inspirada por espíritos superiores e infalíveis; a escola seria a expressão maior do conhecimento e não merecia ser contestada; as tradições testemunhos indiscutíveis de “verdades” milenares, e assim se edificam os mitos e crendices.
Falamos que mais das vezes as ciências subversivas terminaram por serem cooptadas e tomaram seus assentos nas academias. Com o socialismo, essa ciência, que trata de uma questão vital para o sistema, tal cooptação não poderia jamais acontecer. É bem verdade que no principio do século XX, alguns intelectuais tentaram introduzir um chamado “marxismo legal”. O que seria isso? Seria o estudo dos enigmas sociais e políticos a partir das cátedras amparados por boas remunerações e destacados por incontestes prestígios. Essa corrente, quando não ingênua era nitidamente oportunista, foi refutada veementemente pelos verdadeiros revolucionários que não aceitavam tão indecorosa impropriedade. É oportuno acentuar que se repudiava o “marxismo legal” não por uma questão estritamente moral e, sim, por uma total impossibilidade.
A história do socialismo abriga duas grandes correntes. A primeira delas é a corrente revolucionária, aquela que diz textualmente ser impossível “fazer a omelete sem quebrar os ovos”. Isso não é uma escolha, é um imperativo histórico. Afinal, para a sustentação do capitalismo, existe o Estado que congrega diversos aparatos com o objetivo de manter a qualquer custo o sistema sócio econômico vigente. Dentre esses aparatos do Estado estão desde as festejadas escolas (força civil), até as forças policiais e militares. Sendo assim, a violência que impõe a desigualdade e a injustiça, só pode ser banida com a violência libertadora das massas trabalhadoras.
O socialismo evolucionário, gradualista é completamente impraticável, pelas razões que acreditamos terem sido sobejamente colocadas no parágrafo anterior. Ocorre, no entanto, que essa corrente vem tomando substância na medida em que houve a fragorosa derrota do socialismo em escala mundial, derrota que não se pode dizer definitiva, pois assim, teríamos a própria derrota do gênero humano.
A derrota do socialismo em escala mundial promoveu um vazio teórico, promoveu a degradação da esquerda, prostituindo-a em troco de algumas benesses do aparelho de Estado. Para tanto tem contribuído a academia quando se apresenta como a quintaessência do saber. Indiscutivelmente as universidades fabricam, às carradas, técnicos e cientistas prontos para vender a sua mão de obra qualificada no auspicioso mercado de trabalho da ordem econômica e social vigente, seja para fazer bombas, armas sofisticadas ou vacinas para gripe, que cure o povo enquanto proporciona bilionários lucros aos laboratórios. No capitalismo, não existe como objetivo o bem estar e a segurança social. O seu primado é o lucro e tão somente o lucro.
A burguesia tem feito uso político desbragado da universidade como se ela fosse a tábua de salvação da hgumanidade. É necessário denunciar tão despudorada manobra política. Ao invés disso, diante dela, um grande quinhão das esquerdas agacham-se e prostram-se. Isso em escala mundial, o que beira a tragédia. No caminhar da humanidade, é notório que o conhecimento tenha sofrido serradas perseguições, mas tem sido o socialismo científico a maior vitima do sistema e é evidente que desse sistema e de seus asseclas não esperássemos outra atitude.
Conseguiu a burguesia dobrar a esquerda na Europa Ocidental no inicio do século XX, transformando revolucionários em invertebrados. De lá para cá, tudo se tornou-se mais grave. A maioria dos intelectuais progressistas passaram-se de malas e bagagens para o lado da burocracia stalinista. Uns poucos e mais escrupulosos, porém, sem a devida coragem, ampararam-se nas intermináveis discussões intelectuais sobre estética, como foi o caso de George Lukács; no academicismo estéril de Herbert Marcuse, da bela escola de Frankfurt; na confusão mental de Roger Garaudy; no existencialismo inócuo, de Jean Paul Sartre, cuja obra maior foi o pífio elogio feito à Revolução Cubana, no seu livro “Um Furacão Sobre Cuba”, que não ousa penetrar nas entranhas da revolução para assim cientificamente explicar aquele fato histórico que surpreendeu a todos, inclusive aos seus líderes.
Por razões bastantes explicáveis, o senhor Leon Trotsky e alguns mais, tentaram bravamente emergir do lamaçal das intrigas pessoais e mergulhar num honroso embate contra as “forças do mal”. Registre-se, a bem da verdade, que Leon Trotsky não pôde fugir das contingências históricas e terminou deslizando para o idealismo, imputando à tragédia da Revolução Russa a figura sinistra de Josef Stalin e isso não passa de um disparate.
Leon Trotsky chegou ao cúmulo do desvio quando, num infeliz comentário afirmou: “nunca pensei que uma simples caçada de patos pudesse determinar os rumos da história”. Trotsky reportava-se ao fato de que ele houvera entrado em férias e nessa ocasião dera-se a morte prematura de Vladimir Lênin e ele, Trotsky, não pudera participar ostensivamente do seu féretro, apresentando se como seu herdeiro. Além desse deslize, Trotsky passou a ter um juízo moral da história, ora chamando a revolução de desfigurada, ora de revolução traída, o que demonstra o fato de seu envolvimento emocional ter lhe turvado a vista. Caso contrário, teria feito como Iuli Martov e Alexandra Kollontai quando proclamaram que a sepultura da revolução socialista dera-se em 1921, por ocasião do X Congresso do Partido Comunista Russo, quando foi suprimido o direito de tendência, imposto o monolitismo, os campos de concentração e a calúnia como instrumento de prática política.
Essa visão, contudo, ainda seria totalmente insuficiente, ou melhor, incorreta. As raízes da derrota do socialismo estão presentes na Europa Ocidental com a capitulação dos Partidos Operários quando resolveram aceitar a liderança da burguesia e dar as costas à causa socialista como tão bem denunciou Rosa Luxemburgo.
No nosso caso, no Brasil de hoje, as massas trabalhadoras como fizera no tempo de Getúlio, escolheram do populismo trabalhista levado a cabo por Luiz Inácio da Silva (Lula), em troca de míseras migalhas, sobretudo aquelas destinadas à massa de excluídos sob o rotulo de “bolsa família”. Assim como os Partidos Operários levaram o capitalismo à vitória na Europa Ocidental e, por conseguinte, no mundo, não temos dúvida de que o PT esteve e estará disposto a jogar o papel de baluarte de sustentação desse sistema.
Reportando-se aos fatos da Revolução Russa, destaquemos que, em 1921, deu-se a estruturação da NEP (Nova Política Econômica) e a repressão desbragada da Oposição Operária, particularmente do sovietes de Kronstadt isso sim são elementos constitutivos do stalinismo e não como querem Trotsky e os Trotskistas, ou mesmo certos intelectuais festejados como Pierre Anderson e tantos outros péssimos profetas, sobretudo dos fatos passados. Não foi a morte de Lênin, portanto que marcou o nascimento do stalinismo, como pretende os desavisados. O stalinismo repita-se, foi produto da derrota da revolução socialista em escala mundial.
Lembremos que Trotsky produziu uma legião de seguidores que repetem no essencial a prática stalinista, da calunia, da mentira, do culto à personalidade e outros vícios. Mais grave, porém, é que o senhor Trotsky permitiu que existisse um número enorme de pessoas reproduzindo o equivocado discurso de que se houvesse Trotsky batido Stalin teria sido outro o rumo da história. A história, como já dissemos, não é produto da vontade, do querer, da tenacidade de alguns, apesar de serem atributos que, em determinados momentos, podem produzir graves conseqüências.
Não foi Josef Stalin, aquele psicopata obtuso, que levou a revolução ao fracasso. Foi à revolução mundial que foi derrotada a partir da Europa Ocidental e mais particularmente durante o governo na República de Weimar. Isso deve ser visto com acuidade e repetido exaustivamente.
Entender os destinos da humanidade e a história das revoluções recentes a partir do duelo Trotsky e Stálin, desconhecendo, em toda profundidade necessária, as práticas e concepções dos partidos operários da Europa Ocidental, principalmente os dramáticos episódios ocorridos na República de Weimar, com as seus Lulas, Zé Dirceu, Genuíno, Delubio Soares, João Paulo e outros trânsfugas, é transformar a verdade em farsa ou, para sermos generosos, em meros beatos possuídos de todas as ingenuidades possíveis, como viera acontecer com minha querida vó que morreu acreditando ser possível curar câncer com “água benta”.
Hoje, a grande crise do socialismo reside no fato de que fomos todos encerrados por dois fortes círculos de aço. No primeiro círculo estava a burguesia nas suas diversas faces, impedindo de forma obstinada, como é do seu dever, que a revolução socialista prosperasse. No segundo circulo, tivemos uma esquerda marcadamente stalinista em suas diversas faces funcionando como linha auxiliar de sustentação do sistema capitalista. Hoje, desenha-se no pantanal da ignorância cultivada e custeada pela burguesia através de suas academias, um terceiro círculo protagonizado por essa legião de acadêmicos cujo oficio maior é distorcer a história e semear ilusões.
Por fim, toda questão se reduz ao seguinte fato: teremos tempo histórico para romper esses círculos de ferro e aço que protegem o capitalismo ou eles de vitória em vitória, nos levarão ao fim da humanidade como tão bem prognosticaram Engels e posteriormente Rosa Luxemburgo?
Se coragem nos sobrou para enfrentam às câmaras de torturas, as execuções sumárias, os dolorosos exílios, redobrada coragem precisamos ter para desmontar esse imenso “Império da Mentira”.
Quem de nós está disposto a denunciar tantas fraudes? Quem estará disposto a acusar que o papa não é um mero santo? Quem ousaria imaginar que um general não seja por si um herói? Quem teria a audácia de dizer que muitos dos acadêmicos não passam de reles charlatãs? Quem, finalmente estaria disposto a dizer que a velha esquerda marxista-leninista-trostkista foi e é o maior pilar de sustentação da ordem econômica e social vigente em pleno processo de exaustão?
Gilvan Rocha
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