segunda-feira, 21 de março de 2011

Licença para matar


Não há chance. Kadafi cairá. O que ele pode fazer o adiar o desfecho e continuar afogando seu país em sangue. Age impunemente e sabidamente frente a inúmeras potências europeias. Há muita retórica e pouca ação para impedir o massacre.
Luís Carlos Lopes


É intrigante a resistência de Kadafi. Ele vem conseguindo se manter no poder e não seguiu o protocolo, tal como Mubarak e Ben Ali. Para isto, afogou o país em sangue. Ninguém mais sabe quantos já morreram e quantos irão morrer ainda. Mais uma tragédia do rosário das últimas décadas.

Os coronéis são famosos na história recente, quando encarnam papéis de horror: conspiradores, torturadores, assassinos etc...Os generais e os demais poderosos do Estado e do dinheiro se escondem atrás deles. Deixam-lhes o trabalho sujo.

Alguns, tal como o ditador líbio,transformaram-se em personagens principais. Ele chegou ao poder por meio de um golpe de Estado. Está ali há quatro décadas, garantido pela força das Armas e da mítica que construiu em torno de si mesmo. Convenceu, tornando-se cada vez mais poderoso.

A Líbia sozinha fornecia o ouro negro de toda a Europa. Trata-se de um país e população pequenas. Por isso, eles deveriam viver muito bem com os recursos que dispõem. Portanto, não é isso que ocorre. A riqueza petroleira é gasta em armas, luxo e riqueza do ditador. A maior parte do que sobra vai para as empresas que exploram o combustível. No fim das contas, os recursos locais são espoliados há muito tempo.

As revoltas que vêm ocorrendo é por causa disto. Um dia, houve um sopro –crise econômica internacional - indicando sua necessidade.

Não há chance. Kadafi cairá. O que ele pode fazer o adiar o desfecho e continuar afogando seu país em sangue. Age impunemente e sabidamente frente a inúmeras potências européias. Há muita retórica e pouca ação para impedir o massacre.

Várias razões explicam sua permanência provisória: seu despudor de matar, sem medo de ser julgado e o fato inegável de dispor de muito dinheiro na Líbia e espalhado pelo mundo.

Suas aparições revelam um personagem enlouquecido, sem qualquer amor pelos outros, facilmente manipulável. Acha-se um deus e, na verdade, apenas serve aos seus patrões ocidentais. Vivendo acima do real, ele acha que pode tudo e que é invencível.

Quem deseja que se prolongue a carnificina? A hipótese mais provável é que os países que não caíram por efeito de revoltas acreditam que estas mortes sejam uma ameaça gravíssima a quem quiser derrubar o seu governo opressor. Dentre eles, o mais rico é a Arábia Saudita, que deve estar torcendo por Kadafi. Isso é feito silenciosamente e não se sabe que tipo de ajuda presta ao velho ditador.

De fora da região, as potências ocidentais não intervêm diretamente. Não lhes interessa aumentar seus problemas no atual contexto de rara complexidade. Por outro lado, elas ajudaram a sustentar esses regimes de olho no petróleo e no controle estratégico da região. Também querem dar um basta nas revoltas, ao mesmo tempo em que não querem se indispor com os revoltosos.

O medo que Kadafi dissemina ajuda mais do que a retórica de suas ações. A história irá derrotar esta tentativa de por um freio na rebelião popular. Pelo menos, espera-se que assim ocorra. Uma nova ordem está sendo estabelecida na região e, quiçá, no mundo.

Ainda não é possível saber o efeito global destas mudanças. Mas elas são visíveis por toda parte. Os pobres e os miseráveis estão sendo um pouco melhor tratados e os atuais regimes estão preocupados. Sabem que não será mais tão fácil manter uma ordem repressiva, corrupta e manipuladora.



Luís Carlos Lopes é professor e escritor.

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