por Lya Luft
"Não a vi abraçada, levada no colo por alguém
desesperado que tentasse lhe devolver a vida,
que a cobrisse de beijos, que a regasse de lágrimas.
Estava ali deitada, a criança indefesa, como um bicho
atropelado com o qual ninguém sabe o que fazer"
Como grande parte do país, acompanho obsessivamente o caso da menininha de 5 anos brutalmente maltratada, espancada, jogada no chão, esganada, e finalmente atirada pela janela como um gato morto. Corrijo: nenhum de nós jogaria pela janela um gato morto. Talvez um rato: se encontrasse um rato morto em minha casa, num gesto insensato eu o pegaria pela ponta do rabo e o jogaria pela janela (a minha também fica num 6º andar). Seria, além disso, mal-educado: não se jogam coisas pela janela de apartamentos. Nem menininhas, mortas ou vivas.
Escrevo aqui com o maior cuidado: não devo afirmar que pai e madrasta trucidaram a menina e se livraram dela como se fosse um pedaço de lixo. Para isso temos a polícia, num trabalho de primeiríssimo mundo. Então: alguém a espancou, atirou-a ao chão, talvez lhe quebrando ossinhos da bacia, e a esganou por três minutos. O termo "esganar" é meio antigo: como será apertar por três minutos o pescoço de uma criança de 5 para 6 anos? É difícil entender o tempo de agonia e dor de três minutos. Quem faz fisioterapia eventualmente é instruído: contraia esse músculo por vinte segundos. Tentem contar os 180 segundos que compõem três minutos de pavor.
Essa história terá sua explicação em breve. Mas quem cometeu essa bestialidade terá seu merecido castigo neste país das impunidades e das leis atrasadas e frouxas? Recentemente, aqui perto, um menino de 15 anos confessou na maior frieza o assassinato de dezessete pessoas. Quinze deles já foram confirmados. "Matei, sim." Talvez tenha acrescentado, num dar de ombros: "E daí?". Por ser menor de idade, como tantos assassinos iguais a ele, foi para uma dessas instituições de ressocialização nas quais não acredito para esses casos pavorosos. Logo estará livre para reiniciar com alegria sua atividade de serial killer. E, se perguntarem a razão, talvez diga como um jovem criminoso que assaltou um amigo meu: "Nada. Hoje saí a fim de matar alguém". Nossas leis vão finalmente, segundo entendi nas palavras do novo presidente do Supremo, ser realistas, graves, portanto justas? Eu quero mais: pena de morte para casos como os que citei, independentemente da idade. Pelo menos prisão perpétua, sem misericórdia. Quem cometeu o horrendo crime de São Paulo deve apodrecer numa prisão pelo resto de sua miserável vida.
A menininha atirada no minúsculo jardim de seu edifício, ainda viva, ficou ali por muito mais que três minutos. Imagino sua alminha atônita e assombrada, no escuro. Ainda presa ao corpo, ainda presente. Na loucura que o caso provoca, porque ela poderia ser nossa criança sobre todas as coisas amada, o que mais me atormenta é a sua solidão. Não a vi, em nenhum momento, abraçada, levada no colo por alguém desesperado que tentasse lhe devolver a vida que se esvaía, que a cobrisse de beijos, que a regasse de lágrimas, que a carregasse por aí gritando em agonia e pedindo ajuda. O que teria feito a pobre mãe se estivesse presente.
Estava ali deitada, a criança indefesa, como um bicho atropelado com o qual ninguém sabe o que fazer. Na nossa sociedade, em que as sombras mais escuras do nosso lado animal andam vivas e ativas, lá ficou, por um tempo interminável, caída, quebrada, arrebentada, e viva, a menina quase morta. Sozinha.
"Não a vi abraçada, levada no colo por alguém
desesperado que tentasse lhe devolver a vida,
que a cobrisse de beijos, que a regasse de lágrimas.
Estava ali deitada, a criança indefesa, como um bicho
atropelado com o qual ninguém sabe o que fazer"
Como grande parte do país, acompanho obsessivamente o caso da menininha de 5 anos brutalmente maltratada, espancada, jogada no chão, esganada, e finalmente atirada pela janela como um gato morto. Corrijo: nenhum de nós jogaria pela janela um gato morto. Talvez um rato: se encontrasse um rato morto em minha casa, num gesto insensato eu o pegaria pela ponta do rabo e o jogaria pela janela (a minha também fica num 6º andar). Seria, além disso, mal-educado: não se jogam coisas pela janela de apartamentos. Nem menininhas, mortas ou vivas.
Escrevo aqui com o maior cuidado: não devo afirmar que pai e madrasta trucidaram a menina e se livraram dela como se fosse um pedaço de lixo. Para isso temos a polícia, num trabalho de primeiríssimo mundo. Então: alguém a espancou, atirou-a ao chão, talvez lhe quebrando ossinhos da bacia, e a esganou por três minutos. O termo "esganar" é meio antigo: como será apertar por três minutos o pescoço de uma criança de 5 para 6 anos? É difícil entender o tempo de agonia e dor de três minutos. Quem faz fisioterapia eventualmente é instruído: contraia esse músculo por vinte segundos. Tentem contar os 180 segundos que compõem três minutos de pavor.
Essa história terá sua explicação em breve. Mas quem cometeu essa bestialidade terá seu merecido castigo neste país das impunidades e das leis atrasadas e frouxas? Recentemente, aqui perto, um menino de 15 anos confessou na maior frieza o assassinato de dezessete pessoas. Quinze deles já foram confirmados. "Matei, sim." Talvez tenha acrescentado, num dar de ombros: "E daí?". Por ser menor de idade, como tantos assassinos iguais a ele, foi para uma dessas instituições de ressocialização nas quais não acredito para esses casos pavorosos. Logo estará livre para reiniciar com alegria sua atividade de serial killer. E, se perguntarem a razão, talvez diga como um jovem criminoso que assaltou um amigo meu: "Nada. Hoje saí a fim de matar alguém". Nossas leis vão finalmente, segundo entendi nas palavras do novo presidente do Supremo, ser realistas, graves, portanto justas? Eu quero mais: pena de morte para casos como os que citei, independentemente da idade. Pelo menos prisão perpétua, sem misericórdia. Quem cometeu o horrendo crime de São Paulo deve apodrecer numa prisão pelo resto de sua miserável vida.
A menininha atirada no minúsculo jardim de seu edifício, ainda viva, ficou ali por muito mais que três minutos. Imagino sua alminha atônita e assombrada, no escuro. Ainda presa ao corpo, ainda presente. Na loucura que o caso provoca, porque ela poderia ser nossa criança sobre todas as coisas amada, o que mais me atormenta é a sua solidão. Não a vi, em nenhum momento, abraçada, levada no colo por alguém desesperado que tentasse lhe devolver a vida que se esvaía, que a cobrisse de beijos, que a regasse de lágrimas, que a carregasse por aí gritando em agonia e pedindo ajuda. O que teria feito a pobre mãe se estivesse presente.
Estava ali deitada, a criança indefesa, como um bicho atropelado com o qual ninguém sabe o que fazer. Na nossa sociedade, em que as sombras mais escuras do nosso lado animal andam vivas e ativas, lá ficou, por um tempo interminável, caída, quebrada, arrebentada, e viva, a menina quase morta. Sozinha.
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