terça-feira, 16 de novembro de 2010

Bloqueio paraguaio a Chávez

Mac Margolis, Estadão.com

Logo mais, o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva deve concluir a devolução ao Paraguai do canhão Cristão, capturado por tropas brasileiras ao tomar a Fortaleza de Humaitá em 1868, na Guerra da Tríplice Aliança.

Bem que os vizinhos podem precisar dele. Há meses, o diminuto país é alvo da artilharia pesada de Hugo Chávez. Mesmo com sua economia em frangalhos e a oposição aos calcanhares, o líder venezuelano está empenhado como nunca em fortalecer a marca do seu Socialismo do Século 21.

No mês passado visitou Irã, Síria, Líbano, Portugal e Ucrânia, e fechou o giro com um beija-mão dos irmãos Castro. Agora deve relançar a ofensiva para conquistar uma vaga plena no Mercosul. Já se renderam ao canto bolivariano três dos quatro integrantes titulares do mercado comum sul-americano, Brasil, Uruguai e Argentina. Só falta o Paraguai.

Ou, melhor, o Senado paraguaio. Dominado pelo Partido Colorado, que mandou a ferro e fogo no país durante seis décadas, o Senado trava oposição ácida ao presidente Fernando Lugo, este sempre simpático à causa de Chávez.

Além do veto à Venezuela, a maioria dos 45 senadores também barrou a entrada do Paraguai na União das Nações Sul-Americanas, a Unasul, pacto de inspiração chavista criado para tocar assuntos das Américas longe da sombra dos EUA.

Quem diria que esse pequeno colegiado, um punhado de legisladores de um país espremido entre gigantes, conseguiria frustrar o avanço do espaçoso comandante Chávez e se tornar firewall da democracia continental?

O mundo inteiro conheceu os heróis chilenos, os 33 mineiros resgatados das trevas. Apresentam-se agora "los 45", os legisladores paraguaios na última trincheira entre o continente e o abismo diplomático.

Atrás da resistência há uma desconfiança corrosiva. Mercosul com Venezuela, alega o Parlamento paraguaio, seria um cavalo de Troia para Chávez, que já atropelou a democracia venezuelana e ainda sonha com a evangelização do continente.

Já a Unasul é vista como um projeto de interesse estratégico brasileiro, além de um palanque de conveniência para os libelos bolivarianos.

Há quem diga que a exclusão da Venezuela do Mercosul é um equívoco que acaba punindo a nação inteira pelos pecados do seu mandatário. Mais dia menos dia, argumenta-se, Chávez irá embora enquanto o povo e seu país ficarão.

Soa bonito, mas o raciocínio está mais furado do que a Fortaleza de Humaitá. O Mercosul não é um mero Lego geográfico, senão um contrato entre povos, pousado sobre instituições e erguido com princípios, valores e práticas compartilhados.

Entre eles: "a plena vigência das instituições democráticas", segundo o Protocolo de Ushuaia de 2005, "condição indispensável para a existência e o desenvolvimento do Mercosul".

A Venezuela até assinou o protocolo e desmoralizou a democracia.

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