Fim das ideologias?
Claudio Recco
Novamente ouvimos a mesma história. Não que a história se repita, mas os interesses daqueles que decretaram o "fim das ideologias" permanecem ainda dominantes.
O que as décadas de 50 e 90 têm em comum? Nos dois períodos, importantes pensadores dirigiram suas análises políticas a partir da premissa do fim das ideologias. Em 1959 Daniel Bell escreveu um livro intitulado The end of ideology, em que resgata tese de alguns intelectuais de Harvard e denuncia o esgotamento das ideologias frente ao sucesso do capitalismo liberal e do indubitável fracasso do comunismo. Tal pensamento refletia por um lado a recuperação da Europa capitalista após a Segunda Guerra Mundial e os efeitos das denúncias do novo governante da União Soviética Nikita Kruschev contra Stálin, ex-ditador soviético, morto em 1953.
No entanto, o otimismo desses intelectuais e seus seguidores foram abalados já na década seguinte, com a adesão de Cuba ao modelo soviético, com revoluções socialistas em vários países da África e Ásia, relacionadas principalmente ao processo de descolonização, muitas comandados por guerrilhas "de esquerda" que deram origem a novas nações com governo socialista; e com a organização de movimentos sociais, em particular dos estudantes, em vários países, destacando-se a França. Direta ou indiretamente todos esses movimentos questionavam o modelo capitalista e muitos deles ocorreram nos grandes centros do capital. Na década de 70 a derrota dos Estados Unidos no Vietnã e a expansão do modelo soviético forçaram um discurso de bipolaridade, reconhecendo a existência de uma outra força, além da força do capitalismo.
Na década de 90 voltamos a ouvir a mesma expressão a respeito do "fim das ideologias". Ela reflete a visão dominante a partir da queda do muro de Berlim e da desagregação da URSS. Ao mesmo tempo tornou-se comum a expressão "o fim da História", que surgiu primeiro em um artigo do norte-americano Francis Fukuyama, que posteriormente, em 1992, procurou explicar o conceito no livro "O fim da história e o último homem". Segundo a teoria de Fukuyama, o capitalismo e a democracia burguesa constituem o coroamento da história da humanidade, isso significa dizer que a humanidade teria atingido o ponto culminante da evolução, destacando que o liberalismo superou suas dificuldades e seus obstáculos, sendo os mais importantes o fascismo e o socialismo.
Além disso existe o equívoco de colocar fascismo e socialismo em lados opostos, pois o fascismo foi uma forma de governo que se desenvolveu no interior de estruturas capitalistas e que serviu aos interesses de grandes corporações e por isso, suas expressões e seus métodos repressivos - anti liberais - em vários países incluindo o Brasil, tiveram o apoio do governo dos Estados Unidos. O socialismo não é apenas uma forma de governo, mas um sistema acabado, com concepções políticas, econômicas, sociais, que não deve ser tratado como oposto ao fascismo.
Mais do que defender a democracia e o liberalismo, faz-se a defesa do capitalismo. No entanto, como defender a excelência do liberalismo, do ponto de vista político e econômico, se deles estão excluídos mais de dois terços da população do globo terrestre?
O historiador inglês Perry Anderson se coloca em franca oposição a idéia de "morte do socialismo" e de "fim da história", que tendem a subestimar a capacidade transformadora e criativa dos homens.
Enquanto houver um pensamento crítico que não se contente com a aparência dos fenômenos históricos e se preocupe em desvelar a essência contraditória da realidade social, aberta estará a possibilidade da emancipação e transformação do mundo.
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