Última quimera, por Elton Simões
Existem semanas em que o barulho causado pela chegada ao fundo do poço parece despertar uma multidão de operários que, munidos de pás e picaretas, imediatamente começam a cavar.
Talvez motivados pela junção perversa da falta de princípios com a ausência de fins, estes operários se decidam ao aprofundamento do poço com entusiasmo.
A realidade parece se converter em agonia sem fim. O fundo do poço passa a inexistir. Tende ao infinito.
Quando sucesso é confundido com popularidade, produz-se mediocridade. Vistas exclusivamente através das lentes da popularidade, o avanço em questões relevantes e o esforço verdadeiramente produtivo equivalem à fabricação de adversários em série. Neste contexto, a preocupação exclusiva com a popularidade leva à proliferação da mediocridade.
Nestas horas, o bovino aponta o nariz para o lodaçal e imediatamente começa sua marcha, lenta, mas certa, em sua direção. Ao adentrar inevitavelmente o brejo, o bovino confirma que a luz no fim do túnel é somente uma ilusão. Ou, talvez, um trem. A distância da saída do túnel parece aumentar proporcionalmente ao entusiasmo com que os operários cavam o fundo do poço.
Nada parece evitar o fim trágico que resulta no inevitável enterro das últimas quimeras. Nada resta senão se acostumar com a lama que a todos espera. Nesses períodos de mediocridade, a esperança pode ser a primeira vítima.
Talvez como antídoto que possa prevenir a morte da esperança ou no mínimo como balsamo que ajude a suportar melhor estas cenas trágicas, busca-se explicações. Criam-se teorias segundo a qual os fatos estão conectados por planos, interesses e intenções.
Por piores que sejam os objetivos destes planos, por mais inconfessáveis que sejam as intenções, e por mais baixos que sejam os interesses, a existência de um plano pelo menos dá o consolo de que existe alguma inteligência por trás da mediocridade.
Consolo tão medíocre quanto a situação. Mas, pelo menos, melhor que a alternativa. Melhor que acreditar que a mediocridade seja uma função exclusiva de falha coletiva de julgamento. Que ela seja simplesmente uma função de apagão moral, ético e intelectual.
Resta, no fundo deste consolo, a esperança de que a prevalência da apatia coletiva sobre o desejo de dias melhores não seja definitiva e imutável. Ou, pelo menos, o desejo de que o futuro nos reserve tempos menos medíocres.
Elton Simões mora no Canadá. Formado em Direito (PUC); Administração de Empresas (FGV); MBA (INSEAD), com Mestrado em Resolução de Conflitos (University of Victoria). E-mail: esimoes@uvic.ca . Escreve aqui às segundas-feiras.
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