Rogério Simões
O líder líbio, Muamar Khadafi, sempre pareceu invencível e incontestável em seu país natal. Mesmo quando o espírito revolucionário tomou conta da Tunísia, a possibilidade de que o regime na vizinha Líbia também seria ameaçado era relativamente remota. Mas o impressionante levante no Egito, que derrubou o antes todo-poderoso Hosni Mubarak, mostrou que todas as alternativas estavam na mesa no mundo árabe. Inclusive a queda de Khadafi.
Entretanto, o coronel que se instalou no poder em 1969, por meio de um golpe de Estado, é um sobrevivente. Com mais de 40 anos na chefia de sua nação, Khadafi já foi considerado um pária na comunidade internacional, por causa de seu apoio a ações terroristas, mas também teve muitos e importantes amigos, dos mais diversos. Nos anos 70 e 80, o seu regime, que se considerava revolucionário, fez alianças com outros grupos que lutavam contra forças vistas como opressoras ou imperialistas. Um deles foi o IRA (Exército Republicano Irlandês), que foi armado pelas forças de Khadafi, melhorando com isso sua capacidade de atacar alvos britânicos dentro e fora da problemática província. Martin McGuiness, figura central na resistência republicana e atual ministro do governo local da Irlanda do Norte, condenou nesta semana as ações do regime líbio contra protestos no país. Mas disse não se envergonhar das ligações passadas entre seu movimento e Muamar Khadafi. A mesma postura sempre tomou o respeitado ex-presidente sul-africano Nelson Mandela, que pouco depois de sair da prisão visitou a Líbia e falou publicamente da gratidão que o seu movimento contra o apartheid tinha com Khadafi. Sempre chamando o líder líbio de "irmão", Mandela o recebeu na África do Sul em 1999, quando reafirmou sua amizade com o famoso ditador.
Nos últimos anos, mais precisamente depois da invasão do Iraque em 2003, o líder líbio passou a atrair novos e surpreendentes amigos. Estados Unidos e Grã-Bretanha se aproximaram do coronel, que resolveu renunciar a qualquer programa de armas de destruição em massa. Os governos de George W. Bush e Tony Blair decidiram celebrar publicamente a nova amizade. Blair apertou a mão de Khadafi em solo líbio em 2004 e até muito recentemente apresentava a aproximação de Londres com a Líbia como uma consequência positiva da invasão do Iraque. O mesmo pensava o governo Bush: a visita da então secretária de Estado americana, Condoleeza Rice, a Trípoli, em 2008, foi descrita por Washington como "histórica". É verdade que Rice anunciou como nova política dos Estados Unidos para o mundo árabe a promoção da democracia, dizendo que o patrocínio de ditaduras locais não havia levado estabilidade à região. Mas o discurso não levou a boicotes ou pressões mais duras por abertura nos regimes mais autoritários, como o de Muamar Khadafi, pelo contrário.
No caso britânico, Londres aumentou significativamente sua relação comercial com Trípoli, e a decisão da Justiça escocesa de libertar o único condenado pelo atentado contra o avião da Pan Am em 1988 irritou até os americanos. O sinal enviado pelas potências ocidentais foi de que o regime autocrático de Khadafi não era um problema. Contanto que ele estivesse disposto a colaborar politicamente no cenário internacional, seu regime não seria combatido, até porque os líbios são exportadores de petróleo. O estabelecimento de um regime democrático nunca esteve na pauta dos amigos de Khadafi, fossem eles o IRA, Mandela, Blair ou outros ditadores árabes. O coronel era para alguns um companheiro revolucionário e para outros um aliado de conveniência. Para o povo líbio, no entanto, Khadafi tem sido, há 42 anos, a única versão de governo disponível, uma autoridade onipotente em uma nação de relações tribais, sem partidos políticos. As circunstâncias da rebelião contra o regime são diferentes das vistas na Tunísia e no Egito, mas o motivo central não muda: o cansaço de ser governado pela mesma pessoa por tanto tempo.
O líder líbio, Muamar Khadafi, sempre pareceu invencível e incontestável em seu país natal. Mesmo quando o espírito revolucionário tomou conta da Tunísia, a possibilidade de que o regime na vizinha Líbia também seria ameaçado era relativamente remota. Mas o impressionante levante no Egito, que derrubou o antes todo-poderoso Hosni Mubarak, mostrou que todas as alternativas estavam na mesa no mundo árabe. Inclusive a queda de Khadafi.
Entretanto, o coronel que se instalou no poder em 1969, por meio de um golpe de Estado, é um sobrevivente. Com mais de 40 anos na chefia de sua nação, Khadafi já foi considerado um pária na comunidade internacional, por causa de seu apoio a ações terroristas, mas também teve muitos e importantes amigos, dos mais diversos. Nos anos 70 e 80, o seu regime, que se considerava revolucionário, fez alianças com outros grupos que lutavam contra forças vistas como opressoras ou imperialistas. Um deles foi o IRA (Exército Republicano Irlandês), que foi armado pelas forças de Khadafi, melhorando com isso sua capacidade de atacar alvos britânicos dentro e fora da problemática província. Martin McGuiness, figura central na resistência republicana e atual ministro do governo local da Irlanda do Norte, condenou nesta semana as ações do regime líbio contra protestos no país. Mas disse não se envergonhar das ligações passadas entre seu movimento e Muamar Khadafi. A mesma postura sempre tomou o respeitado ex-presidente sul-africano Nelson Mandela, que pouco depois de sair da prisão visitou a Líbia e falou publicamente da gratidão que o seu movimento contra o apartheid tinha com Khadafi. Sempre chamando o líder líbio de "irmão", Mandela o recebeu na África do Sul em 1999, quando reafirmou sua amizade com o famoso ditador.
Nos últimos anos, mais precisamente depois da invasão do Iraque em 2003, o líder líbio passou a atrair novos e surpreendentes amigos. Estados Unidos e Grã-Bretanha se aproximaram do coronel, que resolveu renunciar a qualquer programa de armas de destruição em massa. Os governos de George W. Bush e Tony Blair decidiram celebrar publicamente a nova amizade. Blair apertou a mão de Khadafi em solo líbio em 2004 e até muito recentemente apresentava a aproximação de Londres com a Líbia como uma consequência positiva da invasão do Iraque. O mesmo pensava o governo Bush: a visita da então secretária de Estado americana, Condoleeza Rice, a Trípoli, em 2008, foi descrita por Washington como "histórica". É verdade que Rice anunciou como nova política dos Estados Unidos para o mundo árabe a promoção da democracia, dizendo que o patrocínio de ditaduras locais não havia levado estabilidade à região. Mas o discurso não levou a boicotes ou pressões mais duras por abertura nos regimes mais autoritários, como o de Muamar Khadafi, pelo contrário.
No caso britânico, Londres aumentou significativamente sua relação comercial com Trípoli, e a decisão da Justiça escocesa de libertar o único condenado pelo atentado contra o avião da Pan Am em 1988 irritou até os americanos. O sinal enviado pelas potências ocidentais foi de que o regime autocrático de Khadafi não era um problema. Contanto que ele estivesse disposto a colaborar politicamente no cenário internacional, seu regime não seria combatido, até porque os líbios são exportadores de petróleo. O estabelecimento de um regime democrático nunca esteve na pauta dos amigos de Khadafi, fossem eles o IRA, Mandela, Blair ou outros ditadores árabes. O coronel era para alguns um companheiro revolucionário e para outros um aliado de conveniência. Para o povo líbio, no entanto, Khadafi tem sido, há 42 anos, a única versão de governo disponível, uma autoridade onipotente em uma nação de relações tribais, sem partidos políticos. As circunstâncias da rebelião contra o regime são diferentes das vistas na Tunísia e no Egito, mas o motivo central não muda: o cansaço de ser governado pela mesma pessoa por tanto tempo.
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