Em 2 de julho de 2005 escrevi, neste mesmo espaço, o artigo “Dilma Roussef: a técnica e a política na aventura proibida da liberdade”. Era a conjuntura da crise política que as classes dominantes e a grande mídia chamaram de “mensalão”. Poucos dias antes, em 20 de junho, Dilma assumira a chefia da Casa Civil da Presidência da República. Logo, os opositores conservadores disseram que ela era uma “grande técnica”, administradora segura e competente em enfrentar crises, mas com questionáveis atributos políticos para o cargo.
Ali, nossos reacionários de plantão, sedentos para ganhar o governo no “tapetão”, no lugar de considerar que uma mulher havia atingido um dos lugares mais importantes da história da República ou o maior deles até então, procuraram desqualificá-la para a nova função política.
Na posse, a resposta de Dilma veio imediatamente: não fora por diferenças entre megawatts que ela ficara na cadeia nos piores tempos dos anos 1970. Com Dilma, desfazia-se o discurso tecnocrata de separar a técnica da política.
Passaram-se 5 anos. Neste tempo, Dilma evidenciou sua tradição de luta contra a Ditadura Civil-Militar. Respondendo às acusações de terrorismo (velha construção discursiva dos velhos macartistas e anticomunsitas), defendendo um projeto que, se ainda não é de desenvolvimento autônomo e soberano, questionador da política econômica em curso, colocou uma cunha nas privatizações e recolocou em pauta o papel do Estado como indutor da economia. De lá para cá, Dilma se tornou candidata à Presidente da República e já lidera todas as pesquisas.
Dias atrás, a ex-ministra recebeu mais um regalo de certa mídia que se locupletou com a Ditadura e se tornou a maior organização de comunicação do país, cuja história secreta já foi divulgada, mas ainda é pouca conhecida de nossa população. A capa da revista “Época”, na edição de 16 de agosto de 2010, trouxe a chamada “O passado de Dilma: documentos inéditos revelam uma história que ela não gosta de lembrar: seu papel na luta armada contra o regime militar”.
Como não gosta de lembrar “cara pálida”? O que Dilma realmente não deve gostar de lembrar devem ser as sessões de tortura a que foi submetida na DOPS e no presídio Tiradentes. Pois, do contrário, é público o seu orgulho em participar da resistência à opressão, ardilosamente chamada apenas de Ditadura Militar, a fim de escamotear seus construtores e apoiadores civis, como as Organizações Globo.
Em matéria de 11 páginas, nada pouco a uma revista semanal que conta com o financiamento e propaganda de inúmeras empresas que nada têm a reclamar dos governos brasileiros de 1964 a 1985, levanta-se dúvidas sobre o passado de Dilma. Com fontes policiais (DOPS e SNI), este órgão de “informação” repete os jargões dos porões da Ditadura. Num quadro em destaque, uma das dúvidas é sobre se Dilma se arrepende de alguma atitude tomada naquele período.
A candidata à Presidente não precisa responder a mais esta vilania, pois se não bastassem as sevícias do passado, os “democratas” (de partidos e da sociedade) de última hora não toleram que, assim como no recente Uruguai, alguém que pegou em armas contra a opressão, seja escolhida para o mais alto cargo da República.
Mas nós continuaremos a desvelar aquele processo histórico cuja memória continua em disputa na sociedade brasileira de hoje. Uma história dos que, por meios distintos, institucionais ou armados, revelam os lutadores por outro Brasil que não aquele submetido aos domínios imperialistas do capital rentista. Dilma Roussef é da geração que não se conformava com o arbítrio e, como muitas mulheres, foi à luta armada para derrotar o regime de força. Como não se calou quando tentaram derrubar seu governo, em 2005, com as mesmas armas do udenismo lacerdista que insiste em despejar suas meias-verdades na mídia, a fim de retomar o governo que o campo popular têm depositado sua esperança, rompendo com o medo imposto pelo pós-1964.
Foi ex-secretária da Fazenda do Município de Porto Alegre (1986-1988), ex-presidente da Fundação de Economia e Estatística do Rio Grande do Sul (1991-1993), ex-secretária de Energia, Minas e Comunicações do Estado do Rio Grande do Sul nos governos Alceu Collares e Olívio Dutra (1993-1994 e 1999-2001, respectivamente), ex-ministra das Minas e Energia e Chefe da Casa Civil do governo Lula. Mesmo assim, o discurso reacionário tenta negar a realidade, afirmando que Dilma não tem experiência para governar o Brasil.
Na campanha eleitoral, José Serra, o candidato da Avenida Paulista, dos mesmos liberais-conservadores que têm a companhia esclarecedora do DEM e vergonhosa do PPS, além do oportunismo eleitoral do PV, tem direcionado parte de seu ataque político para esta questão. Não bastasse isso, assim que começou a campanha de rádio e TV, a grande imprensa, tenta pautar a luta política e requenta denúncias para atingir a candidata que representa o projeto do atual governo. Isto está bem visível na nova tentativa de “golpe branco” para desestabilizar a vontade popular que tende a dar vitória eleitoral para Dilma ainda no primeiro turno. Mas como disse Isidora Dolores Ibárruri Gómez (La Pasionaria,) na Guerra Civil Espanhola: “Non Passarán!!!”. Os lutadores brasileiros sabem disso!!!
* Doutor em História Social do Trabalho pela Universidade Estadual de Campinas - UNICAMP, Professor Adjunto de História do Brasil e de Teoria da História do Departamento de História da UFSM - RS