Em 1970, diante de mais uma esmagadora vitória eleitoral da Arena (o partido da ditadura militar), lideranças do MDB propuseram uma solução trágica e radical: a auto-extinção do partido.
A economia nadava de braçada, com crescimento de 11% do PIB, o Brasil havia sido tricampeão do mundo e a figura do general-presidente Emílio Médici, no Maracanã, com o radinho de pilha ao ouvido, em plena linha-dura do regime, com prisões políticas e tortura de presos, popularizara enormemente o governo.
As denúncias de excessos policiais feitas pela oposição não repercutiram nas urnas. Prevaleceu o boom da economia. O bolso. Daí a desolação oposicionista. Não se diga que lá estavam políticos ingênuos ou despreparados. Militavam no MDB lideranças experientes como Amaral Peixoto, Tancredo Neves, Oscar Pedroso Horta, Franco Montoro, entre outros. Coube a Ulysses Guimarães a palavra em contrário: era preciso reagir e insistir - o que o transformou, na seqüência, em liderança máxima da oposição brasileira.
Na eleição seguinte, em 1974, o jogo virava: o MDB elegia 16 das 22 cadeiras em disputa no Senado, um número inesperado de deputados federais e estaduais e mostrava-se no caminho para deter o controle do Congresso. Essa súbita reviravolta iria desembocar na criação da figura do senador biônico (um por estado), com a edição do pacote de abril, de 1977. Era a reação desesperada do regime.
O estratagema garantiu mais um mandato presidencial indireto para o regime, na sucessão de 1978, que colocou um general, João Figueiredo, na Presidência da República por mais seis anos.
Nas eleições de 1986, o governo Sarney, em meio à efusão popular pelo êxito do Plano Cruzado, elegia todos os governadores estaduais – o PFL um e o PMDB os demais, além de sólida maioria no Senado, Câmara dos Deputados e assembléias legislativas, fato sem precedentes na história republicana.
Um ano depois, o Plano Cruzado (e com ele a economia) fazia água, levando a numerosos protestos de rua e greves em profusão. Assim é a política, é como nuvem, já advertia Magalhães Pinto: uma hora está de um jeito, outra hora de outro.
O preâmbulo vem a propósito da recente constatação de que os índices de popularidade do presidente Lula chegaram a níveis estratosféricos não obstante a multiplicidade de denúncias que o cercaram e a seu governo. A oposição reage de forma confusa.
Uns, como o candidato a prefeito de São Paulo, Geraldo Alkimin, passam a elogiar o presidente e a dizer que o problema é o PT. Outros atribuem a alta ao fator sorte. O governo seria mero beneficiário dos ventos favoráveis da economia mundial, e só os estaria aproveitando porque o anterior, com o Plano Real, firmou as bases da estrutura econômica do país.
São raciocínios irreais, inúteis; portanto, burros. A popularidade de um governo, antes de mais nada, não expressa condição definitiva, nem muito menos prova que não comete erros. Quanto mais forte e popular um governo, maior a missão da oposição. Maior a necessidade de fiscalizá-lo, para o bem dele próprio, governo.
Cabe à oposição impedir que sucumba à soberba, que nessas ocasiões age como adversária, cegando-o. O êxito popular, da mesma forma, não revoga desacertos e equívocos, a menos, claro, que a oposição renuncie à sua missão de mostrá-los. O êxito de Lula não decorre de um único fator, mas de uma conjunção deles.
Há efetivamente a sorte, mas sem ela, já ensinava Nélson Rodrigues, não se pode nem chupar um chicabom. A sorte, porém, não faz tudo sozinha. É apenas um dos fatores. Lula tem sabido explorar com eficiência seu carisma e os bons ventos da economia internacional, ocupando solidamente a mídia (ao mesmo tempo em que a acusa espertamente de adversária).
Conta com a despolitização e a fraca memória do eleitorado, fortalecidas pela impotência da oposição. O erro oposicionista está na falta de projeto alternativo para o país. Achou que bastava denunciar, acusar, criticar, e a indignação resultante faria o resto. Como dizia Machado de Assis, investe nos adjetivos, esquece dos substantivos.
Não dá certo. Os danos morais que o governo Lula se impôs na lambança do mensalão carecem de acusadores isentos. Os que estão hoje na oposição já foram governo e lambuzaram-se também no poder. O público não os distingue como promotores qualificados. E aí reage de maneira pragmática: como ninguém na política presta, mantenham-se os atuais, pois em time que ganha não se mexe.
A saída é formular propostas efetivamente alternativas para o país, que mostrem caminho mais adequado para ser trilhado. É hora de substantivos – não de adjetivos. Essa a lição de sintaxe que as pesquisas exibem. Convém aproveitá-la.
Ruy Fabiano é jornalista
A economia nadava de braçada, com crescimento de 11% do PIB, o Brasil havia sido tricampeão do mundo e a figura do general-presidente Emílio Médici, no Maracanã, com o radinho de pilha ao ouvido, em plena linha-dura do regime, com prisões políticas e tortura de presos, popularizara enormemente o governo.
As denúncias de excessos policiais feitas pela oposição não repercutiram nas urnas. Prevaleceu o boom da economia. O bolso. Daí a desolação oposicionista. Não se diga que lá estavam políticos ingênuos ou despreparados. Militavam no MDB lideranças experientes como Amaral Peixoto, Tancredo Neves, Oscar Pedroso Horta, Franco Montoro, entre outros. Coube a Ulysses Guimarães a palavra em contrário: era preciso reagir e insistir - o que o transformou, na seqüência, em liderança máxima da oposição brasileira.
Na eleição seguinte, em 1974, o jogo virava: o MDB elegia 16 das 22 cadeiras em disputa no Senado, um número inesperado de deputados federais e estaduais e mostrava-se no caminho para deter o controle do Congresso. Essa súbita reviravolta iria desembocar na criação da figura do senador biônico (um por estado), com a edição do pacote de abril, de 1977. Era a reação desesperada do regime.
O estratagema garantiu mais um mandato presidencial indireto para o regime, na sucessão de 1978, que colocou um general, João Figueiredo, na Presidência da República por mais seis anos.
Nas eleições de 1986, o governo Sarney, em meio à efusão popular pelo êxito do Plano Cruzado, elegia todos os governadores estaduais – o PFL um e o PMDB os demais, além de sólida maioria no Senado, Câmara dos Deputados e assembléias legislativas, fato sem precedentes na história republicana.
Um ano depois, o Plano Cruzado (e com ele a economia) fazia água, levando a numerosos protestos de rua e greves em profusão. Assim é a política, é como nuvem, já advertia Magalhães Pinto: uma hora está de um jeito, outra hora de outro.
O preâmbulo vem a propósito da recente constatação de que os índices de popularidade do presidente Lula chegaram a níveis estratosféricos não obstante a multiplicidade de denúncias que o cercaram e a seu governo. A oposição reage de forma confusa.
Uns, como o candidato a prefeito de São Paulo, Geraldo Alkimin, passam a elogiar o presidente e a dizer que o problema é o PT. Outros atribuem a alta ao fator sorte. O governo seria mero beneficiário dos ventos favoráveis da economia mundial, e só os estaria aproveitando porque o anterior, com o Plano Real, firmou as bases da estrutura econômica do país.
São raciocínios irreais, inúteis; portanto, burros. A popularidade de um governo, antes de mais nada, não expressa condição definitiva, nem muito menos prova que não comete erros. Quanto mais forte e popular um governo, maior a missão da oposição. Maior a necessidade de fiscalizá-lo, para o bem dele próprio, governo.
Cabe à oposição impedir que sucumba à soberba, que nessas ocasiões age como adversária, cegando-o. O êxito popular, da mesma forma, não revoga desacertos e equívocos, a menos, claro, que a oposição renuncie à sua missão de mostrá-los. O êxito de Lula não decorre de um único fator, mas de uma conjunção deles.
Há efetivamente a sorte, mas sem ela, já ensinava Nélson Rodrigues, não se pode nem chupar um chicabom. A sorte, porém, não faz tudo sozinha. É apenas um dos fatores. Lula tem sabido explorar com eficiência seu carisma e os bons ventos da economia internacional, ocupando solidamente a mídia (ao mesmo tempo em que a acusa espertamente de adversária).
Conta com a despolitização e a fraca memória do eleitorado, fortalecidas pela impotência da oposição. O erro oposicionista está na falta de projeto alternativo para o país. Achou que bastava denunciar, acusar, criticar, e a indignação resultante faria o resto. Como dizia Machado de Assis, investe nos adjetivos, esquece dos substantivos.
Não dá certo. Os danos morais que o governo Lula se impôs na lambança do mensalão carecem de acusadores isentos. Os que estão hoje na oposição já foram governo e lambuzaram-se também no poder. O público não os distingue como promotores qualificados. E aí reage de maneira pragmática: como ninguém na política presta, mantenham-se os atuais, pois em time que ganha não se mexe.
A saída é formular propostas efetivamente alternativas para o país, que mostrem caminho mais adequado para ser trilhado. É hora de substantivos – não de adjetivos. Essa a lição de sintaxe que as pesquisas exibem. Convém aproveitá-la.
Ruy Fabiano é jornalista
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